Haverá guerra na Ucrânia? Possível mas não provável.
A Ucrânia encontra-se num impasse: ou entra numa guerra ou precipita numa crise económica. Em ambos os casos: é o colapso. A Ucrânia sofreu perdas colossais após o lançamento do gasoduto Turkish Stream: cerca de 15% do PIB total do País. O trânsito do gasoduto através de Turquia, Grécia e Bulgária mudou completamente o panorama: desde 1 de Abril, por exemplo, o gás que vai até a Roménia passa pela Bulgária.
Se a continuação do Turkish Stream através de Bulgária e Sérvia for concluída, a russa Gazprom também transferirá o trânsito para a Hungria através do Turkish Stream 2, o que significa mais 12 mil milhões de metros cúbicos perdidos do ponto de vista ucraniano. E isso explica também a razão pela qual Washington que travar o North Stream 2, que ligará a Rússia à Alemanha: seria ainda mais gás que deixaria de transitar pela Ucrânia.
A interrupção do trânsito é um golpe muito duplo: dum lado significa a perda da segurança energética, do outro lado menos vendas e impostos em moeda estrangeira. Actualmente, ao abrigo do contrato, Kiev recebe 7 mil milhões de Dólares pelo trânsito de gás através da Ucrânia.
Ao mesmo tempo, Kiev está a ter sérios problemas internos: a Covid-19 ganha terreno com um sistema sanitário de rastos, o Governo responde com medidas cada vez mais restritivas (confinamentos obrigatórios) mas a economia entra em fibrilação e a tensão social aumenta. Poderia parecer a combinação perfeita para justificar uma guerra: canalizar as atenções dos cidadãos contra a ameaça russa, explorar o sentimento patriótico. E aqui reside o problema: quantos patriotas estariam dispostos a perder a vida em favor do Presidente hebraico Volodymyr Zelens’kyj?
Aparentemente, a situação agravou-se nos últimos dias. Chegou ao ponto em que de ambos os lados da fronteira russo-ucraniana começaram a ser tomadas medidas para demonstrar a prontidão no uso da força. Ameaças e “avisos” contra Moscovo por parte de Kiev, mas também de Washington e Bruxelas. Funcionários do Departamento de Estado, bem como do Pentágono e generais da NATO envolvidos na discussão.
O mundo está pendurado por um fio? Não. O que está a acontecer agora nada mais é do que outra campanha de desinformação e propaganda, algo que persegue objectivos que nada têm em comum com a eclosão de uma guerra em larga escala. A razão?
A razão é que as guerras não começam desta forma. Hoje em dia a Ucrânia está à beira da pior crise de combustível, criada com as suas próprias mãos. Há razões para acreditar que não será possível recolher gasolina suficiente mesmo para preparar qualquer tipo de acção militar. A guerra é cara e a tesouraria de Kiev está vazia. O País não está pronto para a guerra. E nessas condições, a guerra não começa.
Moscovo continua a deslocar tropas no Donbass. Isso significa que qualquer acção de Kiev e aliados encontraria o exército russo preparado: afinal tiveram semanas para planificar e posicionar-se. Um ataque nestas condições seria um suicídio. E os EUA não têm a mínima intenção de entrar num conflito que arrisca arrastar-se ao longo de meses sem mexer dum metro a linha da frente. Não agora que ZomBiden escolheu o seu novo inimigo, a China, e o seu novo objectivo (o Sul-este asiático); objectivo, diga-se, bem mais importante e ambicioso do que a cada vez mais pobre Ucrânia.
Não estamos perante duma guerra mas duma tentativa de Kiev apara aumentar a tensão. Na verdade, as autoridades ucranianas estão extremamente irritadas com algumas tendências muito distintas: em primeiro lugar, aquela dos “parceiros” europeus que demonstraram um sério cansaço perante a obstinada relutância de Kiev em tomar medidas concretas para a resolução pacífica do conflito, na sequência dos “acordos de Minsk”. Depois não podemos esquecer que ZomBiden não tenciona dar mais um cêntimo: a conselheira económica da Embaixada dos EUA na Ucrânia, Megan Baldwin, deixou claro que a actual Administração do Presidente “não vê forma de dar garantias à Ucrânia sobre um novo empréstimo”. A torneira fica fechada, Kiev tem que desenrascar-se sozinha. É um sinal bastante claro. E Kiev começa a fazer a única coisa que pode fazer: agitar o fantasma russo.
