Propaganda: os atletas da Coreia do Norte

Inglaterra 1966: o golo de Pak Doo-Ik

Em 1966, na Inglaterra, jogava-se a fase final da Copa do Mundo de futebol. Na fase de grupos um
jogo com o resultado aparentemente já escrito: Italia contra Coreia do Norte.

Mas o impossível aconteceu; ao minuto 42 da primeira parte golo de Pak Doo-Ik, futebolista com diploma de odontologia. O resultado não mudou e a Italia foi eliminada da competição.

Enquanto a itálica península entrava numa espécie de luto nacional, reza a lenda que os jogadores norte-coreanos foram festejar num pub. E aqui a lenda torna-se pesadelo: Kim Il-Sung não aprovou esta atitude pouco “comunista” e decidiu enviar toda a equipa para um dos piores gulags do País, o Yodok Camp 15, reservado aos prisioneiros políticos.
Aqui encontraram o futuro desertor Kang Chol-Hwan, que no seu livro The Aquariums of Pyongyang descreveu a fama ganha pelo futebolista Pak Seung-Zin, capaz de “resistir a qualquer tortura”. Outro membro da equipa foi apelidado de “barata” dada a sua capacidade de capturar e comer qualquer tipo de inseto numa desesperada tentativa de não morrer de fome.

Uma história bem triste. E bem falsa. Porque nem Pak Seung-Zin nem outro jogador da seleção alguma vez ficou preso. Em 2001, Daniel
Gordon, diretor de VeryMuchSo Productions, e Nick Bonner, um
especialista da Coreia que vive em Pequim, decidiram realizar o documentário The Game of their Lives, dedicado ao jogo contra a Italia de 1966 e encontraram sete membros sobreviventes da equipa da época.

Os antigos jogadores de Inglaterra 1966

Pak Doo-Ik, o jogador que marcou o golo decisivo, nunca foi para um gulag. Após a vitória, Pak, que era um cabo do exército norte-coreano, foi promovido a sargento. Após alguns tempos deixou o exército e o futebol, tornando-se instrutor de ginástica. Em 1976 foi Comissário Técnico da Coreia do Norte nas Olimpíadas de Montreal de 1976.

Hoje Pak é treinador de futebol e vive na capital, Pyongyang, num
apartamento de dois andares oferecido pelo governo. O filho dele também jogou para a seleção de futebol enquanto o neto é uma jovem promessa.

Pak Seung-Zin, o atleta “capaz de resistir a qualquer tortura”, nunca conheceu um gulag. Falecido em 2011, Pak era talvez o jogador mais representativo da seleção, sendo dotado de excelente técnica e resistência física; também tinha conseguido marcar dois golos na Copa do Mundo de 1966, um contra o Chile e outro contra Portugal. Jogou na seleção nacional até 1973, depois tornou-se treinador.

Impermeável às provas, a propaganda continua o seu trabalho. A revista católica Tempi nestes dias repete as mentiras acerca do destino da seleção futebolística de 1966, com tanto de gulag e de encontro com o desertor Kang Chol-Hwan. E acrescenta novos pormenores.

Kang Chol-Hwan

Este é o caso do promissor judoka Lee Chang-Soo, que depois de ser homenageado em casa pela Copa do Mundo de Judo em 1989, teve o infortúnio de perder nos Jogos Asiáticos de Pequim em 1990 contra um sul-coreano. Ao regressar em Pyongyang, o pai da pátria Kim Il-Sung não teve piedade e condenou-o ao trabalho forçado numa mina de carvão. Nada menos.

Em 2010, após a Copa do Mundo de futebol na África do Sul, a equipa nacional da Coreia do Norte sofreu uma sessão de críticas públicas de seis horas no Palácio da Cultura Popular pelo Ministro dos Desportos, Pak Myong-Chol. Os jogadores foram forçados a denunciar a “traição” do treinador Kim Jong-Hun, culpado de não seguir as indicações do líder Kim Il-Sung nos jogos foi enviado ao trabalho forçado (notícia de Radio Free Asia, com sede em Washington, subvencionada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos. Custo em 2015: 38.3 milhões de Dólares).

Mesmo destino foi reservado a Hyo Sim-Choe, rainha do levantamento de peso destinada a ganhar a medalha de ouro nas Olimpíadas do Rio 2016, mas que obteve “apenas” a prata. Portanto: trabalho forçado. Pena que entretanto Hyo recebeu o Prémio de Honra da Juventude Kim Il-Sung, a honra suprema dos jovens coreanos, o título de Atleta Meritório e que agora esteja a preparar-se para obter uma nova medalha nos 18º Jogos Asiáticos de 2018.

