Metais pesados na comida dos bebés

A alimentação das crianças deveria ser a mais saudável, a mais controlada, mas infelizmente nem sempre é esse o caso. Uma nova investigação conduzida por um subcomité da Casa Branca descobriu que muitos alimentos para bebés contêm metais pesados e outras substâncias perigosas. E os produtores estão cientes disso.

São notícias perturbadoras mas não tão surpreendentes aquelas que chegam dos EUA, onde um relatório publicado na passada semana (dia 4 de Fevereiro) descobriu que a comida para bebé está contaminada com níveis perigosos de arsénico inorgânico, chumbo, cádmio e mercúrio. Mas há mais: a auto-regulação da indústria não protege os consumidores, uma vez que os fabricantes estabelecem as suas próprias normas internas.

Segundo a análise, os alimentos para bebés estão contaminados com níveis perigosos de metais pesados tóxicos que põem em perigo o desenvolvimento neurológico das crianças e a função cerebral a longo prazo.

Afirma Raja Krishnamoorthi, Presidente do Subcomité de Política Económica e dos Consumidores:

Os fabricantes de alimentos para bebés têm uma posição especial na confiança do público. Mas os consumidores acreditam erroneamente que estas empresas não vendem produtos inseguros. O relatório do subcomité descobriu que estes fabricantes vendem conscientemente alimentos para bebés contendo elevados níveis de metais pesados e tóxicos. Espero que as empresas se comprometam a produzir alimentos para bebés mais seguros. Independentemente disso, é tempo de desenvolvermos padrões melhores para o bem das gerações futuras.

As marcas analisadas foram as seguintes:

  • Nurture, Inc. (Grupo Danone), que vende os produtos Happy Family Organics e HappyBABY
  • Beech-Nut Nutrition Company (Grupo Hero)
  • Hain Celestial Group, Inc., que vende os produtos Earth’s Best Organic
  • Gerber (Grupo Nestlé)
  • Campbell Soup Company, que vende Plum Organics
  • Walmart Inc. (no Brasil conhecida pelas marcas Todo Dia, Nacional, SuperMarket, Bompreço, Walmart Supercenter, Maxxi Atacado, BIG, Hypermarket, Sam’s Club, Mercadorama) que vende Parent’s Choice
  • Sprout Foods, Inc.

Testes realizados nas marcas Gerber, Nurture e Hain Celestial Group mostraram níveis de metais pesados muito acima dos limites estabelecidos pela FDA (Food and Drug Administration) e pela Agência de Protecção Ambiental dos EUA. Segundo o estudo, alguns produtos continham até 91 vezes o nível de arsénico inorgânico, até 177 vezes o nível de chumbo, até 69 vezes o nível de cádmio e até 5 vezes o nível de mercúrio permitido para a água engarrafada, por exemplo.

Podemos ler no estudo:

Estes resultados são múltiplos mais elevados do que os permitidos pelos regulamentos existentes para outros produtos. Por exemplo, a Food and Drug Administration estabeleceu o máximo nível admissível em água engarrafada como 10 ppb de arsénico inorgânico, 5 ppb de chumbo e 5 ppb de cádmio, e a Agência de Protecção Ambiental reduziu o nível admissível de mercúrio na água potável a 2 ppb. Os resultados dos testes dos alimentos para bebés e dos seus ingredientes eclipsam esses níveis: incluindo resultados até 91 vezes o nível de arsénico, até 177 vezes o nível de chumbo, até 69 vezes o nível de cádmio, e até 5 vezes o nível de mercúrio.

Diferença entre alimentos “biológicos” ou não? Nenhuma: os níveis de metais pesados continuam elevados.

Ainda Krishnamoorthi disse que mesmo os dados fornecidos pelos fabricantes são “chocantes” porque mostram que alguns alimentos para bebés contêm centenas de partes por bilião de metais perigosos. “No entanto, sabemos que em muitos casos, não devemos ter nada mais do que partes de um dígito por bilião destes metais em qualquer um dos nossos alimentos”.

