O príncipe e o Captagon

Há quase um ano falámos do Captagon, a droga sintética utilizada pelos combatentes do Oriente
Médio. Na altura o blog relatava:

Em 2013, o governo libanês já tinha apreendido 12,3 milhões de pílulas
de Captagon perto da fronteira entre o Líbano e a Síria, enquanto a
polícia turca ficou pelo 7 milhões de comprimidos. Além disso, as
autoridades do Dubai têm relatado que uma outra apreensão, desta vez de
4,6 milhões de pílulas de Captagon em Dezembro do ano passado. Números
que desaparecem perante os 55 milhões de pílulas que por ano são
confiscados na Arábia Saudita: provavelmente, isso representa 10% do
total que é contrabandeado no reino.

E acerca da droga:

O Captagon permite que os soldados lutem mais horas sem sentir fadiga,
permite ficar activos por longos períodos de tempo com poucas horas de
sono e sem reduções significativas do estado de alerta ou de desempenho:
se capturados, os soldados podem resistir melhor à dor.

O Captagon, muitas vezes misturado com haxixe ou outras drogas mais
convencionais, é a causa dos estados de alteração das milícias: desta
forma conseguem ultrapassar o medo, sentir-se imbatíveis e sempre
prontos.

Tudo confirmado, mas agora há algumas novidades.
Mas antes um pouco acerca do passado.

Hitler e o Pervitin

A utilização de drogas para os soldados não é novidade. Tanto para falar dum conflito relativamente recente, já Wehrmacht, o exército do Terceiro Reich, fazia amplo uso de anfetaminas. de doping. O Dr. Theodor Temmler,, com o director dr laboratório Fritz Hauschild, tinha
conseguido produzir uma metanfetamina sintética, patenteada como Pervitin (em 1937. Em seguida, os comprimidos eram regularmente distribuídos por médicos militares entre os soldados.

Quando, em 1939, Hitler invadiu a Polónia, os médicos da Wehrmacht elogiaram os efeitos; afirmava Otto Ranke, psicólogo-chefe do exército:

A substância tem grande valor militar

Por isso, von Kleist, Guderian ou Rommel distribuíam o Pervitin aso soldados juntos com a racção de comida. E no momento da ofensiva contra os franceses através de Bélgica, a capacidade de resistência das tropas alemãs tornou-se um factor decisivo. 72 horas de avançada ininterrupta, tanto que o exército francês foi literalmente aniquilado, juntamente com o corpo de expedição inglês.Efeito surpresa, logística e superioridade técnica, sem dúvida: mas, como os ciclistas modernos também sabem, os soldados dopados podem ter um desempenho quase sobre-humano.

O Captagon é o neto do Pervitin.

O Captagon 

Sintetizada pelo primeira vez na empresa Degussa AG de Essen (Alemanha, óbvio) em 1961, a fenetilina (este o nome do composto-base do Captagon) foi utilizada ao longo de 25 anos para tratar as crianças com hiperactividade (!!!) e também para melhorar ilegalmente as prestações dos atletas.
Até que, nos anos ’80, o Captagon foi proibido em muitos Países pois provoca dependência.

A partir do começo da guerra na Síria, os grupos anti-governamentais tornaram-se os primeiros produtores mundiais de Captagon, que é subministrado misturado com a cafeína. A droga assim produzida é utilizada pelos grupos na Síria mas também é exportada para o Isis e para a Arábia Saudita e as restantes monarquias do Golfo. Segundo os dados ,40% dos drogados entre 12 e 22 anos de idade na Arábia Saudita utilizam o Captagon.

Abdul Mohsen Bin Walid bin Abdulaziz

E aqui chegamos até as últimas novidades.

No passado dia 26 de Outubro, duas toneladas de pílulas de Captagon escondidas em quarenta sacos foram apreendidas no aeroporto internacional de Beirute (Líbano) a bordo de um jacto particular dirigido na Arábia Saudita.