Na Olimpíada de Inverno de PyeongChang a equipa de hóquei no gelo perdeu 8-0 contra a Suíça, 8-0 com a Suécia, 4-1 com o Japão e outra vez 2-0 contra a Suíça. Choe Un Song, velocidade no gelo, chegou em último lugar na corrida de 1.500 metros; Ri Yong Gum, esquiadora de cross-country, chegou em 89º lugar, Han Chun Gyong 101 º e Park Il Chol 107º. Para evitar a sobrelotação, em Pyongyang terão que mandar construir novos gulags.

Ipse dixit.

Fontes: The Independent, Tempi, Naenara, Informare per Resistere

9 Replies to “Propaganda: os atletas da Coreia do Norte”

  1. E assim, de mentira em mentira, o Ministério da Propaganda ocidental vai construindo no imaginário popular o que deve crer que pensa o populacho.E com uma eficiência extraordinária vai classificando quem é do bem e quem deve ser do mal.
    Cada vez que alguém lança outra versão, mais próxima da história vivida, está contra atacando um poder incomensurável. E estes sim correm o risco de serem conduzidos aos "gulaks"do mundo, castigo destinado a quem pensa/fala/escreve/age fora da caixa.

  2. A propaganda desse "ministério" está tão enraizada na cabeça das pessoas, que se eu repassar as informações deste post, por aqui, passarei a engrossar a lista dos defensores do comunismo.

  3. Começo a achar que o comunismo afinal nao é assim tao ruim quanto isso.
    Embora haja varios tipos de comunismo
    Comunismo Juche (Coreia do norte)
    Comunismo Chines
    Comunismo Sovietico
    Teem em comum serem diabolizados desde ha muito com muitas mentiras e bem grandes.
    Mas pelo que falo com Russas e outras pessoas que viveram o Comunismo Sovietico muitas recordam essa epoca com saudade e carinho.
    Havia trabalho para todos (meio de subsistencia).
    Nao tinham de se preocupar com pagar casa (enquanto que aqui em Portugal mesmo para uma casa modesta anda-se a paga-la durante 30 ou 40 anos).
    Nao tinham preocupacoes com o ensino dos filhos (os livros, farda, material escolar eram dados pelo estado). E o ensino deles era reconhecidamente muito bom , bem melhor que o ocidental.
    Nao tinham de se preocupar com cutos de saude e o sistema deles era reconhecidamente muito bom.
    Tinham uma actividade cultural fervilhante de muito boa qualidade fortemente incentivada pelo estado.
    Uma mulher Russa que conheço disse-me uma vez que so queria que a filha dela tivesse uma decima parte do que ela teve e viveu na epoca do comunismo Sovietico.
    Ou seja, havia o sentimento de estado paternalista que olhava pelos seus cidadaos e as pessoas sentiam-se seguras. Ao contrario do que assistimos na europa e brasil (sao os sitios que tenho mais conhecimento) que temos o estado sempre a dificultar-nos a vida e a inventar formas de extorquir dinheiro.
    Tambem me contaram que nessa epoca do comunismo sovietico as pessoas ou trabalhavam ou estudavam, quem queria ter uma vida vadia sem contribuir para o bem comum ou a viver de esquemas passava mal.

    O porque do odio ao comunismo. Tenho pensado nisso e surgem-me a ideia alguns pontos

    1) E um pessimo exemplo para o sistema ocidental o qual so pode sobreviver (e mal) se nao houver outras referencias e alternativas alem dele.

    2) Foi um precedente que tem de ser apagado da historia pois mostra que e possivel as massas sairem das garras que as prendem.

    3) Foi contra aos interesses instalados das corporacoes religiosas que ha muito viviam como parasitas recebendo muitooo dinheiro em troca de sonhos e ilusoes as pessoas. Ainda me lembro que em Portugal a igreja catolica dizia que os comunistas comiam criancas mas veio-se a descobrir que afinal era na igreja que as comiam e esturpavam. Foram muitos os casos de pedofilia que se descobriram mas serao ainda mais os que continuam ocultos. Sim e ainda tivemos os casos de lavagem de dinheiros das mafias, as orgias homosexuais com muita cocaina e heroina .

    3) Paises colonizadores (Portugal, Espanha, Holanda, França, Inglaterra, Alemanha, Belgica, Italia, eua) que andaram em guerra entre si para roubar e colonizar outros povos uniram-se (curioso como a maioria dos paises que aderiram inicialmente ao Tratado do Atlântico Norte eram paises colonizadores) para que a uniao sovietica nao pudesse libertar esses povos colonizados. Poder-se-a argumentar que os sovieticos queriam apenas expulsar os colonizadores para passarem a ser eles os colonizadores (embora nao haja evidencias disso) mas mesmo assim isso nao faria os sovieticos piores que os ocidentais. Apenas os faria estar no mesmo plano e com as mesmas intencoes.

