Insólito: o Big Bang cansou

O modelo cosmológico mais acreditado prevê que o Universo tenha nascido duma grande explosão inicial, o Big Bang.

Esta teoria é tão bem radicada na comunidade científica que até a Igreja de Roma decidiu adopta-la: neste caso, Deus não criou o mundo em 6 dias, mas foi a causa primária do Big Bang que, explica a Igreja, a partir daí começou a funcionar segundo as regras estabelecidas por Deus.

Afinal, o que a Astrofísica faz é apenas tentar entender quais as “regras do jogo” estabelecidas inicialmente por Deus.

A teoria do Big Bang é simples e bastante hollywodiana (uma mega-explosão!), mas também é verdade que apresenta problemas, alguns dos quais ainda não encontraram uma explicação suficientemente válida.

Um entre todos: segundo a teoria do Big Bang, a explosão inicial teve origem numa singularidade. Esta é, aproximadamente, um ponto do espaço-tempo no qual a massa, associada com a sua densidade e a campo gravitacional, são infinitas.

Problema: ninguém alguma vez viu uma singularidade. E descreve-la nem é simples: de facto, nem a Teoria da Relatividade nem a Teoria dos Quantos conseguem hoje descrever o Big Bang (o “antes” e o “durante” da explosão), mas só o “depois”. Até Stephen Hawking, o “pai” dos buracos negros (no centro dos quais deveria existir uma tal singularidade), começa a ter dúvidas.
É por isso também que surgiram teorias alternativas.

Adivinhe o Leitor? Exacto: é o que vamos ver a seguir.

Do nada

Sabem a chamada “memórias flash” dos computadores portáteis, das pendrives (as “canetas”), dos telemóveis? Funciona com um princípio da Física Quântica, o “efeito tunel” que, simplificando, podemos descrever desta forma: uma partícula pode ultrapassar uma barreira sem necessitar de nenhuma fonte de energia.

Agora, tentamos aplicar isso ao Universo: será que pode ter nascido por causa dum “efeito túnel” espontâneo, sem necessidade dum “input” inicial? Um Universo “do nada”?

O físico Alexander Vilenkin pensa isso mesmo: não há necessidade duma singularidade, nem duma fonte de energia. O Universo seria um almoço de borla.

Parece esquisito? Sim, sem dúvida: mas o “efeito túnel” existe de verdade, as partículas conseguem ultrapassar as barreiras mesmo sem uma adequada energia. Neste caso a pergunta seria: mas donde teriam vindo estas partículas? A resposta é mais complicada. Em primeiro lugar o “nada” não existe, só em laboratório: mesmo no imenso espaço entre as estrelas, só para fazer um exemplo, há sempre algo, como poeiras ou até algo mais pequeno, como os átomos.

Podemos pensar no “antes” do Big Bang como um lugar terrivelmente frio, totalmente escuro, ocupado por partículas sub-atómicas? Neste caso os tijolos da matéria já estariam presentes, só à espera dum “efeito túnel” que desencadeasse o nascimento do Universo tal como hoje é conhecido.

Isso empurraria para trás a origem de tudo: donde vinham estas partículas, os tais tijolos da matéria?
Verdade: mas em lado nenhum está escrito que o Big Bang tenha sido “o primeiro” de todos os acontecimentos.

Existe também uma explicação muito mais complexa: o Universo nascido dum efeito túnel e sem que existissem os tijolos primordiais de matéria. É uma possibilidade teórica. Mas aqui as coisas complicam-se de forma terrível.
Vamos em frente.

Infinito

Pode o Universo ser infinito? Pode.

E a vantagem da próxima ideia é que não precisa de teorias tão complicadas: o Universo teria sempre existido, num estado de quiete (um estado “estacionário”, que depois era a primeira ideia de Einstein), para depois tornar-se instável, produzindo fenómenos novos (ou reproduzindo fenómenos já acontecido num passado muito, muito distante: seria um Universo cíclico), tais como o Big Bang.

Ou, talvez, criando um Universo em expansão (como parece ser o nosso) mesmo sem uma fase de Big Bang.