Como elementos naturais, os metais encontram-se no solo e, portanto, não podem ser evitados. Todavia, alguns campos de cultivo contêm níveis mais tóxicos do que outros, em parte devido à utilização excessiva de pesticidas e em parte à poluição industrial. Houve uma época em que os metais foram utilizados como pesticida predominantes, assumindo que esta prática fosse segura. Hoje sabemos que assim não é os metais pesados em análise são ligados a câncer, doenças crónicas e efeitos neurotóxicos, com possíveis efeitos devastadores no cérebro de um bebé em plena fase de desenvolvimento.

Desde o momento da concepção até aos 2 anos de idade, os bebés têm uma sensibilidade extremamente elevada aos químicos neurotóxicos: os seus cérebros estão a formar-se rapidamente e quando são expostos a metais que podem interromper esses processos naturais, os impactos variam desde problemas comportamentais à perda de QI, défices cognitivos e comportamentais que podem persistir ao longo da vida.

Não esquecemos que, em comparação, os bebés recebem doses mais elevadas destes metais: uma coisa são 10 ppb num indivíduo de 80 kg, outra coisa são os mesmos 10 ppb numa criança de 10 kg.

A CNN contactou quatro das empresas envolvidas no estudo para umas declarações antes da publicação do relatório (que, portanto, nenhuma das empresa ainda tenha visto).

A Gerber, do Grupo Nestlé, afirmou via e-mail:

Todos os nossos alimentos cumprem as nossas normas de segurança e qualidade, que estão entre as mais rigorosas não só nos Estados Unidos, mas no mundo. Os alimentos Gerber são avaliados por uma supervisão rigorosa a todos os níveis do processo de crescimento e fabrico onde actualmente não existem normas governamentais, desenvolvemos as nossas próprias normas rigorosas aplicando as mais recentes directrizes de segurança alimentar.

A Beech-Nut Nutrition, do Grupo Hero, declarou:

Estabelecemos há 35 anos normas de análises para metais pesados e revemos e reforçamo-las continuamente sempre que possível.

Além disso, a empresa diz testar:

cada entrega de frutas, vegetais, arroz e outros ingredientes para encontrar 255 contaminantes e confirmar que cada remessa cumpre os nossos rigorosos padrões de qualidade. Se os ingredientes não cumprirem as nossas normas, são rejeitados.

Happy Baby (Grupo Danone) respondeu que a empresa:

não vende produtos que não tenham sido rigorosamente testados e não tem produtos no mercado com gamas de contaminantes fora dos limites estabelecidos pela FDA.

A Hain Celestial Group foi entrevistada só depois da publicação do relatório e assim reagiu:

Estamos decepcionados pelo facto do relatório do Subcomité ter analisado dados desactualizados que reflectem as nossas actuais práticas. A Earth’s Best tem apoiado consistentemente os esforços para reduzir os metais pesados que ocorrem naturalmente no nosso abastecimento alimentar. Estamos prontos a apoiar os esforços do Subcomité para atingir este objectivo.

De acordo com os investigadores do Congresso, três outras empresas de alimentos para bebés não cooperaram plenamente com a investigação do subcomité: Sprout Organic Foods; Walmart e Campbell Soup Company.

Um porta-voz da Campbell afirmou:

Durante mais de 150 anos, a Campbell tem colocado a segurança dos consumidores, especialmente dos nossos consumidores mais jovens, acima de tudo. Foi por isso que cooperámos plenamente com a análise da comida para bebés do Subcomité. Respondemos rapidamente às perguntas e nunca recusámos nada do que nos foi pedido.

Mas não foi isso que se passou segundo o subcomité:

Em vez de produzir qualquer informação substancial, a Campbell forneceu uma folha de cálculo autodeclarando que cada um dos seus produtos ‘cumpre os critérios’. A atitude da Campbell é preocupante, pois mesmo testes independentes limitados revelaram a presença de metais pesados tóxicos nos seus alimentos para bebés.

Segundo a Food and Drug Administration e a Organização Mundial de Saúde, o arsénico inorgânico, o chumbo, o cádmio e o mercúrio são metais pesados tóxicos perigosos para a saúde humana, particularmente para bebés e crianças, que são os mais vulneráveis aos seus efeitos neurotóxicos. Mesmo baixos níveis de exposição podem causar grave danos e muitas vezes irreversíveis ao desenvolvimento cerebral.

