Snowden e o golpe nos EUA

E voltemos a falar de Estados Unidos.

Paul Craig Roberts, ex-assistente do Ministro do Tesouro dos Estados Unidos e editor associado do Wall Street Journal, publica um interessante artigo nas páginas de Global Research.

Os americanos sofreram um golpe de Estado, embora estejam relutante em admitir isso. O regime de Washington carece de legitimidade e direito constitucional. Os americanos estão actualmente governados por usurpadores de acordo com os quais o executivo está acima da lei e a Constituição não é mais do que um velho papel.

A primeira reacção poderia bem ser: “E bravo Robert, acordaste?”. Mas seria injusto: Roberts há muito desmarcou-se dos jogos políticos da capital e tornou-se um dos principais críticos do regime americano no seu próprio País. O que é particularmente interessante, pois conhece bem os tais jogos.

Um governo não constitucional é um governo ilegítimo. O juramento de fidelidade inclui a defesa da Constituição “contra todos os inimigos, estrangeiros e nacionais.” Bem queriam enfatizar os Pais Fundadores, o principal inimigo é o próprio governo. O poder não gosta de limitações e de restrições e faz tudo, sempre, para livrar-se desses “laços”.

É por esta razão que Roberts, ao longo das décadas, foi muito crítico em relação aos governos tanto dos Republicanos quanto dos Democratas: não distingue entre um Bush ou um Obama: 

Na base da usurpação do poder há o regime de Washington. O regime de Obama, como o passado de Bush/Cheney, não é legítimo. Os norte-americanos são governados por um poder que não controla nos termos da lei e da Constituição, mas com as mentiras e a força bruta. Aqueles que estão no poder hoje consideram a Constituição apenas uma corrente que mantém as suas mãos atadas.

Comparados com o regime norte-americano actual, foram mais legítimos: o regime de apartheid na África do Sul, o regime de apartheid de israel nos territórios palestinianos, o Talibans e até mesmo os de Muammar Kadafi e Saddam Hussein.

Exagerado? Provavelmente não. Roberts defende uma coisa simples: a Constituição dos EUA não é respeitada. Não apenas isso: mas é continuamente atropelada pelas decisões das Administrações:

A única defesa constitucional que os regimes Bush/Obama deixaram é a Segunda Emenda, uma emenda perfeitamente inútil dada a diferença de armas entre Washington e o cidadão comum. Nenhum cidadão com uma caçadeira na mão pode proteger a si mesmo e a família dele dum dos 2.700 veículos blindados do Departamento da Defesa, ou dum drone, ou duma patrulha da Swat a prova de balas.

Como os servos nos mais escuros séculos de história, os cidadãos norte-americanos podem ser procurados, após ordem executivo dum oficial desconhecido, e atirados para a prisão, torturados, acusados sem provas apresentadas num tribunal regular e sem qualquer informações paras as famílias acerca das suas localizações e das razões da prisão. Ou podem encontrar-se inexplicavelmente numa lista de pessoas que estão impedidas de viajar por via aérea.

Todas as comunicações de todos os americanos, excluindo as conversas ao vivo em ambientes sem microfones, são interceptadas e registadas pela National Security “Stasi” Agency, que pode unir palavras e frases para produzir um “terrorista interno”.

Se atirar para a prisão um cidadão norte-americano é muito cansativo, o cidadão pode sempre ser explodido com um míssil disparado por um drone. Sem qualquer explicação. Na óptica do tirano Obama, aquele cidadão era apenas um nome numa lista.

Sim, de facto pode parecer excessivo. No entanto, é bem lembrar que as várias normativas anti-terrorismo, iniciadas após o 11 de Setembro de 2001 e aperfeiçoadas ao longo do tempo, levaram até esta situação. Os Leitores mais curiosos, por exemplo, podem procurar quais as mais recentes leis aprovadas pelo simpático Obama em matéria de drones, a possibilidade de atingir um cidadão em qualquer ponto de globo, seja ele americano ou estrangeiro.

Não se fala aqui da eterna questão de Guantanamo e dos alegados “terroristas” que nem merecem um normal julgamento: o alvo neste caso são os cidadãos dos Estados Unidos, que conhecemos como a “terra da Liberdade”, a exportadora de Democracia.

