Reestruturação Vs. Default

Não apenas é complicado encontrar fontes fidedignas.
Também é necessário analisar as afirmações das fontes “mainstream” porque tudo parece construído para espalhar uma visão do mundo que não é a real.

Por exemplo, vamos ver o que escreve o Corriere della Sera acerca do recente downgrade da Grécia, operado por uma das agências de rating, Moody’s.

Ou reestruturação ou default

Cresceu o risco da Grécia poder entrar em default caso não haja uma reestruturação da dívida. Este é o motivo que está na base da decisão de Moody’s de cortar o rating do País, consideradas “as crescentes dificuldades que o governo tem de enfrentar na implementação dos cortes, as crescentes incertezas acerca das perspectivas de crescimento e o record negativo acerca das metas de consolidação das contas públicas”.

Ámen.
A fonte primária desta notícia é a agência ANSA, a qual, evidentemente, relançou uma nota difundida pela mesma Moody’s. De facto, podemos encontrar as mesmas afirmações, com poucas variantes, nos principais diários do globo.

Mas qual o problema?
O problema está tudo na primeira linha, no poder entrar em default “caso não haja uma reestruturação da dívida”.

A reestruturação da dívida é default!

E que é este raio de default?

O default é uma maneira elegante para dizer que um Estado (ou uma empresa) entrou em bancarrota. Nada mais do que isso. Também podemos falar de “incumprimento” e com certeza na internet é possível encontrar outros sinónimos ainda.
Mas a substância não muda: bancarrota.

E, repito: reestruturação = default (bancarrota).


Há razões técnicas que explicam isso, mas nós vamos ver só a explicação mais simples.
Reestruturar a dívida significa admitir ter acabado o dinheiro. Significa chamar os credores e dizer: “Meus amigos, a caixa está vazia, ou cortam os créditos e revêm os prazos de pagamentos, ou aqui não há nada para ninguém. Acabou. Fim. Game over”.

Como afirmado, há razões bem mais profundas que explicam porque uma reestruturação é default, este foi apenas um exemplo banal. Mas serve para ter uma ideia.

Em verdade, o que diz Moody’s é o seguinte: cresceu a possibilidade da Grécia não conseguir estabilizar as próprias dívidas, isso por causa das dificuldades na implementação das medidas (cortes), do crescimento (sempre negativo) e duma certa tradição em falhar os objectivos orçamentais.

(O quê? Faz lembrar Portugal? Não, fiquem descansados: Portugal não é como a Grécia, não é? Confiem no FMI e sorriam)

É curioso: à medida que a Grécia parece não poder evitar a bancarrota, aparecem estas novas versões, segundo as quais a reestruturação da dívida já não é default, mas uma operação que os Estados podem fazer assim, simplesmente porque sim.

Seria lícito perguntar porque será que ninguém pede uma reestruturação da dívida em outras ocasiões, se esta for uma coisa tão simpática: afinal dá sempre jeito poder cortar as nossas dívidas ou renegociar os prazos de pagamento.

Mas o que interessa aqui é outra questão: é a mensagem, a tentativa de descrever a Grécia como um problema “local”, pois um País com o Euro não entra em bancarrota. Simplesmente “reestrutura”. O que, como vimos, é toda outra coisa…

E que isso não seja um simples erro do jornalista é confirmado pelo facto da mesma notícia (com o mesmo erro) aparecer no outro grande diário italiano, La Repubblica (“Mas, adverte Moody’s, sem uma reestruturação da dívida cresce o risco do País entrar em default”) e em outros diários estrangeiros.

Por isso já sabem, continuem a sorrir e a repetir: “A reestruturação não é bancarrota, a reestruturação não é bancarrota…”

Ipse dixit.

Fonte: Il Corriere della Sera, La Repubblica

2 Replies to “Reestruturação Vs. Default”

  1. Parece que as mídias estão tentando fazer o leitor acreditar que "há uma chance!", tipo em filmes motivacionais. Querem o mesmo resultado mas sob um traçado diferente. Querem nos fazer acreditar que reestruturar a dívida não é tão ruim assim, mas a falência é o capeta, mesmo sendo a mesma coisa!

    Valeu!

  2. Tony, presta atenão, reestruturar ou refinanciar a divida o Brasil fez muitas vezes, mas não chegou a declarar moratória como fez a Argentina, pois se "ELES" nada recebem ficam muito…muito…muito, etc. Mas se voce reestrutura e aceita pagar os juros por isso, va la. Contanto que pague. Ja que a um pais não podem por na justiça e pedir "busca e apreensão do bem", senão ja o teriam feito.

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