Citrinos & yogurt em molho grego. E português.

Portugal e Grécia.
Notícias boas e divertidas do primeiro, tristes e preocupantes do segundo.
Normal.

Portugal: 16.9% e basta de electricidade

Portugal acaba de bater um novo recorde. País virtuoso este, que nunca descansa: a taxa de desemprego atinge 16.9%, isso enquanto as previsões do governo apontavam 15.5%.

Este governo tem um dom muito particular: nunca acerta uma previsão, nem que seja por mero engano. Duma certa forma, é uma especialidade, temos que admitir.

Mas não há apenas notícias más, há também as boas.

Uma é que o Estado poupa: só 43% dos desempregados recebem um subsídio, os outros apanham moscas.

Outra é que ninguém terá de gastar tempo na procura das razões que justifiquem uma retoma económica. Isso porque a economia afunda: a economia portuguesa acentuou a queda no final do ano, -3,2% no total.
O governo tinha previsto – 3%, obviamente.
Desconfio que alguém tivesse avançado a percentagem correcta, mas imagino isso ter gerado uma dura polémica no governo: “Ehhhh? -3.2%? Mas estás louco o quê? Queres quebrar a tradição, queres começar a acertar nas previsões agora???” E a seguir porradas entre os Ministros. Este, repito, é apenas o meu palpite.

O que interessa reter é que o tratamento FMI-BCE continua a funcionar na melhor das maneiras, resultados são coisas que não faltam. Doutro lado, as Mentes Pensantes que gerem o processo de “salvação” de Portugal são as mesmas que conduziram França e Alemanha para um novo agravamento das economias no último trimestre (-0.3% e -0.6% respectivamente), não admira uma certa coerência de fundo.

Se depois até o Presidente da Comissão Europeia (o simpático Durão Barroso) afirma que “em Portugal, apesar de alguns indicadores permanecerem negativos,
há elementos positivos que resultam da aplicação do programa de
ajustamento”, então temos o quadro completo e a certeza de estar em boas mãos. 

Mas eram estas as notícias divertidas? Não, é outra, a seguinte: o Estado português sai definitivamente do comparto da electricidade, abandonando a EDP (Energias de Portugal). Para fazer isso, o Estado aceita um prejuízo de 636 milhões de Euros.

Por isso, vamos resumir: o Estado vende a participação numa empresa com um valor de mercado de 13.9 mil milhões de Dólares, que factura 14.170 mil milhões de Euros, com um lucro de 1.234 mil milhões de Euros e consegue um prejuízo de que 636 milhões de Euros? Mas quem é que faz as contas no governo, um kamikaze à portuguesa?

E, tanto para ficar no Oriente, os Chineses agradecem: China Three Gorges é o adquirente, empresa que evidentemente sabe fazer as suas contas, e bem.

Grécia: fora do Euro e já

Bom, quando o Leitor acabar com o bom humor, pode ler o que se passa na Grécia também. Aqui riem menos, muito menos.

Os supermercados são assaltados. Não por parte de bandidos armados, nada disso: são as pessoas normais, famintas, que nem têm armas, apenas a cumplicidade dos funcionários que dizem “Tomem o que conseguirem”.

Isso enquanto a União Europeia ordena a destruição de toneladas de laranjas e limões (todos produtos gregos, óbvio) para conter os preços do Velho Continente. Porque é assim: na Grécia podem até morrer de fome, mas o citrino em Paris tem que ter o preço bem controladinho, ora essa.

Mais ou menos 150 agricultores recusaram destruir a comida, carregaram tudo nos camiões e começaram a entregar a fruta aos cidadãos, explicando o que se estava a passar, nas praças das cidades.

Outros 200 donos de empresas de leite, agora escravos da multinacional alemã Muller (que com a crise adquiriu as empresas deles em troca de migalhas) carregaram 40.000 yogurtes os camiões e, em vez que envia-los para a Alemanha, foram também distribui-los gratuitamente nas cidades, em frente das escolas, dos hospitais, das empresas.

Entretanto a polícia observa e quando pode faz algo. Como por exemplo massacrar quatro rapazes anárquicos que tinham confessado (na foto à direita): “Sim, fomos roubar num supermercado e depois partilhámos tudo com as pessoas nas ruas”.
Ahi os malandros! Nada de advogados e dois internados com graves lesões. E ainda bem que um polícia arrependeu-se e contou tudo aos jornais (locais, pois fora do País nada passa).