O Presidente dos Estados Unidos disse que está a exercer estes poderes proibidos pela Constituição, e que o seu regime tem usado estes poderes para perseguir e matar cidadãos americanos. A sua pretensão de estar acima da lei e da Constituição é de domínio público. No entanto, não houve qualquer pedido de impeachment. O Congresso dobrou-se. Os servos obedecem aos seus comandos.

E fala-se aqui do simpático Barack Obama. É a mesma pessoa que na altura da sua primeira campanha eleitoral recebeu os acríticos (e também infantis) apoios de toda a Esquerda ocidental, como se o sistema de Washington fosse capaz de criar e apoiar o seu próprio coveiro. É a mesma pessoa que, após ter sido eleita, foi celebrada no planeta como paladino da justiça, da igualdade e da esperança. É a mesma pessoa que foi glorificada com o Nobel da Paz. 

As pessoas que ajudaram a transformar um presidente democraticamente eleito num César incluem John Yoo, recompensado pela sua traição com a nomeação a professor de Direito na Universidade da Califórnia, em Berkeley (Boalt Law School), e o companheiro de traição de Yoo, Jay Bybee Scott, recompensado pela traição com a nomeação a juiz federal no Tribunal de Apelações para o Nono Distrito Judicial. Portanto, agora temos um professor de Direito e um juiz federal que determinam como o executivo fique “acima da lei”.

John Choon Yoo é o simpático professor de Direito que durante a Administração Bush “legitimou” a Guerra ao Terror e os interrogatórios da CIA com práticas poucos ortodoxas (como o waterboarding). O waterboarding, ou afogamento simulado, é uma forma de tortura na qual a pessoa é deitada de costas e imobilizada, com a cabeça inclinada para trás (a chamada “posição de Trendelenburg”) enquanto água é lançada sobre a cara dele, dentro das vias respiratórias.

É a mesma tortura utilizada pela Inquisição Espanhola no 1500, durante a guerra do Vietnam por parte dos Vietkong, no Chile de Pinochet, pelos Khmer Vermelhos da Cambodja. E nos Estados Unidos, com o carimbo do professor de Direito Yoo.

E Jay Scott Bybee é o juiz federal que determinou a legalidade desta prática, em 2002.

Assange, Snowden

O golpe de estado do executivo teve sucesso nos Estados Unidos. A questão é: por quanto tempo? Hoje o executivo é composto por mentirosos, criminosos e traidores. Todo o mal do mundo parece estar concentrado em Washington.

A resposta de Washington às evidências fornecidas por Edward Snowden segundo as quais Washington, em violação de todas as leis nacionais e internacionais, está a espiar todos, tem demonstrado a todos os Países que o princípio da vingança, para o regime norte-americano, está acima da lei e dos direitos humanos.

Após precisa ordem dos EUA, os Estados-fantoches da Europa têm negado a permissão de voo ao avião de linha que transportava o presidente da Bolívia, Morales, forçando-o a pousar na Áustria e a sofrer uma vistoria.

Washington pensava que no avião pudesse estar presente Edward Snowden. E a captura de Snowden, segundo Washington, era mais importante do que o respeito pelo direito internacional e a imunidade diplomática.

Nem mais.
Os media ocidentais têm abafado rapidamente os acontecimentos e poucos foram aqueles que lembraram a flagrante violação do Direito internacional. Apesar da história de Snowden apresentar ainda contornos pouco claros, no caso do voo do Presidente da Bolívia o “peso” de Washington nos Países “aliados” mostrou inequivocamente todo o seu poder.

Pior do que isso: mostraram que as leis, as mesmas que a Nato por exemplo pretende exportar para os Países “atrasados”, valem até quando não interferirem com as exigências do regime. Na altura em que os princípios impedirem os objectivos da Administração, simplesmente são postos de lado, no silêncio geral (Convenção de Genebra? O que é isso?).

Quanto tempo será preciso antes que Washington ordene a um “boneco” da Swat inglesa para enviar uma patrulha, buscar Julian Assange na embaixada equatoriana em Londres e entregá-lo à CIA para submetê-lo a uma boa sessão de waterboarding?

Em 12 de Julho, Snowden encontrou no aeroporto de Moscovo organizações de direitos humanos de todo o mundo. Disse que os poderes ilegais exercidos por Washington impedem alcançar os três países latino-americanos que lhe ofereceram asilo. Snowden, por isso, aceitou as condições impostas pelo presidente russo, Putin, e pediu asilo à Federação Russa.

