Uma boa notícia para todos os Leitores que gostam de mar e sol e que moram a poucos milhares de quilómetros do Japão:desde o passado dia 16 de Julho a praia de Nakoso foi reaberta, vale a pena aproveitar.
Situada a 65 km da central de Fukushima, segundo os especialistas apresentas níveis de radioactividade abaixo dos limites: no máximo o bronzeado pode ficar verde fluorescente e não acastanhado, mas este são pormenores que podem ser esquecidos facilmente enquanto nadarmos com toda a força para fugir duma nova alga-vampiro.
A coisa curiosa é que as outras 16 praias da zona permanecem interditas. Permanecem e permanecerão, tal como afirmado pelas autoridades. Nakoso não.
Evidentemente goza dum micro-clima particular, com ventos alísios que limpam suavemente a areia da radiação e correntes oceânicas que tornam cristalinas as águas contaminadas.
Ou isso ou é um teste.
Entretanto, no final de Junho, 150mil pessoas protestaram em Toqio contra a intenção do governo de reabrir as centrais nucleares: uma petição com mais de 8 milhões de assinaturas pede o abandono definitivo do nuclear.
O primeiro ministro Yoshihiko Noda já fez saber que abandonar o nuclear significaria um abrandamento da economia, mais faltas de energia eléctrica em algumas zonas do País, em particular no Verão.
Por isso foi acordada a reactivação dos reactores 3 e 4 da central de Ōi, da Kansai Electric Power Company.
Pode parecer um absurdo: um País que enfrentou um desastre nuclear , um ano depois decide reactivar os próprios reactores. Mas absurdo não é.
O Japão é uma potência económica de nível mundial e para manter esta condição precisa de energia: neste aspecto o Japão é azarado, pois carece de recursos naturais. O nuclear, portanto, é uma estrada “óbvia”.
Muitos entre os Leitores ficarão de cabelos em pé, mas gostaria de esclarecer um ponto: eu não sou a favor da energia nuclear. O discurso é diferente.
Abrimos uma breve parêntese.
Imagine o Leitor ser o chefe dum País com 128 milhões de habitantes, um País, como afirmado, potência económica mundial; esta condição permitiu um padrão de vida bastante elevado e a sociedade japonesa não tem grandes razões de queixas neste sentido.
Como boa parte do bem estar provém da exploração da energia nuclear, começada em 1954 com 230 milhões de Yen, o Japão hoje pode contar com 54 reactores nucleares, que em conjunto fornecem vários GigaWatts, mais de 25 % de toda a energia consumida no Japão. Em comparação, a energia nuclear produzida num País como o Brasil nem atinge 3% das necessidades nacionais.
Os Verdes Até Morte podem afirmar que travar a energia nuclear no Japão seria uma grande sucesso de toda a Humanidade. Mas os números dizem o contrário: desde o terremoto do 11 de Março de 2011 as importações de outras energias aumentaram, nomeadamente do petróleo. Por isso: diminui a energia nuclear mas aumenta a exploração de outras energias não renováveis, com os problemas relacionados (guerras, poluição, desastres ecológicos, etc.).
Ao mesmo tempo, converter todo o sector nuclear em energia “limpa” implicaria um esforço económico de proporções enormes e com taxa de sucesso duvidosas (não há sol? Não há energia. Não há vento? Não há energia…).
Mais uma vez, estamos perante um problema que requer uma solução de fundo e que não pode ser limitada ao Japão (País que dos ponto de vista ecológico não é nada mal: 70% do território é ocupado por florestas, 2º País no mundo após a Finlândia neste aspecto). É inútil ter ilusões, pois até quando a ideia do “crescimento eterno” não for apagada, haverá sempre a exploração duma fonte energética poluente, seja esta o nuclear, o petróleo, o gás, o carvão ou outra ainda.
Fechamos a parêntese?
E fechamos, que depois todas estas parênteses abertas fazem corrente.
Vamos pôr de lado os problemas energéticos e retomamos o discurso de Fukushima, pois esta é uma boa altura para pôr o ponto final nesta página negra da história.
Breve resumo para quem perdeu os episódios anteriores.
No dia 11 de Março de 2011, o Japão foi abalado por um terremoto de escala Richter de nono grau. Uma hora depois do terremoto, a costa japonesa foi atingida por ondas de tsunami com até vinte metros de altura.
Na altura da desgraça, estavam operativas 11 centrais nucleares que foram automaticamente desligadas devido aos sistemas de segurança anti-sísmicos. Uma das centrais, todavia, a planta Fukushima Daiichi, começou a ter problemas após a passagem da onda, o que deixou sem eletricidade e com os geradores de emergência incapazes de garantir o adequado arrefecimento dos reactores.
Com o tempo, a situação piorou, até incluir explosões de hidrogénio, a evacuação de várias pessoas dentro de vinte milhas ao redor da planta e o medo da contaminação do meio ambiente, por causa da descarga de água contaminada no mar e por causa das explosões que libertaram elementos radioactivos para a atmosfera.
Até aqui o resumo. Agora vamos ver as conclusões.