Mas tudo isso faz sentido? Claro que faz, como explica o mais importante economista alemão, o professor Hans Werner Sinn, conselheiro pessoal da simpática Angela Merkel.
Com outros 50 economistas e o apoio do representante do sistema bancário europeu, Sir Moorald Choudry (vice-presidente da Royal Bank of Scotland), apresentou um relatório urgente.
Destinatários: o Conselho da Europa, a Presidência do Banco Central Europeu, o Departamento Orçamento e Tesouro da União Europeia.
Assunto: a Grécia tem que sair da Europa, e tem que sair já.

Atenas tem que abandonar a Zona Neuro, desvalorizar a própria moeda 20-30%, caso contrário entrará numa espiral sem fim que terá como resultado final a definitiva destruição da sua economia. O professor Sinn fala de “tragédia humana” e chega a imaginar uma intervenção das Nações Unidas.

A Grécia ficou bem espremida, agora já não pode dar nada. Até pode desaparecer e entrar naquele que até poucos meses atrás era descrito como o Armageddon de qualquer País, a saída da Zona NEuro.
E, talvez, renascer.

Eu fico com a minha dúvida: qual será a cor do próximo Papa?
E bom Dia dos Namorados.

Ipse dixit.

Fontes: Come Don Chisciotte (1) (2), Público (vários links da edição de hoje).

5 Replies to “Citrinos & yogurt em molho grego. E português.”

  1. 'Eu fico com a minha dúvida: qual será a cor do próximo Papa?' Pois é Max, a duvida é tramada.
    Não conheces ninguém no governo? Era certinho, se ele dissesse que o próximo Papa era branco, então iria sair preto. Muitos leitores finalmente iriam dormir descansados.

    Relativamente ao afirmado pelo Sir Moorald Choudry, a Grécia ter de sair do euro, era uma coisa que eu já suspeitava que viesse a acontecer. Talvez eu e mais uns milhões de europeus.
    Quando tal suceder uma nuvem negra pairará sobre o rectangulo.
    Esta minha previsão fica reforçada pelo facto dos nossos governantes dizerem que após o programa de ajustamento, a nossa posição na zona euro ficará mais forte.

    abraço
    krowler

  2. Olá Max e Krowler: é impressionante a semelhança de Portugal com com o Brasil, em épocas chamadas neoliberais, no que concerne aos governantes e suas governanças. Os governantes sempre certos de suas afirmações malogradas, desditas pelos acontecimentos, logo a seguir. Enquanto a economia afundava, os meios de comunicação falavam de retomadas do crescimento, mesmo que as páginas de capa das revistas mostrassem plataformas de petróleo afundando no oceano, por descaso e conveniência para a seguinte privatização do patrimônio público. Por sinal, era dessas privatizações que se obteria recursos necessários ao funcionamento do Estado, e as empresas antes estatais, afinal seriam rendosas. De fato, nem uma coisa nem outra: está provado que o dinheiro das privatizações fez aparecer mais empresas off shore, enchendo bolsos privados, e a administração privada das estatais tornou-se exemplo de serviços de baixa qualidade para os usuários.
    Houve uma diferença, na minha opinião, no comportamento das vítimas: no Brasil, nem o menor resquício de revolta da população…a canga acostuma!! E o que vem da governabilidade, bom ou mau, nós brasileiros estamos acostumados a recebe-lo como mimo, e não fruto de conquista. Considero o período que antecedeu a ditadura civil-militar de 64, apenas um hiato na história da subserviência, entre nós. Abraços

  3. o mundo n tem mais jeito (para nossas gerações).Se em 4~6 mil anos de historia da humanidade nunca ouvi falar de algum lugar que houvesse justiça plena, n sera em 75 anos vida media de um brasileiro que o mundo mudara, ate 2 anos atraz eu tinha esperança q os jovens como eu podesse mudar a realidade desse país (brasil), mas n vejo nada acontecer no meu país, o jeito é se adaptar e sobreviver como sempre fizeram os older-latinos.
    Fico triste ao voltar da universidade no onibus e ouvir alguns colegas anciosos para saber os acontecimentos das novelas e do BBB…o bom é saber que sao alguns colegas e nao todos.

  4. Se alguém tem alguma dúvida sobre a permanência da Grécia no Euro ou não, que pegue num maço de notas de 10 euros e tente encontrar alguma com o número de série começado pela letra Y, coisa que a uns tempos era em abundância.

  5. A crise não é casual, como se fosse apenas o mercado ajustando oferta e procura.
    Ela é produzida e conduzida pelas grandes corporações, com o objetivo de retirar aquelas empresas menores, que crescem e prosperam nos momentos de crescimento econômico. São elas que geram emprego e renda para a população.
    Nessa fase da crise, muitas empresas menores quebraram, deixando muitos desempregados, enquanto que, grandes empresas vêm apresentando lucros com redução do número de empregados.
    Assim funcionam as crise e quando esta passar, a próxima estará sendo contruída de forma gradual, sem que percebamos.

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