Funciona? Parcialmente. É claro que ao perfilar-se um possível conflito, nenhum dos contendentes quer ficar atrás: todos vão preparar-se, nunca se sabe… Kiev, ao menos, pode apresentar aos seus cidadãos o apoio do Ocidente. Mas é mais provável que em Washington já estejam a pensar no pós-Zelens’kyj, na Ucrânia do amanhã. Porque está Ucrânia não tem bases. E nem utilidade.
Voltemos atrás, voltemos à questão do gás. Ao pôr em Kiev um fiel aliado, Washington entrou na posse das chaves para controlar o fornecimento energético de boa parte da Europa, assim como as finanças de Moscovo (que aposta muito na exportação do gás). Mas o North Stream e o Turkish Stream estão a tornar a Ucrânia uma caixa vazia: o gás já não passa por aí, Kiev perdeu o ás na manga. O único ás. E Washington também. Neste aspecto, a Ucrânia é um beco sem saída: importante, pois Moscovo fica só a 500 quilómetros, mas nada mais do que isso. Tudo o que os americanos estarão dispostos a fazer no futuro será impedir que Kiev deslize na órbita russa, mas nada mais. É Zelens’kyj que está por um fio, com certeza em Washington já conhecem o nome do sucessor.
Um ataque só das forças ucraniana, para depois envolver os aliados ocidentais? Como vimos, a situação logística não é boa: falta dinheiro para começar uma guerra. Como pano de fundo: o já citado sistema sanitário ao colapso, um aumento catastrófico dos preços de tudo (alimentos, combustíveis, serviços públicos), um economia em profunda crise, famílias que não conseguem chegar ao final do mês. Uma guerra nestas condições significaria não apenas o fim político de Zelens’kyj mas até dificuldades em manter a cabeça ligada ao pescoço.
O Presidente ucraniano está no nível mais baixo de aprovação desde que chegou ao poder e, segundo Moscovo, há o receio de que seja agora “prisioneiro” dos falcões nacionalistas, sempre a favor do envio de tropas para o Donbass. Este é o único risco. Mas também os falcões têm que fazer as contas com o aliado americano.
Mais uma vez: o “Socorro, os Russos estão a atacar-me” é a extrema jogada dum governo desesperado. Haverá alguns combates entre as forças irregulares de Kiev e as tropas russas no Donbass: muito difícil ir além disso. Afinal, calha bem no Ocidente para reforçar a ideia da “maldade” de Moscovo e para mostrar os músculos: mas pensar que os EUA entrem numa guerra contra a Rússia só para permitir que o governo moribundo da Ucrânia recupere a Crimeia…
Ipse dixit.
Imagem: AW Journel
Não há hipótese nenhuma da Criméia voltar para Kiev. Tomar de volta a Ucrânia não vai. muito menos seu povo pedirá isso.
Portanto só restará, perder ou perder, era uma potência atômica mas agora…
Maio aproxima-se a passos largos…
Enquanto os EUA lançam a propaganda do costume para passarem por “bons rapazes” através dos meios de doutrinamento das massas, no terreno, por ações concretas pela via militar e diplomática a situação piora diariamente.
Tudo parece encaminhar-se para que o “inevitável” se torne na realidade no prazo de algumas (poucas) semanas. Julgo que a frente franco-alemã é o ultima oposição capaz de, senão de o impedir pelo menos de o condicionar, com o objectivo de lhe pôr um termo a prazo mediante a parcial aceitação de uma “détent”… pode ser que os russos se contentem com metade da Ucrânia.