Ajudar um idoso

Ontem fiquei muito sensibilizado com a história dum idoso português e estou a pensar acerca da possibilidade de lançar uma iniciativa, possivelmente uma recolha de fundos ou de roupa.

Mas eis os pormenores.

Aníbal António Cavaco Silva nasce em Boliqueime, uma desolada aldeia algarvia, no longínquo 1939.

Filho de Teodoro Gonçalves da Silva e de Maria do Nascimento Cavaco, aí cresce enquanto o pai tenta vender frutos secos e combustíveis: por isso o aquecimento nunca falta, mas o jantar é sempre cascas de nozes grelhadas.

O jovem Aníbal decide abandonar o anonimado da pequena aldeia e frequenta a Escola Técnica Elementar em Faro, localidade que dista uns trinta quilómetros e que o pobre Aníbal possivelmente alcança após marcha forçada diária.

Caminha hoje, caminha amanhã, o pobre Aníbal um dia repara ter chegado até Lisboa e para não desperdiçar a sola dos sapatos (feitas de casca de noz cozida), decide frequentar outro instituto, o Curso de Contabilidade do Instituto Comercial de Lisboa; e em 1963 casa com Maria Alves da Silva, uma pobre estudante de filologia germânica.

Sucessivamente o jovem Aníbal cumpre o serviço militar obrigatório e é enviado para Moçambique. Voltado de África, o pobre Aníbal consegue encontrar alguns trabalhos na capital, mas são todos empregos de escasso valor e mal remunerados: investigador da Fundação Gulbenkian, director do Departamento de Estatística e Estudos Económicos do Banco de Portugal, vogal da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, docente na Universidade Católica Portuguesa.

Mas o dinheiro continua a faltar: apesar do trabalho, o casal Cavaco Silva vive numa condição próxima da indigência e Aníbal, desesperado, decide tentar a sorte entrando no pérfido mundo da política. Ministro das Finanças, deputado, presidente da Assembleia Distrital de Lisboa pelo Partido Social Democrata, líder do partido em 1985, finalmente Aníbal chega a ser nomeado Primeiro Ministro e o casal parece ter assim encontrado um mínimo de estabilidade económica.


Mas é uma Primavera de curta duração: após dez anos ao longo dos quais o País consegue aumentar a dívida pública como nunca tinha acontecido antes (e depois, diga-se), perante a contestação social (“deixem-me trabalhar!” é uma das frases do pobre Aníbal tornadas famosas) e os chumbos do Tribunal de Contas, a família Cavaco Silva precipita nas trevas do desemprego. Voltam as cascas de noz grelhadas.

Aníbal não se rende: decide concorrer para o lugar de Presidente da República. E os Portugueses, comovidos perante esta figura de algarvio azarado mas que mesmo assim nunca dispensa do seu bom humor que enerva os outros, decidem premia-lo com a tão desejada eleição.

Mas também neste caso os sonhos são de curta duração: o cargo promete muito mas concede pouco. Feitas as contas, o casal Cavaco Silva soma as reformas do pobre Aníbal e aquela da pobre consorte Maria: pouco, muito pouco. E nessa altura Aníbal decide que o limite já foi ultrapassado.

“Devo receber 1.300 por mês, não sei se ouviu bem 1.300 euros”, diz Cavaco aludindo a uma das suas pensões, aquela da Caixa Geral de Depósitos. Temos que admitir: 1.300 Euros por mês são uma vergonha, mesmo considerando que muitos Portugueses nem chegam a ganhar isso.

Além disso, tem direito à pensão do Banco de Portugal e no total o pobre Cavaco recebe uns misérrimos 10.000 Euros mensais em reformas, mais 2.900 Euros em despesas de representação. Sim, verdade, depois há também a reforma da pobre Maria (docente universitária: uns trocos, de certeza), e é verdade também que enquanto Presidente da República desfruta da hospitalidade do Palácio Presidencial e das pequenas vantagens do cargo, mas “Tudo somado não dá para pagar as despesas” afirma o coitado. E como não concordar?

