Portugal visto de fora

O site italiano Stampa Libera pediu-me um artigo acerca da situação portuguesa, o que foi publicado hoje.

O artigo em si não interessa, pois são coisas que este blog tratou inúmeras vezes. O que interessa é a resposta dum dos Leitores, Marco Turi Daniele, o qual conhece o País pois vive dividido entre Roma e Fátima.

É uma das ideias que no estrangeiro têm de Portugal.
Vamos ler.

Conheço a situação em Portugal. Posso confirmar quanto relatado por ti.
Mas, talvez, a situação também esteja muito pior.

Anos atrás foi proibido aos camponeses e pastores continuar produzir azeite e leite. Entre outras coisas, Portugal não é um grande fabricante de queijo [nota: Portugal, de facto, não está entre os grandes consumidores ou exportadores de queijo, ndt].

É esta é a razão pela qual preferem vender as azeitona em em caixas de 10 kg (10 euros), em vez que de  azeite (muito bom) a 2,5 euros por litro (o que requer 5 kg de azeitonas ).

O salário médio é de 500 euros e já estão escravizados ao máximo, porque em quase todos os sectores secundário e terciário estão previstos turnos da noite. Domingo como um dia de família não existe há muito tempo.

Os governantes, se por um lado cortam nas despesas primárias (hospitais, escolas, juízes) e nos salários, por outro constroem infra-estruturas majestosas e ficaram endividados com dois submarinos que nem prestam neste lado da costa.

Portugal também é um País onde as pessoas não estão conscientes. Não sabem praticamente nada sobre as conspirações, a geopolítica e os máximos sistemas. Assim, o discurso deles é apenas inerente o Governo: o anterior tinha sido melhor, agora é o pior, o dantes era socialista (Sócrates) e fez as porcarias dele, o de agora herdou uma situação desastrosa. Em suma, como os galos de Renzo [referencia para uma obra prima da literatura italiana, I Promessi Sposi, no qual aparecem dois galos, vítimas designadas que ignoram o próprio destino e as causas dele, ndt].

Além disso, em Portugal existe um submundo de criminosos que brincam com as pessoas com o jogo dos cartões de crédito. Basicamente, um jogo pouco claro no final do qual estão todos mais endividados [referencia ao sistema de gestão dos cartões de crédito entre Banco Central e sociedades privadas em Portugal: um assunto que ainda não foi tratado neste blog, ndt].

É por isso que contentam-se de trabalhar por 500 Euros por mês: para pagar as dívidas. Mas não sabem nada de nada e depois, ingénuos, continuam a mover-se na direcção do abismo.

As reacções de hoje em dia não são contra estas coisas que tentei listar, mas apenas para o alto custo da vida e as medidas económicas tomadas por este Governo, enquanto contra o dano real provocado pelo anterior Governo, ninguém tinha saído para a praça (em Portugal não existem verdadeiros sindicatos, mas porque, entre nós existem?).

Há um ponto que acho ser merece ser realçado neste comentário: a ignorância (do latim ignorare , “não saber”). É uma das primeiras características nas quais reparei uma vez começado a perceber um pouco do idioma local. O Português vive num mundo tudo seu, cujos limites são as fronteiras do Estado: pouco ou nada conhece do que se passa “lá fora”.

Se o Leitor acha que for minha intenção ofender Portugal está redondamente enganado: o que ganharia com isso?

Pelo contrário, trata-se duma característica, provavelmente fruto do isolamento ao qual o País foi condenado durante o período Salazarista. Evitada uma autêntica revolução industrial (como na Inglaterra do séc. XVIII, com os antigos camponeses obrigados a ter mais contactos com outras realidades nas novas fábricas), nem o facto de ter tido colónias parece ter ajudado muito: enquanto alguns tentavam a sorte no Ultramar, a maioria da população continental continuava a vida nos campos, tendo a aldeia como horizonte.

Uma situação não única, mas mantida até meados dos anos ’70 do século passado: e isso sim que foi invulgar.

Outra característica que parece ter sido gerada pelo período da ditadura é o facto do Português pensar que os destinos do Pais estão nas mãos do governo de Lisboa. Nem lhe passa pela cabeça que possam existir realidades supranacionais, algumas das quais até ocultas: o Português, mesmo que entre em contacto com este mundo, considera tudo como “bobagem”, coisas frutos da fantasia quando não de alucinações, por isso não presta atenção.

O resultado é o escasso número de blogues ou sites que tratam deste tipo de assuntos e que gozam de pouca autoridade (Informação Incorrecta é um deste). Os blogues de sucesso em Portugal são ou blogues que tratam da sociedade, do costume, ou blogues ligados ao mundo da política (mas sempre no âmbito da representação parlamentar e em particular dos dois principais partidos nacionais).

Ah, ia esquecer o futebol, claro.

Não é possível uma comparação, por exemplo, com o mundo informático do Brasil, bem mais “multi-cultural” e “aberto”: não é por acaso que 60% dos Leitores deste blog são oriundos do País sul-americano. E isso, reparem, num blog que nem dedica muito espaço ao que se passa no Brasil (aliás, sei que deveria integrar a realidade brasileira nas páginas de Informação Incorrecta, e no futuro isso será feito). 