Em qualquer caso: tudo ficando com as teorias clássicas (a Relatividade), sem incomodar a Teoria dos Quantos.

Segundo quem sugere esta teoria (George Ellis da Universidade de Cape Town e Roy
Maartens da Universidade de Portsmouth), na fase de calma o Universo era de dimensões muito reduzidas (mas não ao nível quântico) e era capaz de ficar no estado estacionário pois a energia negativa do vazio balançava a energia positiva do mini-universo.

Frio

Parecida com a anterior, a teoria do alemão Christof Wetterich, da Universidade de Heidelberg, é muito recente e propõe um Universo com uma idade muito mais antiga daquela aceite agora: 50.000 biliões de anos e não 13.8 biliões.

Segundo Wetterich, o Universo atravessa várias fases, de expansão e de contracção: o que definimos como Big Bang, na verdade, seria apenas uma das muitas épocas de expansão. O Universo, portanto, não estaria em continua e infinita expansão, mas numa fase que, cedo ou tarde, provocaria a contracção da matéria até um Universo de dimensões mais reduzidas. Um Universo lento e frio, que depois retomaria o ciclo de expansão, sem passar pela singularidade.

Loop

E se Wetterichh estivesse errado? E se o Universo pequeno estivesse muito quente?
É disso que fala a teoria do Big Bounce, que podemos traduzir como “o Grande Ressalto”.

Apresentado pela primeira vez em 2007 na revista Nature Physics por Martin Bojowald da Pennsylvania University, o Big Bounce admite um Universo em contracção, mas introduz temperaturas elevadas e dimensões excepcionalmente reduzidas. Mas quanto reduzidas? Eis o que distingue esta teoria: reduzidas sim, mas nada de singularidade. As Leis da Teoria Quântica impediriam a formação da singularidade e, uma vez atingido o limite mínimo, o Universo começaria a expandir-se muito rapidamente, naquilo que hoje chamamos de Big Bang.

Qual a diferença entre este teoria e aquela do Universo Infinito, apresentada por George Ellis e Roy
Maartens? No Big Bounce não há um estado de quiete inicial, pelo contrário: o Universo encontra-se em continua expansão e contracção. Na prática, o nosso poderia ser apenas um dos muitos Universos já formados e desaparecidos. Um loop cósmico, talvez infinito.

Grande vantagem desta teoria: concilia a existência da radiação cósmica de fundo e do período inflaccionário, dois pilares da teoria clássica do Big Bang. Afinal, no Big Bounce houve um Big Bang, com todos os efeitos dele: só que não foi o primeiro (e nem o último).

 Multiverso

As últimas três são teorias que têm muitos pontos de contacto e que interpretam o Big Bang como uma fase de passagem.
Mas se o nosso Universo não fosse o único?

Imaginem muitos universos, cada um separado dos outros por uma distância pequena, como as fatias duma forma de pão. Estas fatias têm um nome: branes. Podemos identificar as branes como dimensões (apesar deste ser um grave erro: a brana é uma coisa bem diferente, mas fica bem no nosso exemplo): o Universo no qual vivemos poderia existir numa brana, ao “lado” de outro(s).

Estas branas nunca entrariam em contacto entre elas: mas se entrassem? Haveria a libertação duma energia imensa, o que bem poderia dar origem ao fenómeno que nos chamamos de Big Bang (ou aniquilar um universo já existente).

Esta teoria, apresentada em 2007 pelos cientistas Neil Turok e Paul Steinhardt, tem um certo sucesso porque fica mal perante a clássica teoria do Big Bang (aquela com a singularidade), mas fica muito bem com a Teoria das Cordas, algo complexo e em plena fase de estudo, que poderia revolucionar as nossas ideias, unificando as quatro grandes forças que regem o nosso mundo (Gravidade, Nuclear Forte, Nuclear Fraca e Electromagnética).

Uma boa notícia para Neil Turok e Paul Steinhardt: esta é a minha teoria favorecida.
Se acham pouco…

Aqui e Agora

Algo ainda mais radical? Seja.