    4) Temos Cuba. Um pais que nao ameaça ninguem militarmente ou economicamente e que esta sujeita a um embargo econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos desde Outubro de 1960. Sim ja la vao quase 80 anos.
    Nao tem missies, nao tem armas nucleares, nao faz ma vizinhança, tem um bom sistema de ensino, tem um bom sistema de saude (tanta gente que vai la para curar o que aqui nao conseguem).
    Porque ?
    Simplesmente porque escorraçaram a escoria que os colonizava e decidiram ser livres. Aqui vem o ponto 2 da minha exposicao. Abriram um precedente que a todo custo tem de ser apagado da historia.
    Se vivem com dificuldades?
    Sim vivem, tal como na coreia do norte. Mas a liberdade nesta epoca tem um preço. Ah e sao quase auto-suficientes e nao teem practicamente divida externa aos carteis. 😉

  4. Uma pequena correccao ao meu texto
    Onde escrevi:
    Sim ja la vao quase 80 anos.
    e para estar
    Sim ja la vao quase 60 anos.

    Ja agora aproveito

    Se vivem com dificuldades?
    Sim. Mas nos tambem e nao sao poucas as dificuldades. Vivemos endividados com dividas bem grandes contraidas pelos governantes,o que me revolta especialmente pois gosto de juntar dinheiro, chegar, comprar e pagar. Agora ter de andar a trabalhar mais e ganhar menos para pagar dividas com que nao concordo , nem me pediram opiniao, que foram contraidas por outros e sou obrigado a pagar faz-me sentir severamente que nao tenho controlo do meu destino e estou sujeito aos caprichos de alguem. Isto e liberdade ? Nao, nao e.

  5. O comunismo, enquanto vertente socialista (real e não fabiana) abriga uma essência que a lógica capitalista não comporta. E assim, é demonizado, sinônimo de totalitarismo, que, de fato, é o que ocorreu em todas tentativas de pratica-lo. Inserir qualquer projeto de cunho comunista num planeta capitalista sempre acabará em totalitarismo.

    1. Nao sei. O ideal seria uma mistura de o melhor do capitalismo(com ética) e do comunismo(parido em sí e amigos), e tentar limitar os problemas inerentes à cada um.
      A Rússia era suposto adotar o sistema escandinavo (por muitos defeitos que possa ter é onde existe maior equilibrio), aliás era a ideia de Gorbachev e muitos outros com a perestroika e glasnost(nem vale meter links, acho que é do domínio comum).
      Os nórdicos têem muito em comum, clima, natureza e são relativamente pouco povoados excepto Dinamarca(é frio). E em tudo o que é indicadores positivos estão sempre no topo, ou nos 10 mais por muito que digam o contrário(ninguém é perfeito), outros exemplos? Canadá e Nova Zelândia talvez.
      Mas mais uma vez foi tudo feito a martelo nos anos 90 com Yeltsin(quando sóbrio) que vendo que tinha sido enganado, e naquilo que a nação se tornou: meteu o ex-kgb no poder.
      O que o anónimo diz é o que Russos aqui a morar me disseram resumidamente , outros +1 milhão foram para Israel, e muitos mais para o Canadá/EUA e resto da Europa, problemas com a máfia local e degradação do nível de vida.
      E principalmente não existir uma via(uma alternativa), na altura que respondesse aos problemas.
      Agora já possuem, goste-se ou não e com a China(fábrica) tão "amiga" já estão a colocar em histeria os que se "julgam" os poderes globais.
      Aí a diabolizacão da Rússia e o desprezo/desconfiança em relação à China.
      Aparentemente só a Alemanha os vê como algo de positivo, porque será?

      E já existe uma ligação forte Finlândia – São Petersburgo, trens de mais 200km/h e a auto estrada (abriu na semana passada), até na Noruega(bem ao norte) já abriram vários túneis para passar o trânsito entre os dois.

      Cuba e a loucura do Ebola, o meu sobrinho estava em Nova Iorque e ao ver a TV só falavam na altura nisso,…os maus dos cubanos acabaram com o problema, na vez de entrar em modo medo/histeria/falta de soluções, falta de soluções num país que se diz cheio de dinheiro e "entrepeneurs(da treta)" e exportam como se fosse algo novo o empreendedorismo(com dinheiro dos bancos) e inovação! Inovação em quê? Quando muito tecnologia.

      pfff saiu, peço desculpa é muita hipocrisia e reinvenção histórica.

      nuno

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