Navalny: álcool, lítio e benzodiazepinas

Navalny! O Leitor lembra-se dele? Ora bem, por aqui continuamos a seguir as aventuras do simpático Aleksei que, uma vez regressado à Rússia, foi logo preso.

Mas a verdadeira novidade é outra: lembra-se também o Leitor do Novichok, o terrível veneno utilizado pelo moderno KGB para exterminar os inimigos da Mãe Rússia? Ora bem: esqueçam o Novichok, esqueçam o novo KGB: no dia 20 de Agosto, no avião que voava acima da Rússia, Aleksei Navalny caiu numa crise metabólica (inibição da colinesterase) causada por uma combinação de álcool, lítio e benzodiazepinas tomadas pelo próprio Navalny.

Estas substâncias foram encontradas na sua urina pelos médicos das urgências do hospital de Omsk, onde o avião com o homem doente fez uma paragem de emergência. E, coisa mais importante, são as mesmas substâncias encontradas na sua urina pelos médicos do hospital Charité, em Berlim, onde os russos o deixaram ser levado ta como Merkel e Macron exigiam.

O lítio encontrado pelos médicos berlinenses no sangue da Navalny é normalmente utilizado para tratar doenças do foro psiquiátrico ou psicológico. É conhecido por deprimir a colinesterase butírica, coisa evidenciada pelos testes laboratoriais no hospital alemão. Além disso, Navalny é diabético e toma a metformina para estabilizar os seus níveis de insulina, um medicamento conhecido por ser um inibidor da colinesterase.

Há vários inibidores da colinesterase: veneno de cobra, gás sarin, gás VX, insecticidas organofosforados… e os efeitos são:

  • Bradicardia
  • Hipotensão
  • Secreções excessivas
  • Broncoconstrição
  • Sufocamento
  • Hipermotilidade gastrintestrinal
  • Redução da pressão intra-ocular
  • Miose

Um inibidor de colinesterase interfere no processo de transmissão de sinal eléctrico: portanto, trata-se de potentes neuro-toxinas. E sim, também uma combinação de álcool, lítio e benzodiazepinas pode desencadear a tal inibição e provocar os mesmos efeitos. Estranho ninguém entre os acusadores ter pensado nisso, não é?

As provas médicas do alegado ataque foram publicadas pelos médicos que trataram Navalny no Charité, liderados por Kai-Uwe Eckardt (que, significativamente, é um especialista em diabetes e não em venenos) no passado dia 22 de Dezembro na revista médica britânica The Lancet. As provas biomédicas e farmacológicas foram apresentadas em quatro apêndices que foram publicadas e revistas no peer review separadamente (uma circunstância excepcional, de acordo com os investigadores médicos).

A publicação de 22 de Dezembro não revela uma identificação mais específica por parte de Eckardt e dos médicos de Berlim: estes escreveram acerca do caso clínico de “envenenamento grave com um inibidor de colinesterase”, mas não afirmam que foi causado por um agente nervoso. Então, donde saiu a acusação do Novichok, furiosamente apoiada por Merkel e por todo o Ocidente?

A teoria do Novichok saiu do laboratório de Munique do Instituto de Farmacologia e Toxicologia do Exército Alemão (IPTB), vários dias após ter estabelecido o diagnóstico de envenenamento por inibidor de colinesterase. Os resultados do IPTB não foram fornecidos aos procuradores russos para uma investigação e a identificação química do alegado composto do agente nervoso não foi revelada publicamente, nem aos procuradores que a solicitaram: continuam a ser segredos de Estado da Alemanha e da Nato. Curioso: o Ocidente tem as provas que culpam definitivamente a Rússia mas guardam em segredo.

Eckardt e o seu grupo também reconhecem que o trabalho do IPTB “não influenciou as decisões de tratamento”. Ou seja, no hospital continuaram a tratar o doente como um diabético que abusava de drogas psicotrópicas e não com o tratamento altamente específico exigido em casos de envenenamento por organofosforados e agentes nervosos.

