Os Nomes – Parte I

Os Títulos gregos alcançam e ultrapassam 13%? Normal, têm o Fundo Monetário em casa.
Os portugueses apenas 10%? Calma, o FMI acabou de chegar.

Na Grécia fala-se dum haircut, isso é, duma reestruturação com corte de 35% da dívida (ok, chamamos as coisas com o nome deles: falência)? Normal, após um ano de FMI.
Em Portugal nada de haircut? Calma, é preciso tempo.

Coisas que acontecem.
Mas agora vamos falar da Origem. No do filme (bonito mesmo, aconselho), falo da Origem dos nossos males.
De todos os males? Não, não de todos, mas de muitos.

E, coisa mais importante ainda, falamos de nomes.
Porque quando alguém perguntar “Mas de quem a culpa?” o leitor poderá responder não encolhendo os ombros, mas com nomes e sobrenomes. Responsáveis.

É difícil encontrar este nomes. São muitos, espalmados ao longo de décadas, e muitas vezes são camuflados. Ninguém gosta de responsabilidades pesadas como esta, mas alguém é responsável, tem que ser.

A lista é comprida? Claro que é. O leitor não acredita na existência dum só “Senhor do Mal”, pois não? Isso presta para cruzadas tipo Iraque, Afeganistão, Líbia.
A realidade é bem diferente.

Então começamos.

Quatro marcos históricos.

David Ricardo

Entre o final de ‘700 e o início de ‘800, o economista britânico David Ricardo disse que para criar riqueza antes é preciso poupar e depois gastar.

Entre 1870 e 1873, os economistas neoclássicos Leon Walras, Carl Menger e W. Stanley Jevons afirmaram: o mercado gera equilíbrio perfeito dos preços.

Em 1890, o economista John B. Clark afirmou que: o trabalhador ganha em proporção à sua produtividade

Início de ‘900, o economista A. Cecil Pigou teorizou que para obter a plena ocupação é preciso baixar os salários.

Do ataque aos gastos soberanos

Estes quatro ideias, nascidas há mais de um século atrás, foram retomados nos tempos modernos, com consequências trágicas.

A. Cecil Pigou

Para criar riqueza, em primeiro lugar temos que economizar dinheiro e só depois gastar. Esta teoria levou ao fantasma da dívida dos Países com moeda soberana, o que resultou na histeria colectiva dos deficit e que impediu ​que os mesmo Países fizessem a única coisa que tinham que fazer: gastar o seu próprio dinheiro para criar o pleno emprego e para o pleno bem-estar dos cidadãos.

Na verdade, ainda hoje continua a ser o dogma dominante: antes um Estado poupa, isso é cortar os gastos como os serviços para “sanar” as contas, e só depois investe.

É exactamente o que se está a passar no mundo ocidental nestes dias: cortes aos salários da função pública (e, de consequência, os privados também), serviços reduzidos ou apagados, desemprego. Tudo em nome do orçamento do Estado, que tem de ser “saudável”, sem dívida, pois o deficit é o Mal Absoluto.

E ninguém, repito, ninguém põe em causa este conceito. Nem os economistas, os únicos com os instrumentos para demonstrar o contrário (e perder assim o emprego, óbvio).

Os principais ideólogos da “histeria do deficit” de hoje são Robert Lucas, Tom Sargent, Neil Wallace (escola New Classical), Jude Wanniski, George Gilder (escola Supply Siders), Greg Mankiw (New Keynesian conservador).

O mercado gera equilíbrio perfeito dos preços.
Até uma criança do ciclo básico hoje sabe que isso é falso. Sabe porque lembra das palavras do pai ao encher o deposito da gasolina: “todos iguais, todos o mesmo preço!”.

Milton Friedman

Mas, apesar disso, há adultos que continuam a acreditar nesta teoria e a divulga-la.
É a ideia segundo a qual o Estado tem que ficar de lado e não interferir com o mercado; é a mesma ideia que inspirou toda a escola neoliberal a partir dos anos ’70 e que tem colonizado governos, universidades, administrações públicas e privadas, e ministérios.

De facto, são os donos da economia de hoje, os que recusam qualquer regulamentação do trabalho, dos bancos, do comercio.

Assim, o Estado tem que ficar de lado, poupar e não gastar em inúteis serviços.
Quais são estes inúteis serviços? Basicamente todos os que podem ser privatizados. Ou seja: todos.
Pergunta: mas então o Estado serve para quê? Nada de perguntas complicadas, vamos em frente.