Em primeiro lugar. nada de Haarp, nada de conspirações mundiais, nada de bombas israelitas, nada de ataques alienígenas: no passado dia 5 de Julho, a NAIIC (comissão independente acerca do desastre de Fukushima) apresentou no parlamento de Tóquio o próprio relatório. E as conclusões são extremamente claras:
Apesar de ter sido desencadeado por eventos catastróficos, o incidente em Fukushima Daiichi não pode ser considerado um desastre natural. Foi decididamente um desastre criado pelo homem, que poderia e deveria ser antecipado e evitado.
Uma afirmação pesada, sem dúvida. Quais as razões?
O relatório individua uma série de erros, os seguintes:
Primeiro erro: avaliação
A TEPCO (empresa que gere a usina de Fukushima) logo assumiu que o dano tinha sido causado pela onda (o tsunami) que arrasou o centro. Mas não foi isso que se passou. Mais provável foi o tsunami ter danificado os instrumentos que tinham de pôr em segurança a central. Difícil provar isso, pois os instrumentos ficaram fechados no interior dos reactores e, portanto, serão inacessível por anos e anos. Mas parece estabelecido que já o choque do terremoto (antes do tsunami) foi suficiente para provocar uma perda de refigerante líquido no interior do reactor nº 1.
Segundo erro: organizacional
Os técnicos da central não tinham sido treinados para lidar com emergências graves. Por exemplo, não actuaram com a devida rapidez para restaurar o Isolation Condenser (IC) da Unidade 1. Dois reactores estavam fora de serviço, a electricidade falhou nos outros quatro ao mesmo tempo e isso não ajudou, de certeza. No entanto, os engenheiros não estavam preparados e, incrivelmente, faltava o manual de instruções para lidar com esta eventualidade.
Terceiro erro: a confusão de papéis
A resposta perante a emergência também sofreu com outras deficiências. A cadeia de comando (com os responsáveis da Tepco que deveriam ter tomado conta da situação) saltou. Na verdade, na excitação daquele dia, foi o Gabinete de Crise do governo que assumiu a gestão das operações, porque não confiava na Tepco. Além disso, a emergência não foi declarada imediatamente. Um pouco como Bush (o filho, o tonto) que fica a ler contos de fadas enquanto as Torres Gémeas colapsam.
Em Fukushima ninguém ficou a ler histórias para crianças, mas a Comissão é clara: a gestão das crises não podem ser deixadas nas mãos do primeiro-ministro, não é este o papel dele.
Quarto erro: a evacuação
A evacuação foi muito lenta e muito confusa. Improvisação, falta de clareza nos papéis, falta de treino. O governo tem sido lento em alertar acerca da gravidade do incidente, os municípios vizinhos ficaram sem notícias certas ao longo de demasiado tempo. Quando a evacuação foi ordenada (por todos aqueles que viviam dentro de 3 km da central) apenas 20% da população sabia do incidente. A maioria dos residentes dentro de 10 km souberam do acidente apenas no dia seguinte, quando foi dado uma nova ordem de evacuação. Pior: muitos moradores foram evacuados para áreas mais radioactivas dos locais de origem e lá deixados a si mesmos durante semanas.
Quinto erro: o pós-acidente
15 mil pessoas foram evacuadas, 167 trabalhadores foram expostos a uma dose de radiação de pelo menos 100 millisievert, enquanto uma área de 1.800 km2 na Prefeitura de Fukushima (equivalente à extensão da Roma) recebeu uma dose de pelo menos 5 millisievert/ano (o limite recomendado é de 1 millisievert/ano). Nas zonas para onde foi possível voltar (nem todas, pois há zonas ainda fortemente contaminadas onde será preciso esperar décadas) não foi preparado um adequado sistema sanitário ou de suporte (inclusive psicológico). Também confusa é a comunicação de risco: até hoje, mais de um ano após o acidente, as pessoas não conhecem ao certo o nível aceitável de dose de radiação para o qual é possível ficar exposto. Um assunto delicado, em particular no caso de crianças, idosos ou mulheres grávidas.
Sexto erro: a mentalidade
Na opinião da comissão parlamentar, as normas de prevenção e de segurança do sistema nuclear não são actualizadas. Por exemplo, não levam em conta a experiência e as regras resultantes de novos acontecimentos, como aquele decorrente da queda das Torres Gémeas em 11 de Setembro de 2001. Culpada neste caso seria a “atitude insular dos legisladores japoneses que ignoram as normas de segurança internacionais”. Depois é preciso acrescentar a falta de transparência e os relacionamentos equívocos entre os reguladores e os produtores de energia. Na prática, todo o conjunto de regras, regulamentos e leis sobre a segurança nuclear são mais voltados para a promoção da energia nuclear e não para a protecção da saúde pública.
Por enquanto o relatório completo não está disponível: apenas um resumo. Falatm, portanto, avaliações mais profundas de nível ambiental e o impacto sobre a saúde pública (física e mental).
Finalmente há também o problema da descontaminação das áreas afectadas e a gestão dos resíduos (presentes e futuros): os milhares de toneladas de solo radioactivo.
Ipse dixit.
Fontes: NAIIC (ficheiro Pdf, em inglês), Megachip, AltroGiornale, Wikipedia (versão inglesa e italiana)