Portugal e a nova fronteira da medicina: os tubos

É domingo, dia de descanso, por isso vamos tratar de assuntos mais leves, menos sérios.
Por exemplo: Portugal.

O Governo quer poupar, porque como sabemos não é possível recapitalizar os bancos privados com dinheiro público, pagar os juros da dívida aos bancos internacionais e ao mesmo tempo fazer funcionar o Estado como se nada fosse: alguém tem que apertar o cinto.

Eis então uma medida muito bem pensada: o Ministério da Saúde anuncia que os hospitais vão passar a poder reutilizar os cateteres usados em endoscopias e colonoscopias, tal como alguns dispositivos utilizados em obstetrícia.

Parece um retrocesso de 20 anos ou até mais, mas o que o Ministério quer dizer é que os pacientes portugueses viveram até hoje acima das suas possibilidades. E, pensando bem, isto é verdade.

Se um cateter entrou na boca, no ânus, na vagina ou no pénis dum paciente, porquê deita-lo no lixo? É um cateter que já foi testado com sucesso, demonstrou funcionar e destrui-lo seria um desperdício: é prática lógica e de muito bom gosto (em todos os sentidos) reutiliza-lo num outro paciente, com satisfação de todos.

O Ministério fez duas contas e chegou à conclusão que a reutilização dos cateteres permite uma poupança de 45 milhões de Euros por ano. Pessoalmente acho esta medida do Ministério estar incompleta, porque seria possível ir mais além: afinal um cateter é um simples tubo e um tubo utilizado numa colonscopia dum paciente poderia bem dar para a endoscopia dum outro, com uma poupança ainda mais significativa.

Mas por enquanto apreciamos esta nova medida que, é bom realçar, tem um não sei o quê de ecologista também (reciclagem, meus senhores, reciclagem).

Único senão:

A reutilização de dispositivos de uso único foi autorizada pelo ministério da Saúde. De fora ficam aqueles que são implantáveis no corpo do doente.

E não se percebe qual a razão. Que dizer: enquanto o doente estiver vivo, até se pode perceber, mas quando o doente falecer por qual razão não extrair o implante e reutiliza-lo em pacientes vivos? Pelos vistos há ainda alguns pormenores que devem ser consertados, mas o espírito está correcto.

Infelizmente, há quem não confie nesta ideia do Ministério:

Em declarações ao «Correio da Manhã», a Associação de Empresas de Dispositivos Médicos diz-se preocupada com a segurança dos doentes e quer garantias que os materiais reutilizados vão estar nas mesmas condições apresentadas por materiais novos.

É triste mas é normal, em Portugal deve haver sempre a figura do “Velho do Restelo”: são estas as pessoas que atrasam o desenvolvimento do País, são estes os bota abaixo nacionais.
Melhor ignorar.

Dúvidas

O Leitor terá umas pequenas dúvidas. Por exemplo:

Pergunta: Mas não será que isto pode facilitar a transmissão de doenças?
Resposta: Não.

Estamos aqui a falar das infecções nosocomiales: já o termo parece uma coisa de conspiradores, como Haarp ou Bilderberg, mas a verdade é que a introdução de material descartável reduziu e quase eliminou o risco de contágio entre pacientes. As infecções nosocomiales são coisas do passado.

Pergunta: Mas não será que a reutilização pode trazer de volta as tais infecções nosocomiales?
Resposta: Não.

A introdução de material reutilizável produziu a extinção das infecções nosocomiales. É um pouco como com a varíola: foi extinta e nunca mais voltou, o conceito é o mesmo.

Pergunta: Mas a esterilização do material reutilizável pode ser mal feita, não pode?
Resposta: Não.

Esta pergunta nem mereceria resposta, pois põe em dúvida a seriedade e o profissionalismo dos operadores sanitários. Até parece que vivemos num País onde seis pessoas vão para hospital para pôr umas gotas nos olhos e saem cegas. A simples verdade é que as modernas técnicas de esterilização não deixam margem para dúvidas.  

Resolvidas estas insignificantes questões, não resta que sorrir e aplaudir a visão de longo alcance do Governo: porque a verdade é que Portugal vai tornar-se o ponto de referência no âmbito das curas hospitalares do século XIX. Ou até do princípio do XX.

Ipse dixit.

Fonte: Tvi24

5 Replies to “Portugal e a nova fronteira da medicina: os tubos”

  1. Olá Max: não leva a mal, mas de três, uma;ou estás brincando, ou delirando, ou lestes mal. Simplesmente porque isso que afirmas é impossível. Se fora até meados do século passado, quando seringas, agulhas e cateteres eram feitos de pirex e/ou metal, vá lá, era prática corriqueira ferver, flambar ou aquecer sob pressão porque tais materiais resistiam a altas temperaturas. Mas hoje o plástico domina tudo, e derrete se submetido a esterilização. Seria como dizer: "agora em diante vamos reutilizar as seringas descartáveis, passando uma aguinha nelas" E abrir as portas da infecção hospitalar generalizada. Não existe isso! Abraços

  2. Olá Maria 🙂

    Esta notícia tem como base este Despacho: http://dre.pt/pdf2sdip/2013/05/104000000/1719617197.pdf

    O que é e como se faz o "reprocessamento" lá mencionado não sei, mas confesso que me é impossível perceber que mudem os procedimentos desta forma quando as infecções hospitalares são um problema tão grave… quais serão os seus custos?

    Independentemente da qualidade e das garantias do "reprocessamento" não percebo como arriscam aumentar o número de infecções/contágios para poupar 45 milhões… não vi o relatório que deu origem a esta possível "poupança", mas pergunto-me quanto terão colocado nos custos decorrentes desta alteração de procedimento… esses custos têm de existir.
    Como em tudo na vida, nada tem só vantagens.

    Abraço
    Rita M.

  3. Olá Maria, esterilização hoje em dia não é feita com calor, e sim com Óxido de Etileno, método aprovado pela ANVISA no Brasil, como no Hospital onde trabalho. É esterilização a frio. A dificuldade que vejo neste caso é que para limpar cateter por dentro é preciso de escovas especiais e uma lavadora ultra-sônica. A esterilização também não limpa o material, isto é, ele tem que ser enviado limpo para a empresa, em sujeira aparente. Mas isso nunca foi feito com dispositivos descartáveis, que são feitos para durar por apenas um uso. E economicamente não compensa, pois esta esterilização é cara. Nenhum Hospital daqui, nem o Sírio Libanês ou o Albert Einstein tem capacidade técnica para esterilizar estes materiais, sem estragar ou danificar o material.

  4. Oi Ricardo Luiz: obrigada pelas informações, mas…e isso é uma lástima, chegamos ao mesmo: é absurdo reaproveitar cateteres. Abraços

Obrigado por participar na discussão!

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