Os maiores ideólogos desta doutrina são Gerard Debreu, Kenneth Arrow, Frank Hahn (os  Neoclássicos), mas também Milton Friedman, Carl Brunner, Alan Greenspan (os Monetaristas) e os representantes da escola austríaca como Friedrich Hayek e Ludwig von Mises.

Da União Europeia 

No ataque aos Estados, surgiram depois outras ideias, mais modernas.

Jean Monnet

É preciso ter uma União Europeia, regida por órgãos não eleitos e com poderes mais fortes do que os vários Estados-membros, com uma moeda única.

O antigo germe dessas ideias foi de dois políticos franceses, Jean Monnet e Robert Schuman, mais um economista francês, François Perroux, nos anos 30.

O objectivo era trazer de volta ao poder na Europa a elite financeira através dum governo supranacional de técnicos (agora a Comissão da UE) para anular a “massa ignorante” dos cidadãos e os governos. Finalmente, privar das moeda soberana os Estados e impor uma moeda única que não tem Estado (agora o Euro), de forma a privar os Países da soberania económica.

E aqui uma pergunta: quanto vale um Estado sem autonomia económica? Qual o seu poder? Como? São duas perguntas e não uma? Ah, verdade, desculpem.

A União Europeia moderna nasceu em 1993 (Tratado de Maastricht, em 2007 Tratado de Lisboa), e é ,de facto, regulada pela Comissão Europeia, composta por burocratas não eleitos, que legisla de forma supranacional, apoiada pelos acórdãos do Tribunal Europeu de Justiça, que também tem poder nas nossas Constituições.

O Parlamento Europeu, que é eleito, não pode fazer ou propor leis.
Então serve para quê? Ehhhh, serve, algo faz, nunca se sabe, depois tem a sua graça…doutro lado, o termo “parlamento” deriva de “falar”, não de “legislar” (pelo que é simples perceber que os parlamentos dos vários Países são uma aberração, o único fiel à origem é o Europeu)

Jacques Delors

Os governos dos Países-membros devem agora submeter os próprios orçamentos perante a Comissão, e só depois aos parlamentos nacionais.

A União obriga-nos as regras de despesa domesticas que são letais e que destroem os próprios estados (após ter destruído o tecido productivo, mas este é outro discurso).

O Euro não é de nenhum Estado (única moeda no mundo) e é emitido directamente pelos bancos centrais da Zona Euro no mercado de capitais privados, mercado ao qual cada governo tem que pedir empréstimos.

Quem quis isso, nos tempos modernos, foram em particular, e com diferentes graus de responsabilidade:
França: Jacques Attali, Jacques Delors, François Mitterrand, Valéry Giscard d’Estaing, Jean Claude Trichet 
Alemanha: Helmut Schmidt, Otmar Issing, Theo Weigel, Helmut Kohl
Italia: Giuliano Amato, Romano Prodi, Mario Draghi, Charles A. Ciampi, Guido Carli, Carlo Scognamiglio, Giacomo Vaciago, Mario Monti, Tommaso Padoa-Schioppa, Marco Buti
Holanda: Wim Duisenberg
Luxemburgo, Jean Claude Juncker

Fonte: Paolo Barnard

2 Replies to “Os Nomes – Parte I”

  1. Um fator que gosto no comunismo (não sou comunista) é de dar valor ao Estado, as vezes com muita intensidade. Prefiro um estado um pouco mais inchado do que um excessivamente vazio (em todos os sentidos)

    As vezes acho que isto é uma piada de mau gosto. Que palhaçada essa de o Parlamento Europeu não fazer nada, e o tal Conselho ser o bonzão. Os caras que criaram esta idéia trabalharam muito para omitirem estas pequenas linhas dos contratos aos europeus, nas media e na sociedade.

  2. Concordo Tony.

    Aliás, eu acho que alguns serviços têm necessariamente que não produzir lucros e ficar em perda.

    A Saúde, por exemplo: mas como raio é possível imaginar de ganhar com a saúde dos cidadãos e, ao mesmo tempo, fornecer bons serviços?

    O mesmo se passa com a Educação e, talvez, com os Transportes.

    São custos que o Estado tem que assumir, e ponto final: pois são espelhos de valores dos quais não podemos abdicar.

    Acho que foste tu que disseste (e bem) que em todas as ideologias pode haver algo de bom que tem de ser aproveitado.

    E a ideia dum "Estado social" que forneça boas e iguais condições de vida é, de facto, uma boa ideia. Que tem de ser defendida.

    Abraço!

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