Da Economia Política de List – Parte II

O liberalismo de Adam Smith torna os Estados grandes empresas especializadas na produção de bem poucos produtos: porquê produzir quando no estrangeiro já é produzido e de forma mais competitiva?

Tal como no exemplo das locomotivas inglesas, na óptica duma interdependência global.

A família camponesa

Mas esta é uma forte limitação, pois os estados não são nem podem ser empresas: há crianças que devem ser instruídas, doentes que devem ser tratados, idosos acudidos: todos são elementos “não produtivos”, mas o Estado tem que tratar deles, não pode simplesmente ignora-los.

Este exemplo banal só para demonstrar que nenhum Estado pode ser gerido da mesma forma como é gerida uma empresa.

O Estado mais parece uma das antigas famílias do século passado: um encontro de gerações, onde há lugar para o neto e para o avô também, todos têm o próprio papel.

Tais família não apostavam no export mas numa economia de sobrevivência, onde era produzido em casa tudo quanto era possível. Era limitada a despesa (a importação), enquanto os outros produtos eram destinados à própria sustentação e à venda: o trigo e os outros produtos do campo, o porco, as galinhas e o resto dos animais de criação.


Nestas grandes famílias o dinheiro era pouco e era investido na aquisição de máquinas e bens que a família não podia ou não tinha capacidade para produzir.

É claro que um Estado moderno deve ir muito além da mera sobrevivência: mas o conceito primordial deve ser retido e este é a diversificação da produção, numa sociedade onde cada um pode encontrar forma de tornar-se elemento útil. O contrário de agora, com os reformados que são simplesmente esquecidos, por exemplo.

Conceitos demasiados básicos? Nem por isso.

A arma financeira do Reich

Foi com a política económica de List, entre as outras, que Hitler conseguiu reabsorver o desemprego da Alemanha e prosperar enquanto o resto do mundo agonizava na Grande Depressão. Hitler conseguiu diversificar a produção alemã e obrigar os estrangeiros a  comprar bens e serviços do Reich: explosivos da IG Farben, medicamentos da Bayer, brinquedos, relógios, instrumentos musicais, armas, máquinas, aviões, navios…até a Standard Oil vendeu petróleo em troca dum navio de…gaitas “Made in Germany”!

A finança internacional estava de rastos, mas a Alemanha conseguiu prosperar com a diversificação produtiva e um sistema de trocas comercias não mais baseado numa moeda comercial internacional (o Dólar).

Escreveu o general britânico John F.C. Fuller (o teórico da guerra dos tanques) no seu livro Strategical history of the Second World War, de 1948:

O que nos levou à guerra contra Hitler não era a doutrina política dele; a causa, desta vez, foi a tentativa bem conseguida de estabelecer uma nova economia. (…) A prosperidade das finanças internacionais depende da emissão de empréstimos a juros para os Países que enfrentam dificuldades económicas, a economia de Hitler significava a ruína deste sistema.

Se ele tivesse sido autorizado a completá-lo com sucesso, outras nações certamente teriam seguido o exemplo, e teria chegado um tempo em que todos os Estados sem reservas de ouro teriam trocado mercadorias entre eles; de modo que não só a demanda de empréstimos teriam acabado e o ouro teria perdido valor, mas os provedores financeiros teriam sido obrigados a fechar a loja.

Esta arma financeira estava apontada, em particular, os Estados Unidos.

Interessante, não é?
Mas não repitam isso para não serem acusados de simpatias nazistas.

O cartel do trigo

Da economia política de List hoje nada sobra, Adam Smith ganhou na totalidade.
E os benefícios são evidentes: 70% da comida consumida nos Países ocidentais é importada, apenas 30% é produzido “em casa”.

O que significa fome certa em caso de profunda crise internacional.

Entretanto, centenas de milhares de hectares ficam sem cultivo porque os preços internacionais são demasiado baixos para uma pessoa poder sobreviver com os frutos da terra. A União Europeia até paga os agricultores para não cultivar.

E quando chega a época da recolha, eis que aparecem os navios com o trigo estrangeiro. E este trigo tem nome: Cargill, Continental, Archer Daniel Midlands, as famílias Dreyfus, Andrè, Fribourg.

São multinacionais não avaliadas nas Bolsas de Valores (não precisam), que compram o trigo ainda jovem aos agricultores em dificuldades com os bancos (praticamente todos); fazem “cartel”, isso é, determinam os preços e em caso de necessidade fazem dumping também isso é, baixam os preços para arruinar os concorrentes. Comprar o trigo deles “convém”.

E há outros exemplos além do mercado do trigo.

Este é o liberalismo de Smith, o dogma da nossa civilização.
No seu melhor.

Ipse dixit.

Da Economia Política de List – Parte I
Relaconado: O Furher e a crise

Fonte: Maurizio Blondet

3 Replies to “Da Economia Política de List – Parte II”

  1. Pois olha só, Burgos, Saraiva e tantos quantos já manifestaram interesse na minha economia doméstica. O Max aponta para a leitura desse senhor List, que vem a calhar:
    – produzir tudo que se puder em casa.
    – limitar o uso de transações financeiras
    – vender a produção excedente (ou trocá-la, digo eu) e investir em infraestrutura autônoma
    – investir em "capital mental" para que os participantes dessa economia solidária, e em escala humana, possam cada vez mais produzir melhor e depender menos.
    Olha, Max, até que eu vou bem em economia doméstica! Só faltou o senhor List dizer para fazer uma contabilidade minuciosa, e históricamente organizada para poder surpreender sucessos a perseguir e e fracassos a evitar.
    Quanto a economia estatal, mundial, monetarista, financeira, liberal e tal e coisa, ainda vou depender muito do grande Leo para compreender. Mas só por curiosidade, e para que não me venham dizer besteiras, porque esse tipo de "evolução", eu dispenso aqui em casa. Abraços

  2. Maria,

    quando poderei mudar-me para a Patagonia para te fazer companhia?

    Um grande abraço e belíssimo post Max,

    R. Saraiva

  3. Olá Saraiva: já andava sentindo tua falta aqui no "botequim Informação Incorrecta". Tentei falar contigo no teu blog, mas não deu certo. Em síntese era para te dizer que: se eu fosse ligada em religiões, sem dúvida alguma seria espírita.
    Mas enfim, agora que nos encontramos aqui,olha…eu sou gaúcha, mas não da patagonia argentina ou chilena. O meu "bunker", sugestivamente chamado Terra Âncora, nome dado por nós aqui de casa, fica numa depressão da mata atlântica,tem 4 hectares, na altura do estado de Santa Catarina, embora eu tenha nascido mais ao sul, no estado do Rio Grande do Sul/Brasil.
    Adoro a Patagonia argentina e tenho de lá excelentes recordações.
    Mas tu és engenheiro, se não me engano, jovem, e o Brasil tem neste momento uma falta louca de engenheiros, e de preferência, competentes. De forma que se desejares conhecer Terra Âncora, ver de perto um pouquinho do país, Max tem meu e-mail, e serás bem vindo. Abraços.

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