O físico Julian Barbour sugere que não há necessidade de pensar no que aconteceu antes do Big Bang; o tempo não existia antes do evento. Aliás, segundo Barbour o tempo não existe mesmo, é intangível. Para Barbour, só a mudança cria a ilusão do tempo.

Mas se o tempo não existe, se for apenas uma ilusão, isso significa que existe apenas o “agora”. E é mesmo isso que Barbour acha: não importa como os “agora” são feitos, todos estão completos e independentes um do outro. Nesta teoria, tudo existe simultaneamente. Até o Big Bang: é simplesmente a nossa perspectiva que faz parecer o Big Bang tão longínquo.

Estas são as teorias alternativas mais acreditadas hoje em dia.
Outras, como a Teoria do Estado Estacionário por exemplo (apoiada por Albert Einstein numa primeira fase), com o tempo perderam o favor da comunidade científica, sendo que as observações não conseguiram confirma-las.

Mas todas não passam disso: teorias. Até a mais acreditada, a teoria clássica do Big Bang, apresenta problemas de não fácil solução. Muitos cientistas já prevêem uma Nova Física, da qual irá nascer uma nova forma de ver o Universo no qual vivemos: as nossas actuais teorias ficarão para o lixo, tal como aconteceu para muitas outras.

Por enquanto, todavia, estas são as que temos. E, como afirmado, eu voto no Multiverso.
As razões? Científicas, sem dúvida: faz-me lembrar as Crónicas de Riddick.

Aconselhados

Michio Kaku: Mundos Paralelos

Michio Kaku é um físico teórico estadunidense. É professor e co-criador da teoria de campos de corda, um ramo da teoria das cordas.

Além disso é divulgador científico: pega em assuntos complicados e consegue explica-los de forma extremamente simples. Por isso os livros e ou programas televisivos  deles têm muito sucesso.

Mundos Paralelos é um livro de 2005 mas bem actual: nele Kaku apresenta muitas das principais teorias da física (a newtoniana, a Relatividade, a Quântica, a Teoria das Cordas e até mesmo uma nova versão desta última, denominada Teoria-M).

Uma descrição abrangente das muitas teorias mais interessantes da física, incluindo as previsões de cada uma e o pensamento de físicos, astrônomos e cosmólogos que estão à procura das respostas.

Vale a pena.

A Teoria do Big Bang

Ok, ok, não é propriamente “científico”.
Mas é muito divertido.

Ipse dixit.

Fontes: La Crepa nel Muro, Pianeta Blu News, eHow, várias páginas de Wikipedia (versão inglesa: The Astronomy Portal, que existe também na versão portuguesa)

6 Replies to “Insólito: o Big Bang cansou”

  1. Muito bom.
    Para enriquecer o assunto: " A Grande Síntese" , a obra prima de Pietro Ubaldi. Uma abordagem sobre o universo, sem materialismo cientifico ou fanatismo religioso.

  2. As idéias sobre o Big Bang são parecidas com a teoria evolutiva de Darwin e no seguinte aspecto:elas mostram o que nossos equipamentos podem averiguar: átomos vibrando na frequência tridimensional que revelam DNA e infinitas sub-partículas. Como não há como provar cientificamente a presença de partículas muito mais aceleradas então caminhamos lentamente através da física quântica, oque é um bom sinal ao menos…
    O Big Bang parece ter existido mas junto com ele, toda uma gama de campos de percepção não detectados por instrumentos e pelos 5 sentidos , passam desapercebidos. Então todas as questões atuais, reflexões, experimentos e teorias são apenas parte de um processo aonde algo misterioso chamado de Infinito, um dia resolveu se tornar Finito e apenas para experimentar-se…bom caro colega estou começando a pirar nas palavras e não é um bom sinal rs…grande abraço Max!

  3. Big Bang não acredito (por inúmeras razões). Mas se a ciência actual aceita como a teoria mais plausível, acho que têm um imenso caminho a explorar em várias direcções até chegar mais perto se é que algum dia lá chegam. Concordo com o raciocínio de Ricardo Alves, podia desenvolver um pouco mais…acho que é por aí.
    Abraço
    Nuno

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