Mali, ou seja: mas quem liga?

…e continuemos a falar de África.

Houve um golpe no Mali, notícia que mereceu algumas linhas até nos media ocidentais ao longo da semana. Hoje, pelo contrário, no português Público, no italiano Corriere della Sera, no brasileiro Globo nem uma palavra.

É justo que assim seja. Afinal o Mali é País de 14 milhões de habitantes, quase todos pobres. Não têm nada para oferecer, não têm motivos de interesse. As notícias do Mali deveriam simplesmente ser proibidas pois subtraem espaço para assuntos bem mais empolgantes.

Por exemplo: a descida no mar do realizador James Cameron, 11 quilómetros abaixo da superfície. É sempre o realizador de Titanc e de Avatar. Wow! E depois há os preparativos da visita do Papa Rat Singer em Cuba. Wow e ainda Wow!

Como por aqui não temos nada melhor, eis algumas actualizações acerca dos desgraçados do Mali. Assim, tanto por escrever algo.

A revolta do governo militar de Mali, que começou na manhã de Quarta-feira em Kati, a 15 km de Bamako, se transformou num golpe.
Às quatro horas da manhã de Quinta-feira, o porta-voz dos militares golpistas, o tenente Amadou Konaré, anunciou pela Rádio e Televisão do Estado a tomada do poder e o desaparecimento das instituições, incluída a Constituição. O que não é nada simpático.
Além disso implementou o recolher obrigatório e criação de uma “Comissão Nacional para a restauração da democracia e do Estado”, liderada pelo capitão Amadou Sanogo.

No discurso transmitido pela televisão, o capitão Sanogo justificou o golpe “com a incapacidade do governo para lidar com a rebelião no norte” e “a falta de militares adequado para a defesa da pátria” contra a ofensiva do Movimento para a Libertação do Azawad. Sanogo assumiu “o compromisso de devolver o poder” aos civis, logo a integridade do Mali não estar ameaçada”. O objectivo é criar “um governo de unidade nacional”.

Na intervenção, o porta-voz do Exército também fez conhecer a prisão de várias personalidades do antigo governo, incluindo o ministro das Relações Exteriores e o ministro da Administração Territorial. Fecho das fronteiras de terra e do ar acabam o quadro.

Apesar disso, a situação permanece confusa em Bamako. Ninguém esperava que o descontentamento dos militares, que durante semanas reclamaram acerca da falta de recursos e de munições para lidar com a rebelião, poderia degenerar em um golpe. A publicação de imagens de soldados mortos na frente do norte e daqueles que ainda estão nas mãos de rebeldes tuaregues terão irritado os militares.

Ma este não é apenas um protesto contra a guerra no norte. Os militares golpistas estariam relacionados com o movimento Carton Rouge contra a corrupção do governo do Mali. Um movimento formado por estudantes e jovens que acusam o presidente Amadou Toumani Toure de ter embolsado, juntamente com os seus ministros, o dinheiro para a luta contra o terrorismo internacional de Al Qaeda no Sahel.

Al Qaeda? Outra vez? Sim, outra vez. A organização de pseudo-terroristas presta para muitas coisas.

Enquanto isso, os soldados estão cansados ​​de morrer na frente por causa dum presidente que não gastar os Dólares americanos para comprar armas e munições.  E a propósito de Touré:que aconteceu ao presidente? Circulam muitos rumores sobre o esconderijo dele, mas ninguém sabe exactamente onde poderia estar. Um soldado leal ao chefe de Estado disse que o presidente “está bem” e está “num lugar seguro com os ministros de Segurança e da Defesa”. Segundo outras fontes a sua comitiva estaria localizada numa base militar no bairro Djicoroni Para em Bamako.
De acordo com agências de notícias, Toure estaria no interior da embaixada dos EUA na capital, o que é o mais provável.

Washington, que nas últimas semanas havia ajudado o governo de Bamako a distribuir comida para os soldados no norte do País, pediu ontem o fim imediato da violência e a resolução de qualquer disputa no País “através do diálogo e da não violência não”. Faz um pouco de impressão ver os Estados Unidos pedir que as armas fiquem caladas, mas enfim…

O facto é que os EUA gostariam de se estabelecer no Sahel, uma área estratégica para o controle dos poucos recursos naturais e da linha divisória entre o Norte e o Centro da África. Mas para isso é preciso chegar a um acordo com a França. Pois o Mali é antiga colónia de paris, que ainda tem fortes contactos locais.

O Eliseu pediu ontem para ir às eleições quanto mais depressa for possível. Disse o ministro das Relações Exteriores, Alain Juppé, à rádio Europe 1:

Nós somos ligados ao respeito das regras da democracia e da Constituição [a Constituição da Líbia era evidentemente uma excepção, ndt]. Exigimos a restauração da ordem constitucional e eleições que deverão estar agendadas para Abril. Isso deve ocorrer o mais cedo possível.