Paralelamente, a OPCW (Organização para a Proibição de Armas Químicas) confirmou , à pedido do governo da Alemanha, que os resultados da análise das amostras biomédicas “demonstram que o Sr. Navalny foi exposto a um químico tóxico que actuava como inibidor da colinesterase. Os biomarcadores inibidores da colinesterase encontrados no sangue e urina do Sr. Nawalny têm propriedades estruturais semelhantes aos produtos químicos tóxicos 1.A.14 e 1.A.15″.

O que são estes “produtos químicos tóxicos 1.A.14 e 1.A.15”? Novichok. Mas, mais uma vez, as análises da OPCW não foram publicadas, não foram fornecidas aos procuradores russos e permanecem bem guardadas como “segredos de Estado”. Curioso sobretudo tendo em conta que a Rússia pediu que as análises fossem tornadas públicas.

Resumindo: as únicas análises disponíveis são aquelas do Lancet, também as únicas submetidas à verificação por parte de paneis de especialistas. E, ao confiar nelas, Navalny tinha consumido um cocktail de medicamentos potencialmente letal que, quando combinado com álcool e uma condição pré-existente diabética, poderia de facto ter desencadeado um impacto inibidor da colinesterase. O nível de álcool de 0.2 na urina de Navalny, relatado pelo teste do hospital de Omsk a 20 de Agosto, é um nível extremamente elevado: este resultado tinha sido comunicado pela primeira vez por Alexander Sabaev, toxicologista do hospital russo, a 10 de Outubro. “Estava na urina, mas não no sangue. Isto sugere que o álcool está a ser eliminado… O paciente não está bêbado, mas talvez este álcool estivesse no sangue horas antes. Muito provavelmente, há seis a oito horas atrás”.

Portanto, a estimativa de Sabaev colocou o consumo de álcool por parte de Navalny entre as 22h e a meia-noite em Tomsk, antes do seu voo.

No final, revela-se um Navalny infeliz, um pobre homem em tratamento com benzodiazepinas e lítio, um depressivo crónico a quem uma bebida ocasional pode revelar-se letal devido à interferência com medicamentos psicotrópicos e com aqueles com os quais controla a diabetes.

Este é o primeiro e mais temível adversário de Putin? Muito triste. Enjoativo até o que fizeram os meios de comunicação ocidentais: utilizar um indivíduo doente para fins meramente políticos, de propaganda. E agora Navalny regressa à Rússia: não foi obrigado, foi uma livre escolha dele. Os mesmos meios de comunicação social ao serviço do regime agora deram a notícia num tom bem mais “discreto”: porque, afinal, ninguém quer saber da Aleksei Navalny, nem mesmo aqueles que o utilizam.

 

Ipse dixit.

2 Replies to “Navalny: álcool, lítio e benzodiazepinas”

  1. Uma autêntica série da BBC.

    Em Portugal, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Silva, juntou-se à festa fazendo uma declaração acerca da detenção do sr. Navalny, colocando uma vez mais Portugal a fazer figura de urso e os cidadãos Portugueses como motivo de chacota internacional:

    – Navalny: Augusto Santos Silva apela à libertação imediata do opositor russo

    https://24.sapo.pt/atualidade/artigos/navalny-augusto-santos-silva-apela-a-libertacao-imediata-do-opositor-russo

    A comunicação social Portuguesa apelida o sr. Navalny de líder da oposição na Rússia, no entanto o pobre coitado nem consegue atingir o número de votos necessários para entrar na Duma ou ter qualquer tipo de influência, tal é o desprezo que os cidadãos Russos sentem por ele.

    O sr. Navalny para além da sua insignificância política e existencial, é também líder da Fundação Anticorrupção que actua na Rússia, e que neste momento se encontra a ser investigada por lavagem de dinheiro:

    – Opositor russo Aleksei Navalny retorna a Moscou e é detido no aeroporto

    https://www.brasil247.com/mundo/opositor-russo-aleksei-navalny-retorna-a-moscou-e-e-detido-no-aeroporto

    Sobre outro assunto, Armin Laschet acaba de ser eleito como líder da União Democrata-Cristã (CDU pela sua sigla em Alemão), as suas declarações sobre a Federação da Rússia (FR) ou a República Árabe da Síria (RAS) são interessantes; esperemos que as mantenha pois se não o fizer perderá toda a credibilidade:

    – What do new CDU chief’s pro-Russia views mean for Europe?

    https://euobserver.com/political/150647

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