A falência, para reconstruir

E vamos acabar o discurso sobre a Grécia falando…de Portugal também. 

O analista do conceituado Financial Times, Wolfgang Münchau, examina as situações de Grécia e Portugal.
A solução? A falência. A falência oficial, pois aquela técnica já é coisa assumida.

Não é o só caso de economista que encontra numa falência declarada a única saída possível; além disso bem conhecemos a atitude dos Ingleses perante os problemas da União Europeia.
Todavia o tempo passa, a crise continua e isso faz pender a balança em favor deste tipo de solução.

Pode parecer uma medida drástica e até injusta. Mas afastadas as regurgitações pseudo-patrióticas, é possível encontrar um sentido nesta visão. Paradoxalmente, mais patriótica que não o contrário. 

Ambos os Países não precisam de medidas para salvar uma situação desesperada, mas de decisões para reconstruir-se: o futuro não pode ser um conjunto de medidas de emergência que têm como fim a sobrevivência.

Eis o artigo traduzido, onde o negrito é meu.
Boa leitura.

Porque é que a Grécia e Portugal deviam entrar em falência

Há dois anos atrás, a maior parte dos decisores políticos europeus ainda acreditavam que a Grécia iria conseguir resolver a sua crise. Mas faltava-lhes experiência em lidar com crises financeiras. Nem sequer consultaram outros Países que já tinham enfrentado crises nas décadas anteriores.

Armados com ignorância e arrogância, acabaram a repetir os erros de todos os outros. Pensavam que estavam a ser espertos quanto tiveram a ideia de uma contracção orçamental expansionista. E pensaram que o envolvimento voluntário do sector privado poderia ajudar.

Tendo falhado em aprender com os erros dos outros, alguns deles estão agora a aprender por si próprios. Em algumas capitais do norte da Europa, os decisores políticos estão a começa a entender que o programa grego foi um falhanço monumental. E perderam a confiança nas políticas gregas. Ao entrarmos no quinto ano de depressão e a certeza de que o Produto Interno Bruto vai cair ainda mais sob a influência da austeridade, estão prestes a desistir da Grécia.

Mas continuam a ser avessos ao risco e com tendência a manter-se o mesmo procedimento. Sentem que devem fingir que levam a sério o último programa de austeridade grego, enquanto simultaneamente dão a impressão de que salvaguardam os interesses dos seus contribuintes.

A coligação de partidos gregos chegou a acordo que devia, pelo menos formalmente, satisfazer os interesses dos ministros das Finanças europeus. O parlamento grego aceitou-o. O Eurogrupo também vai aceitá-lo. Separadamente, os credores gregos vão chegar a um acordo para o perdão da dívida.

O Bundestag ainda pode rejeitá-lo, à medida que a opinião pública na Alemanha está actualmente a ficar muito nervosa com a perspectiva de um programa inútil de 130 mil milhões de euros. Um período de calma vai ter lugar, mas após uns poucos meses vai-se tornar claro que os cortes nos salários gregos e pensões pioraram a depressão.

Os decisores políticos europeus vão também que, num ambiente desolador, mesmo metas reduzidas para as privatizações são irrealistas. O Produto Interno Bruto grego caiu 6% em 2011 e continua a desacelerar a um nível semelhante este ano. E num futuro próximo, vai ter lugar outra ronda de reestruturação da dívida.

E este nem é o cenário mais pessimista. Ainda assume que os políticos gregos continuam a apoiar o programa. Mas como novas greves e demissões ministeriais a receber o novo programa, existe realmente a certeza de que o líder da Nova Democracia, Antonis Samaras, e o provável vencedor das eleições em Abril, vai cooperar com a actual estratégia? Não se sabe como é que isto vai funcionar politicamente. Para um novo primeiro-ministro que contempla um mandato de quatro anos, a tentação deve ser grande para deitar o plano por água abaixo e culpar o seu antecessor pela confusão.

Depois vai ter quatro anos para reconstruir o País do zero após a saída da Zona Euro. Vai ser politicamente muito mais arriscado para Samaras agarrar-se a um programa que ele próprio diz não funcionar, e que vai manter o seu País em depressão durante o seu mandato, e possivelmente mais tempo ainda.

Mas para o argumento funcionar, pode-se assumir que Samaras vai manter-se fiel ao programa e que a armadilha da dívida pode ser evitada. Tudo corre como oficialmente planeado. Seria isto o fim da crise grega? Nesse caso a dívida grega iria cair dos actuais 160% do PIB para os 120% até 2020.

Mas estes números ainda vão ser muito elevados. Devemos lembrar-nos que 120% é um número político que não tem justificação económica. Não é coincidência que isto seja um actual nível da dívida italiana. Se admitirmos que 120% não é sustentável para a Grécia, pode-se presumir que o mesmo seja verdade para Itália.

Mas as duas economias são muito diferentes. A Grécia viu a sua economia colapsar. Para se reconstruir, a Grécia precisa de ter uma infra-estrutura económica a funcionar, um moderno mercado de trabalho e um sistema político menos tribal. Só depois destas medidas entrarem em vigor é que os mercados podem voltar a confiar na Grécia. Mas isto pode estar à distância de décadas.

Portanto, mesmo na possibilidade de tudo correr conforme o plano, a sustentabilidade da dívida está longe de ser assegurada. O rácio dívida-PIB deve deixar para um nível muito mais inferior – algo como 60% do PIB – antes do País conseguir escapar da crise. Isto iria limpar a maior parte da dívida detida por estrangeiros, incluindo a dívida do sector oficial.

Alguns dizem que a Grécia devia sair da Zona Euro agora, e usar os fundos para salvar Portugal. Mas discordo.

Pessoalmente acredito que o melhor é reconhecer o estado desolado de ambos os Países, deixar os dois ser incumpridores dentro da união monetária, e depois usar um fundo de resgate muito maior para ajudar os Países a reconstruírem-se e para bloquear o resto dos problemas ao mesmo tempo.

Isto vai ser muito caro.
Mas ignorar a realidade durante mais dois anos vai ser desastroso.

Fonte: Financial Times

One Reply to “A falência, para reconstruir”

  1. Max

    Se a União Européia está nessa crise econômica desde 2008, como os europeus permitiram que a União Européia fizesse uma doação de 175 milhões de euros para Somalilândia? Um "Estado" não-reconhecido internacionalmente.

    É um fato bem intrigante esse tipo de doação.

    O que os europeus acharam disso? E qual foi o argumentado usado pelos representantes da União Européia para esse tipo de doação?
    Houve alguma manifestação sobre isso em Portugal, Itália ou Grécia?

    Um abraço meu amigo

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