Afirmações que não caíram bem no ambiente militar de Bamako. Numa entrevista à AFP, um porta-voz: Em casos como este exige-se a organização da votação em tempo útil? A primeira coisa que é preciso pedir é a restauração do Estado de direito e ordem constitucional”.

O que faz sentido. Também é claro que não há condições para ir às urnas em 29 de Abril: o País está cada vez mais dividido entre norte e sul, e, além disso, existem mais de 130 mil desalojados. O que quer Paris tirar proveito da situação instável no País: os militares mais do que uma vez acusaram Paris de apoiar e financiar a insurreição dos Tuareg para obter os depósitos de urânio e de petróleo do norte do Mali.

Enquanto isso, Paris anunciou ontem que suspendeu a sua cooperação com o Mali, embora mantenha “a ajuda humanitária para a população”. O que significa várias ONG e um cómodo canal para condicionar os assistidos.

Entretanto chegou o coro unânime de condenação da União Africano, União Europeia e da Comunidade Económica dos Países da África Ocidental contra o golpe.

Num comunicado, o presidente da Comissão da União Africana, Jean Ping, disse estar “profundamente preocupado com as acções condenáveis ​​cometidas por alguns elementos do Exército de Mali”.
O porta-voz do Alto Representante para a Política Externa da UE, Catherine Ashton, disse que Bruxelas exige que “a Constituição seja restaurada o mais rapidamente possível”.

A Comunidade Económica dos Países da África Ocidental condena veementemente as acções dos rebeldes e avisa que não vai tolerar o uso da violência.

Perante estas tomadas de posição, o Comité para a restauração da democracia e do restabelecimento do Estado do Mali tem respondido para não se intrometer nos assuntos que devem ser resolvidos unicamente pelo povo de Mali.

O Mali não é a Côte d’Ivoire ou a Líbia, dizem eles.
Por enquanto, digo eu.

Ipse dixit.

Fonte: Rinascita

8 Replies to “Mali, ou seja: mas quem liga?”

  1. Olá Max: "Gaddafi, egocêntrico,intratável, instável que fosse, já não é encontrável, para mediar as disputas africanas mortais, como sempre fez". Quem afirma é Derek Henry Flood, jornalista investigativo independente, sempre no meio de campos de conflito na África e Oriente Médio.
    Já que historiadores parece que não mais existe, sigo no rastro de jornalistas independentes. Abraços

  2. Boas… o Mali… miséria absoluta… Combustíveis Fósseis NADA ZERO tal igual os Portugas (a ver vamos se vamos ter por aí uns gases para dar uns!)
    De resto minérios o principal é o Ouro, Sal e umas pedritas preciosas algumas subproduto da exploração do Ouro… Não é de estranhar por isso que não haja a necessidade imperiosa de uma "Missão Humanitária" visto o RETORNO FINANCEIRO, o LUCRO, não ser facilmente atingível…
    Por isso os bacanos do Mali que se vão matando calma e serenamente, sem stress, pois por cá nem com vídeos no youtube este Povo interessa!

    Como sempre devo salientar que os Povos Ocidentais se regem pelos mais elevados princípios e valores humanitários… e não só!

  3. Bem dizem que andamos a nanar… esqueci uma ligação boa para consulta sobre as riquezas do Mali… ler aqui

    Pobretanas… E ainda pensam que vamos para lá gastar petróleo e munições para quê? Para recebermos beijinhos e abraços?!?

  4. Sim está bem…
    Tens razão o Mali fica no meio do nada…
    Mas porque motivo só voltamos ao ponto mais profundo do planeta 52 anos depois?
    Consegues arranjar explicação?
    Alias em matéria de exploração e avanços científicos éramos mais audazes há 50 anos.
    Agora supostamente temos os meios e não vamos lá.
    Porquê?
    Quando uma boa parte do planeta permanece por explorar debaixo de água.

  5. Mário… O conhecimento científico de procurar saber apenas para satisfazer a curiosidade humana e para aumentar o nosso grau de entendimento do planeta em que vivemos já MORREU faz TEMPO!

    Hoje em dia ou o conhecimento científico retorna LUCRO FINANCEIRO ou népia, não interessa…

  6. Mesmo assim mantenho a pergunta no ar.
    Porquê 52 anos depois?
    O que conhecemos dos nossos mares?
    A maior parte das áreas submersas permanece desconhecida para a humanidade.
    Conhecemos melhor o nosso sistema solar do que algumas zonas do nosso planeta.
    Isto para não falarmos do interior da Terra…

  7. Mário… outro dia vi um documentário que falava sobre esse tópico… vou ver se me recordo e procuro alguma ligação… sei que um dos entrevistados foi o filho do Jacques

Obrigado por participar na discussão!

This site uses User Verification plugin to reduce spam. See how your comment data is processed.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

%d bloggers like this: