A história do termoacumulador e da rodela rebelde

Grandes compras na casa de Informação Incorrecta!
Um termoacumulador, novinho em folha. Que luxo.

Reparar o velho? Nem pensar: custaria mais do que adquirir um novo. A nossa é uma sociedade rica, porque reparar quando podemos deitar tudo fora e voltar a comprar?

Portanto: novo termoacumulador adquirido e pago. E entregue por uma empresa  que não é a mesma onde o valioso objecto foi comprado. Estranho.
Mas tudo bem.

Ok, está em casa: obrigado por tê-lo transportado até aqui. Agora vão monta-lo, não é?
Não, quem monta é outra empresa ainda, a responsabilidade não é da transportadora. Tenho que esperar o dia em que o técnico autorizado aparecer.
Tudo bem.

E finalmente o técnico chega. Ele está autorizado a monta-lo: é rápido e eficiente. Muito bem. Abre a caixa e ops! uma rodela de plástico cai no chão. O que é isso? Ah, é a rodela para a regulação da temperatura. Bom, desencaixou-se, nada de grave, é só pô-la no lugar, fazer um pouco de pressão e…

O técnico não faz isso? Não. Claro que não: se durante esta operação a rodela se partir, depois a responsabilidade será dele. E nós não desejamos que o técnico passe problemas, não é? Até é simpático e dá um conselho: ligar para a assistência da marca.
Tudo bem.

Como sou pessoa inteligente, pego no telefone e ligo a marca para encontrar a solução. “Deseja que a marca envie a assistência técnica?”. Por causa duma rodela de plástico desencaixada? Ora essa, não me parece o caso… até poderia encaixa-la eu, só não faço porque se se partir depois a responsabilidade será minha e terei que encomenda-la, ir compra-la… não há por aqui, nas redondezas, um técnico autorizado? Ah, afinal há, muito bem, diga o número. Sim, vou ligar já, claro.
Tudo bem.

Pego no telefone. Stop, pára! Resumo:
1 empresa para vender.
1 empresa para transportar.
1 empresa para montar.
1 empresa para a assistência técnicia.
1 empresa para a intervenção técnica.

Entendo que sou pessoa muito sortuda: com todas estas empresas envolvidas, o termoacumulador deveria custar uns quantos milhares de Euros, não poucas centenas.
Mas tudo bem.

É altura de ligar. E o técnico atende! Pois, é uma coisa banal, uma miserável rodela de plástico. Ah não? Não é tão simples assim? Pois não, que estúpido que sou. A marca deveria ter preenchido a ficha que, de seguida, deveria ter sido enviada para a empresa das redondezas. Não ficha? Não responsabilidade. Agora fez-se luz, agora entendo o quadro geral. Agora vejo a minha ingenuidade. Sim, claro, faz todo o sentido.
Tudo bem.

E mais uma vez: sou pessoa sortuda, porque na empresa há este técnico simpático que irá contactar directamente a marca, evitando-me a fadiga. Mas depois?

Oh, depois será tudo mais simples: na próxima semana, a empresa das redondezas irá telefonar-me para marcar um dia no qual efectuar a inspecção. Uma inspecção? Óbvio. Se for um “defeito de fabrico”, então o técnico irá proceder à reparação. Que depois significa encaixar a estúpida rodela de plástico.
Tudo bem.

Tudo bem? Não propriamente: porque poderia não ser um “defeito de fabrico”. Pode ter sido um transporte efectuado em condições inadequadas. Então aí tudo muda, há uma reviravolta, porque a marca não se responsabiliza. A culpa não foi dela. E é verdade: não foi mesmo!

Mas este é o cenário pior: porque aí terei de contactar a empresa transportadora, pedir que esta assuma a responsabilidade e contacte a assistência técnica dela. Que, obviamente, é outra empresa. Por causa duma rodela de plástico, cujo custo de produção estará próximo do zero.
Sim definitivamente está tudo bem.

Lembro do dia em que os meus avós compraram uma máquina lava-roupa, na loja perto de casa. Era o mesmo dono da loja que a entregava e a punha a funcionar pela primeira vez. Dois dias depois a ficha deixou de fazer contacto bem. Um telefonema ao dono, este que diz “tudo bem, passo depois do almoço para substituí-la”.

Outros tempos, tempos obscuros, nos quais havia uma perigosa proximidade entre vendedores e clientes. Trabalhava-se com base em algo chamado “confiança”, as pessoas assumiam responsabilidades incríveis. Tempos estranhos também, nos quais os objectos duravam mais e, quando avariados, não eram substituídos mas reparados. Um autêntico filme de terror.

Fiquem descansados: aqueles tempos já foram e nunca mais voltarão.  

Ipse dixit.

3 Replies to “A história do termoacumulador e da rodela rebelde”

  1. Caro Max, eu diria que isso é a evolução da obsolescência programada, e digo mais,quanto mais se "terceiraliza-se" mais sub-empregos e impostos geram-se! Onde "UM" poderia fazer todo o trabalho, 3 ou 4 são necessários para o mesmo fim, porem esses 3 ou 4 não recebem o mesmo que o "UM" receberia, ou seja… o "UM" receberia 1.000 e faria o serviço completo, já os 3 ou 4 receberiam 500 cada pelo serviço fragmentado e nenhum tem a responsabilidade por tudo (SERVIÇO)! Trabalho escravo???

    Saudações

    Zé Ruela

  2. E digo mais ainda… a estrutura é piramidal, onde a gente tem que ir subindo os degraus!
    Primeiro fala-se com o robô: Digite 1,5,7,9….
    Depois fala-se com uma pessoa que não sabe de nada, e ela te transfere para outra que sabe um pouco mais que nada, e assim sucessivamente até chegar em alguem que, visto que você ficou 1/2 hora no telefone te da uma "solução" que é aguardar a visita do "TECNICO"!
    NUNCA você consegue falar com o "topo", o Zóiao é inacessível !!!!

    Zé Ruela

  3. Admito, não estou bem … a noite foi forte e bem forte… mas com tudo o que li no post e a minha capacidade de leitura esta turva… com tanta queixa e complicação Max… pensei que tinhas comprado um dispositivo…TERMONUCLEAR. em vez de um termoacumulador. Isso compra-se naquelas lojas em que se nao estas satisfeito devolves o equipamento e eles devolvem o dinheiro na hora. Nem parece coisa tua.

    EXP001

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