O exemplo: Islândia


Há um País que nos últimos tempos desapareceu por completo das notícias.

Ao longo de algumas semanas títulos, reportagens. Depois nada, o silêncio absoluto.

De facto, a Islândia desapareceu dos mapas.
Será que ainda existe? Ou simplesmente emigrou rumo outro planeta? Um tsunami engoliu a ilha? Foi um dos seus vulcões que vaporizou tudo?

Que aconteceu afinal?

Acontece uma coisa esquisita: a Islândia está a resolver os próprios problemas.
Como? Esta é a parte mais divertida.

Mas antes um pequeno passo atrás.
Vamos lembrar.

2008

Em Setembro o maior banco é nacionalizado, o Banco Glitnir. O colapso da moeda e da Bolsa de Valores suspende todas as actividades: o País declara falência.


2009

Em Janeiro os protestos dos cidadãos em frente ao Parlamento causam a renúncia do Primeiro Ministro, Geir Haarde, e de todo o governo, a Aliança Social-Democrata (Samfylkingin), forçando o País para as eleições antecipadas.

A situação económica continua a ser precária. O Parlamento propõe uma lei que prevê o pagamento da dívida em relação à Grã-Bretanha e à Holanda através do pagamento de 3,5 mil milhões de Euros: uma verdadeira taxa paga por cada família da Islândia, mensalmente, por um período de 15 anos e uma taxa de juros de 5,5%.

2010

Os cidadãos voltam a ocupar as ruas e exigem um referendo acerca da medida mencionada acima.

2011

Em Fevereiro, o presidente Olafur Grímsson veta a ratificação da lei e escolhe o referendo consultivo.
A votação tem lugar em Março e implica a grande vitória do NÃO ao pagamento da dívida, com 93% dos votos.
Enquanto isso, o governo ordena investigações para determinar a responsabilidade civil e penal da crise.
São emitidos os primeiros mandados de captura que atingem vários banqueiros e membros do executivo.
A Interpol é responsável pela busca e captura dos procurados, pois todos os banqueiros envolvidos tinham abandonado a Islândia.

Neste contexto de crise, é eleita assembleia para redigir uma nova Constituição que deve incorporar as lições aprendidas durante a crise e substituir a actual Constituição (redigida com base no modelo dinamarquês).
Para o efeito, 25 pessoas são eleitas entre os comuns cidadãos, sem afiliação política, entre os 522 membros do Parlamento. Os dois únicos requisitos para ser eleitor são, além de não ser ligados a nenhuma formação política, a maior idade e ter o apoio de pelo menos 30 cidadãos.

A Assembleia Constitucional inicia os seus trabalhos em Fevereiro e tem um projeto chamado Magna Carta, que reúne a maioria das “Directrizes” surgidas por consenso durante as diversas reuniões públicas que ocorreram em todo o País.

A Magna Carta será aprovada no Parlamento imediatamente após a próxima eleição legislativa.

Resumindo, estamos perante um País que:

  • nacionalizou os principais bancos privados; 
  • recusou pagar a dívida, nas mãos dos “especuladores” de turno; 
  • obrigou o próprio Governo a demitir-se; 
  • abriu um inquérito para determinar as responsabilidades locais da crise; 
  • prendeu os responsáveis políticos e banqueiros; 
  • aproveitou a crise para pôr ordem em casa, começando com uma nova Constituição redigida com a participação activa de todos os cidadãos.

Tudo isso de forma absolutamente pacífica.

E nós quase nada sabemos.
Não é curioso?

Agora, os mais perversos pensarão logo em censura. Mas Informação Incorrecta não gosta desta palavra e prefere outra: distração.

Isso mesmo, foi uma distração.
Os nossos media estão empenhados com outros assuntos, apenas isso.

Logo que os outros assuntos estejam resolvidos, de certeza amplo espaço será dedicado à situação da Islândia.
Será feito porque é importante.

É importante perceber que quando um País quer, pode. É importante porque a fria ilha demonstra claramente que há uma outra estrada, que há uma saída.

E se o leitor pensar “Ah, mas isso foi possível só porque a Islândia é pequena, é tão diferente”, então fique descansado, pois os media demonstrarão que não é o tamanho que conta (estou a falar do País, malandros…), que são as ideias e os princípios que contam.

Que os espectros que nos assustam e impedem a acção, qualquer acção, são apenas isso: espectros.

Isso dirão os nossos media.
É só esperar. 200 ou 300 anos talvez.

Mas vale a pena.

Ipse dixit.

Fonte: Nexus

4 Replies to “O exemplo: Islândia”

  1. Estava a falar com um amigo neste fim de semana passado sobre os PIIGS, e ele me pediu, "e esses Is aí, são a Islândia, pô, ontem mesmo eles pediram falência!", e eu fiquei assim, "pô, sei que num é, mas que diabos aconteceu com a Islândia?

    Tá aí. Se essa história for tão bela quanto parece ser, sigo as palavras do Saraiva.

  2. realmente "censura" não é a palavra adequada… nem tão pouco "distração"!!!

    O modelo funciona assim, se existe algo que possa provocar sinergias que provoquem fendas no SISTEMA, simplesmente não se divulga tal informação… a MANADA tem que ser controlada…

Obrigado por participar na discussão!

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