África e droga – Parte II

Segunda e última parte do artigo sobre as novas rotas da droga na África Ocidental.
A primeira parte pode ser encontrada aqui.

Boa leitura.

As Rotas da Droga

De acordo com as estimativas do UNODC, 80% da droga na África Ocidental chega por mar, acondicionada em contentores de grandes dimensões ou em barcos de pesca. 

É transportada em navios “mãe”, modificados para conter várias toneladas de substância e, em seguida, transbordada ao longo das costas do Atlântico em pequenas embarcações cuja proveniência são Países menos “suspeitos” no que diz ao tráfico de drogas, assegurando assim uma redução dos riscos de controles das autoridades marítimas.  

Os canais principais são dois: o do Sul, ou seja, a Baía de Benim, depois o Togo, o Benim e a Nigéria e o do Norte, ou seja as duas Guiné e, presumivelmente, a Serra Leoa e a Mauritânia.  
Os restantes 20% da cocaína vem através de ligações aéreas directas, com base em pistas de aterragem clandestinas, especialmente numerosas na Guiné-Bissau, mas também com voos comerciais de linha. Essas aeronaves aproveitam a fraca cobertura radar do Atlântico e muitas vezes são equipadas com tanques de combustível extra que permitem o reabastecimento ao longo da viagem.
 

60% da droga que transita pela África Ocidental e prossegue assim até a Europa por via marítima (predominantemente) ou transporte aéreo. Os traficantes usam barcos que percorrem as rotas de navegação muito frequentadas, misturado-se com outros meios, e, reflectindo o uso de instrumentos cada vez mais sofisticados, também podem aproveitar de novos sistemas de vigias. 
As organizações criminais traficam a cocaína para a Europa também com aeronaves de grande porte (Boeing 727, 707 e DC9), pequenos jactos em versão cargueiro que podem transportar 10 toneladas de droga ou hélice bimotores.  
Especialmente os correios nigerianos utilizam aviões de linha para o transporte de pequenas quantidades de cocaína, ocultadas ou ingeridas.
 
O caso emblemático da Guiné-Bissau: O Narco-Estado

A Guiné-Bissau é o caso mais evidente da crescente utilização da área como zona nevrálgica do tráfico de cocaína para a Europa e, com os seus 350 km de costa e 82 ilhas, é a chave entrada da cocaína na África. 

Entre os seis Países mais pobres do mundo, atende perfeitamente as necessidades dos traficantes de drogas que, ao mudar-se fisicamente para Bissau, têm, de facto tornar-do a Guiné o primeiro narco-Estado do mundo. 
Fortalecidos por um clima de corrupção generalizada e de aberrante cumplicidade institucional, de patente ineficácia da polícia e de fraqueza do sistema judiciário, os traficantes de drogas têm, de facto, criado na Guiné-Bissau uma espécie de poderoso e soberano Estado dentro do Estado, que as classes políticas e militares, sempre em luta e absorvidas nos fluxos de dinheiro garantido pelo tráfico de cocaína, não podem e não querem contrastar.  

A perda progressiva de controle territorial por parte das autoridades centrais e as lutas entre facções étnicas arriscam acabar numa nova e dramática guerra civil. É o mesmo secretário da ONU, Ban Ki-Moon, que lança o alarme, advertindo que “o tráfico de droga afecta negativamente os esforços de manutenção da paz na Guiné-Bissau”.
 

A participação indirecta da administração pública no negócio da droga permite aos traficantes de droga reduzir drasticamente os custos de transporte e de comercialização, de explorar impunemente as inúmeras pistas de aterragem espalhadas por todo o País e operar quase sem obstáculos.  

Além disso, a fragilidade política e económica do País agrava ainda mais as consequências internas da actividade dos traficantes de droga e torna a Guiné-Bissau um terreno fértil para o terrorismo internacional e a ideologia fundamentalista.  
Grupos como a Al Qaeda, Hezbollah e as Farc da Colômbia investiram, com sucesso, no País e o papel do extremismo islâmico está em forte crescimento: nomeadamente, há uma poderosa rede clandestina libanesa que gera os lucros da droga para subsidiar as actividades dos Hezbollah xiitas.  

O País é tão vulnerável ao crime organizado que, como disse o director do UNODC, Antonio Maria Costa, agora há temores de que os traficantes tencionem fazer da Guiné-Bissau não só uma zona de trânsito para substâncias estupefacientes, mas também um lugar de produção de drogas sintéticas.

Conclusões

 

A utilização dos Países da África Ocidental como rotas de trânsito preferenciais para o tráfico internacional de cocaína é mais um obstáculo para o desenvolvimento do continente e, em virtude dos impactos de longo prazo que este fenómeno produz,  arrisca travar projectos de paz e de desenvolvimento económico, político e social.

O dramático aumento dos crimes violentos, da corrupção, da fraude bancária, a gradual mas inexorável desintegração do tecido social  e a crescente influência dos grupos terroristas agravam os problemas já presentes numa região como a África Ocidental, incapaz, causa a escassez de meios, recursos e coordenação, de lidar com estas graves ameaças.

Apesar do grande número de missões da ONU na região (ONUCI na Côte d’Ivoire, UNMIL na Libéria, UNOGBIS na Guiné-Bissau, UNIPSIL na Serra Leoa e UNOWA na África Ocidental em geral), resultados notáveis são lentos a chegar. 

Os esforços nacionais ou  bilaterais realizados por vários Países envolvidos no trafico da droga arriscam simplesmente deslocar o fluxo da droga para áreas ainda mais pobres e, portanto, mais frágeis e menos controladas, e gerar assim situações como a da Guiné – Bissau. 

Também à luz dos convites do Conselho de Segurança da ONU para o reforço da cooperação regional,  vale a pena realçar que, provavelmente, apenas a criação duma rede africana e um eficaz acção coordenada a nível global, juntamente com rigorosas medidas preventivas, podem realmente lutar contra um tráfego que está muito abrangente em termos mundiais e cujas consequências incluem, directa ou indirectamente, a segurança e a estabilidade internacionais.

Lembramos que a primeira deste artigo pode ser encontrada neste link.

Fonte: Eurasia
Tradução: Informação Incorrecta

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