Concluiu Krishnamoorthi:

Aguardo com expectativa a regulamentação cuidadosa da FDA sobre estes metais pesados tóxicos nos alimentos para bebés, seguida de rigorosos requisitos de conformidade e rótulos obrigatórios para os consumidores. Até hoje, os alimentos para bebés que contêm metais pesados tóxicos não ostentam qualquer rótulo ou aviso para os pais. Os fabricantes são livres de testar os ingredientes, ou, para a grande maioria dos alimentos para bebés, de não efectuarem qualquer teste.

Bom, tentamos ver a coisa duma perspectiva positiva: mais metais significam crianças mais sólidas, mais resistentes. Fosse ferro, poderia entender a preocupação por causa da ferrugem, mas aqui falamos de chumbo, por exemplo, o mesmo que utilizamos nas baterias dos carros.

Sejamos honestos: alguma vez viram uma criança morta por ter engolido a bateria dum carro? Pronto, não é preciso acrescentar nada.

 

Ipse dixit.

5 Replies to “Metais pesados na comida dos bebés”

  1. Uns dizem que sim, outros dizem que não, e os pais acreditam no que preferem.
    E preferir as indústrias é fácil. Os alimentos vêm prontos para a criança engolir, enquanto os pais não têm tempo, precisam trabalhar para consumir e serem felizes. Isto atinge diretamente a classe média que não vê a criança ingerir a sopinha enlatada, e cair morta. Também tentam não lembrar que mais tarde seus filhos possam desenvolver deficiências em virtude da alimentação.
    Dessas maldades, livram-se os bem pobres e os mais ricos. Os primeiros testam a capacidade de imunização natural dos seus filhos, deixando-os em contato com esgoto, água encanada das grandes cidades. Eles são alimentados com o leite da mãe e logo a seguir experimentam o feijão com arroz esmagadinho, a banana esmagada e por aí vai, até chegar ao aipim, à carne de pescoço, e à farinha. São gente que não tem dinheiro para as papinhas prontas.
    Os segundos não mamam para não deformar os seios das mães, mas por alguns trocados se encontra alguma favelada com grandes tetas, pronta para alimentar mais um (tradição do Brazil colonial). E depois estão cercados por médicos e nutricionistas que orientam o que e quanto deve comer um futuro enfant terrible.

  2. Mais um exemplo da ignorância das gentes (auto imposta) sobre a realidade do mundo em que vivemos.
    A preguiça, o desleixo, a displicência e até a negligência são as causas, o resto é consequência.
    Cá em casa, foi (é) como era… a alimentação é confeccionada com produtos da terra (mercado/quintas) e com rigor na escolha dos que não o podem ser… ler rótulos, conhecer proveniências, preferir sempre o mais local/regional possível, evitar grandes marcas. Dá trabalho não é? É tarefa contínua não é? Á pois é, mas não é masoquismo, é humanismo.
    Não é no querer que se encontra o poder, é no fazer, concretizar, correr atrás… Haja consciência.

  3. No meio disto tudo, o que ninguém pergunta é uma coisa simples:
    O que fazem as instituições que são responsáveis pela validação do lançamento dos produtos no mercado e porque não fazem testes de rotina em amostras para averiguação da qualidade ao longo da comercialização, se é para isso que existem?
    Basta a empresa produtora dizer que fez um “estudo”, garantir que está conforme os requisitos, e pronto, toca a facturar, seja em alimentos, em vacinas, e praticamente em tudo que é comercializado, até que por um motivo ou outro, sai cá para fora algumas inconveniências.
    Como se usa muito em liguagem politica, eu garanto.

    1. Nos EUA é assim mesmo que funciona… ainda bem que por cá (ainda) subsiste a diferença.
      Muita atenção aos acordos de livre comércio, pois esses podem criar os “by-pass” à regulamentação europeia. Esta ainda detém algumas normas que nos vão protegendo do desvario total (criminoso) das corporações.
      O acordo com o Canadá (CETA) foi assinado e pode estar a funcionar como “cavalo de tróia”.
      O acordo com os EUA (TTIP) foi rejeitado, mas nos bastidores já se prepara nova investida.
      Um bom filme que permite visualizar a situação nos EUA neste âmbito é o Dark Waters (caso real). Veja-o.

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