Os norte-americanos demasiado jovens podem não saber o que isso significa: na minha vida profissional sempre soube que os russos estavam a perseguir os rebeldes, enquanto os Estados Unidos eram os que ofereciam asilo político. Hoje, no entanto, é Washington que persegue e a Rússia que protege …

O público americano, desta vez, não acreditou na mentira do governo de que “Snowden é um traidor”. As pesquisas de opinião indicam claramente que a maioria dos americanos vê em Snowden alguém que finalmente falou. Não foram os Estados Unidos a sofrer os prejuízos das revelações dele. São aqueles elementos criminosos dentro do governo que deram um golpe na democracia e na Constituição, que danificaram o povo americano. Não é o povo que pede a cabeça de Snowden, mas os criminosos que tomaram o poder ilegalmente.

Não sabemos se a história de Snowden, tal como aquela de Assange, é tão simples e linear. O que está em causa não são as revelações deles, quantos as reais motivações por trás destas. Já na altura de Wikileaks não poucos realçaram o passado de Assange, as ligações com a CIA. Tanto Assange quanto Snowden têm um passado ligado à Central Intelligence Agency, um autêntico Estado no Estado, não necessariamente em linha com os princípios da Administração.

Mas, seja como for, a imagem de Washington sai uma vez mais deslegitimada.

O regime de Obama, como aquele de Bush/Cheney, não é legítimo. Os norte-americanos são governados por um poder que não controla nos termos da lei e da Constituição, mas com as mentiras e força bruta.

No regime tirânico de Obama, não é apenas Snowden a ser alvo de extermínio, mas cada americano sincero que vive no país. O chefe de Segurança Interna, Janet Chefe, recompensada pela sua lealdade à tirania com a nomeação como chanceler do Sistema Universidade da Califórnia, disse que o sistema Homeland Security mudou a sua atenção dos terroristas muçulmanos para “extremistas internos”, um termo bastante elástico que pode incluir a qualquer momento pessoas correctas como Bradley Manning e Edward Snowden, pessoas que envergonham o governo, revelando os crimes dele. Os criminosos que tomaram o poder em Washington não vão durar muito tempo, a menos que seja totalmente removido o conceito de “verdade”.

Se os americanos concordarem ou tolerarem este golpe, então preparem-se para afundar rapidamente no abismo da tirania.

Ipse dixit.

Fonte: GlobalResearch

6 Replies to “Snowden e o golpe nos EUA”

  1. A matéria demonstra o quanto a conspiração do poder não tem nada de teórica…e a dominação não tem rosto mas tem nome: SIONISMO

  2. Ilham disse : concordo plenamente com o comentário de |Chaplin e parabenizo vc pelo texto tâo esclarecedor. Realmente, os chamados "teóricos da conspiração" não parecem tão alucinados como muitos dizem.

  3. Muito bom texto como sempre, parabéns pelo excelente trabalho e blog, adoro a sua forma de pensar e escrever.

    Queria aproveitar para deixar uma sugestão: Coreia do Norte, o que aconteceu ao sr. Kim Jong-un? A guerra parecia eminente, na TV não se falava em outra coisa e de um dia para o outro parece que tudo acabou. Fartou-se de brincar as guerras?

    Só por curiosidade tudo isto parece que acabou com os atentados em Boston, a partir dai nunca mais se ouviu falar na Coreia do Norte, estranhamente.

  4. Olá Max: o povo norte americano já afundou, e faz muito tempo. Quando morei lá da década de 80, o processo estava claramente em curso: desinformação massiva, repulsa ao diferente e quaisquer formas de diferenças,medo estimulado, necrose social, cotidiano neurótico, policiamento exacerbado,criminalização dos pobres, individualismo e autoritarismo dominantes em todos os setores da sociedade. O que ainda não afundou é o sistema que mantém os mais ricos dessa sociedade fomentando a desgraça globalizada, através de um simulacro de país, que não mais existe. Abraços

  5. A feroz perseguição a todos aqueles que mostraram e vão mostrando a face do regime, tem como único objectivo desincentivar novas iniciativas deste género. É o comportamento típico de um regime totalitário.

    Este regime que há muito mina os EUA, vai mostrando as garras, sempre que novos casos como Snowden aparecem.
    Não estivessem os cidadãos deste mundo alienados com superficialidades, e a máscara da democracia há muito que tinha caído.

    O caso de Bradley Manning é chocante. Resta saber quantos Mannigs desconhecidos desapareceram sem deixar rasto.

    Krowler

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