É óbvio: o presente é um discurso ingrato, muito generalizado e há excepções, em particular entre as gerações mais jovens, acostumadas aos veículos de informação como internet. Mas a actual é uma realidade que persiste e que inviabiliza a plena compreensão de fenómenos mais amplos, cujas origens, não estão em Portugal.

Também este é o triste fruto das ditaduras. A cura é apenas a paciência, pois as ideias não podem ser mudadas no espaço duma curta noite.

Ipse dixit.

Fontes: Stampa Libera

7 Replies to “Portugal visto de fora”

  1. Olá Max: grande comentário deste sujeito que lê o blog italiano! E enquanto lia o dele e o teu, pensava em quanto de semelhança existe entre o povo português e o brasileiro: o fruto do isolamento, a pobreza que determina o isolamento, a ignorância decorrente do isolamento.
    E uma discordância contigo: o uso indiscriminado da internet, nem por isso gera conhecimento. Aqui é o reino encantado do "feice", das buscas sobre sexo (nunca sobre sexualidade), novelas, big brother, tratamentos de beleza,moda,novos ricos,famosos, futebol…Com isso não se avança grande coisa. Ah, e sem contar os chamados assuntos religiosos,os "games", a chamada "música sertaneja", e tantas pistas do nosso atraso intelectual, e da nossa mentalidade retrógrada. Abraços

  2. Muito bem explicada a situação que vive Portugal e outros países europeus. A fase de austeridade imposta a Portugal, nada mais é que a transferência do patrimômio dos portugueses para o setor financeiro.
    Quem manda em Portugal não é o governo, e sim, as corporações que estão acima das nações.
    No Brasil aconteceu o mesmo após as privatizações.
    O povo precisa retomar o poder e libertar-se do sistema.

  3. maria: esses conteúdos que se buscam na internet aí no Brasil fazem lembrar qualquer coisa aqui em Portugal…e quanto ao Big Brother, deixe-me contar-lhe uma coisa: aqui, desde 1999 que há um canal que começa um "reality show" em meados de Setembro para acabar precisamente no fim do ano, para lucrarem com audiências com um programa dois-em-um…e se nos reality shows iniciais ainda se consegia distinguir alguma diferença de personalidade e de inteligência entre os concorrentes, isto agora vai de mal a pior…

  4. "Também este é o triste fruto das ditaduras. A cura é apenas a paciência, pois as ideias não podem ser mudadas no espaço duma curta noite."

    Sim, não será numa curta noite que as ideias mudam 🙁

    Aliás, a opinião de demasiadas pessoas sobre o que se passou ontem, por exemplo, já para não falar em tudo o resto que se está a passar, e que realmente nem parece passar pela cabeça da maioria das pessoas… enfim, vai mesmo demorar muito.

    "[referencia ao sistema de gestão dos cartões de crédito entre Banco Central e sociedades privadas em Portugal: um assunto que ainda não foi tratado neste blog, ndt]."

    Eis outro assunto deveras interessante.

    Abraço
    Rita M.

  5. Max poderia aproveitar o genocidio da faixa de gaza para nos apresentar sua versao sobre verdades e mentiras sobre nacional socialismo, milagre alemao, eugenia, hegemonia branca, wallstreet, IBM, banco anglo-palestino, fundacao de Israel, financiamento internacional do genocidio em paralelo ao sucesso da economia interna alema… neh? 🙂

    Quando pesquiso sobre essas coisas sempre me deparo com neonazistas ou fanaticos cristaos de extrema direita… ai nao da para levar a serio! 🙂

  6. Vejo com muita tristeza a situação do país que descobriu o Brasil, queira ou não, a situação brasileira é bem mais confortável que a dos irmão lusos.
    Um grande abraço a essa nação fraterna.

  7. Triste saber que Portugal não é exceção e também está passando pelo mesmo processo de declínio que vemos na Espanha e outros países da Europa.

    Eu sou um brasileiro que morou na Itália e na Alemanha e posso lhe garantir que fenômeno semelhante ao que você descreve está acontecendo em todos os lugares.

    O nome disso é Nova Ordem Mundial e me parece que em Portugal ela já chegou um pouco adiantada.

    Para nós brasileiros, ela também se aproxima, mas a diferença é que quando isso acontecer, já estaremos acostumados, pois somos o país da escravidão e conhecemos nosso lugar. Somos um dos países que menos investe em educação no mundo.

    Como vê, minhas expectativas para o mundo não são as mais otimistas. E tenho pra mim que a explicação de tudo isso está no campo das conspirações e da ufologia. Sim, da ufologia e da espiritualidade.

    David Icke, Alex Collier, Peggy Kane, Barbara Marciniak, esses é que sabem o que ocorre nos bastidores.

    Devemos todos nos preparar, pois a tendência é tudo piorar.

    saudações de Brasília, a capital mundial da corrupção e da roubalheira

    Eduardo

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