Tem sido a maior apreensão de droga efectuada alguma vez no aeroporto da capital: o valor da droga é de 270 milhões de Euros, mais ou menos 1 bilião de Reais.

As autoridades libanesas prenderam também cinco cidadãos sauditas. E entre eles havia o dono do jacto, o príncipe saudita Abdul Mohsen Bin Walid bin Abdulaziz. E este é um problema, pois a Abdul é membro da casa real saudita.

Nada que a casa de Riad não possa controlar: o Líbano está profundamente endividado com a Arábia por via dos custos da reconstrução após as invasões israelitas. E o Ministro do Interior libanês, Nouhad Machnouk, já escolheu o silêncio, recusando comentários pois tudo está “nas mãos da justiça”.

Todavia, fica ainda mais claros quais os vários meios de financiamento que a Arábia utiliza para apoiar tanto os “rebeldes moderados” da Síria quanto os terroristas do Isis.

O reinado e a droga

Al-Anoud Al-Fayez com as filhas

Mas não é a primeira vez que a Arábia tem problema com drogas. Aliás, este foi apenas o ultimo duma série de acontecimentos relacionados com substancias ilegais.

É bastante conhecida a história sobre as filhas do falecido rei saudita Abdullah bin Abdul Aziz, Hala, Maha, Sahar e Jawaher, que ainda estão presa nos palácios reais não é um novo.

A culpa? Em Abril de 2014, o site Al-Manar conduziu uma entrevista com o ex-esposa do rei saudita Abdullah bin Abdul Aziz. A princesa, de raízes jordanas, descobriu que as filhas estão sendo maltratadas porque descobriram que os prisioneiros no reino são injectados com drogas e torturados.

De acordo com o testemunho de Hala Abdullah Abdul Aziz Al Saud:

Os prisioneiros sauditas ficam detidos nas alas psiquiátricas, injectados com drogas e sujeitos a tortura e humilhação.

E o mesmo tratamento tocou a ela, pois tinha sido Hala a descobrir isso durante um dos seus estágios em alguns dos centros de doenças mentais. A saúde de Hala piorou até for isolada das suas irmãs.

Isso não deve surpreender: o sistema prisional da Arábia é um dos piores do mundo. Uma reportagem de France 24, publicada em Agosto de 2015, mostram como os  prisioneiros sejam injectados ​​com heroína.

Mas o problema não está apenas nas prisões: de acordo com as estatísticas da ONU, a Arábia Saudita é o primeiro entre os Países do Golfo por número de número de toxicodependentes cujas as idades se situa entre os 12 e os 20 anos. 10% dos estudantes de nível elementar (11 anos de idade e menos) são viciados em drogas; a percentagem aumenta para 33% entre os estudantes de nível intermediário (até 15 anos), e 38% para estudantes de nível secundário (até aos 18 anos de idade).


E um papel de relevo é desenvolvido pelo Captagon: o mesmo relatório da ONU sobre as drogas no mundo (ano de 2013) mostra que um terço da quantidade global de Captagon que foi confiscado no mundo tinha sido encontrado na Arábia Saudita.

Num documentário da BBC intitulado “Captagon: a droga da guerra Síria”, é explicado como os produtores de Captagon (os tais “rebeldes moderados”) consigam “montes de dinheiro” com a venda da droga aos Sauditas: este dinheiro é depois utilizado para comprar armas.

Após a crise síria, alguns dos sírios tendiam a negociar Captagon e promovê-lo em troca de dinheiro e armas. Em parte, o Captagon é produzido na Síria, em parte nos Países do Leste europeu (em primeiro lugar a Bulgária), atravessa a Turquia para chegar na Síria e juntar-se à produção local. Daqui, como descrito, a droga entra no Líbano e espalha-se até os Países do Golfo.

Ipse dixit.

France 24, RT, Journeyman (inglês)

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