12.900 Euros mensais? Sejamos honestos: o que fazer com 12.900 Euros por mês? Pior: as despesas de representação duram até o cargo durar, mas a seguir? Aníbal tem todo o direito de pensar no futuro da sua família e a verdade é que uma vez acabado o papel de Presidente da República terá que sobreviver com 10.000 Euros mensais.

Aníbal declarou no ano de 2009 reformas por um total de 140.000 Euros.
Muito? Parece, mas façam as contas: é o preço de três BMW Serie 5 (gasóleo, claro, porque o Presidente é pessoa poupada), mas depois sobrariam apenas alguns cêntimos para sobreviver ao longo do ano. E além disso, que faria o Presidente com três BMW Série 5? Ficaria com três carros topo de gama e nada para comer: aí está, uma situação insustentável para quem trabalhou uma vida inteira.

Praticamente um morto de fome, num autêntico beco sem saída.
Confirma o pobre Aníbal: 

Tudo somado, o que irei receber do fundo de pensões do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Aposentações quase de certeza que não vai chegar para pagar as minhas despesas porque como sabe eu também não recebo vencimento como Presidente da República. […] Felizmente, durante estes anos, eu e a minha mulher fomos muito poupados.

Uma clara situação de indigência.
Já tinha ouvido dizer que a família do pobre Aníbal costumava tomar só uma refeição por dia (até que foi obrigada a pedir uma ajudinha ao banco para tornar rentáveis os poucos trocos ganhos), mas não imaginava isso. Embora reconheça que a magreza dos dois deveria ter despertado algumas suspeitas.

Por isso, eis a minha ideia: lançar uma campanha, não limitada ao só Portugal, para a recolha de roupa usada. Nome: “Ajude um idoso”.
É simples: cada um poderia procurar no próprio guarda-roupa, com certeza haverá algo que já há muito não utilizamos, eis a ocasião. Embrulha-se a peça e envia-se tudo ao seguinte endereço: Palácio de Belém, Departamento Famílias Carenciadas, Bairro dos Desfavorecidos, Lisboa (Portugal, óbvio).

Disse uma peça, mas com certeza géneros alimentares seriam apreciados também ou até jogos que as nossas crianças já não usam (o pobre Aníbal tem netos).

Basta pouco para melhorar a qualidade de vida dum casal em dificuldade, um sorriso e um cachecol podem fazer resplender o sol até nas casas dos mais infelizes, nem que seja por breves instantes. É a solidariedade que aquece os nossos corações, e um simples gesto pode originar uma mizade duma vida, quem sabe?

Diga “Não” ao egoísmo e a marginação: ajude o Presidente da República de Portugal.

Nota:

Nas imagens, uma louvável iniciativa da empresa Cão Azul
Sabemos que os tempos estão difíceis para todos, mas é nestas alturas que temos que ser solidários com aqueles que mais precisam. Ao comprares esta t-shirt estás a ajudar o nosso presidente a pagar todas as suas despesas. Por cada t-shirt vendida o Cão Azul dá 1 euro para ajudar o nosso presidente.
Se por algum motivo não conseguirmos o NIB do presidente aceitamos as vossas sugestões para doarmos o dinheiro das t-shirts que vendermos.

Cada peça só 12 Euros, disponível em várias cores e tamanhos. Aproveitem!

Ipse dixit.

Fontes: Público, Diário de Notícias, Cão Azul

5 Replies to “Ajudar um idoso”

  1. Eu tenho por aqui uma nozes… mas acho que o bacano ao longo dos anos foi enjoando as mesmas… Ele agora é mais Bolos-Reis… desde a altura da miséria das nozes, quando viu que ser Presidente era a solução teve que evoluir e trocas as nozes por bolo-rei

    Mas comer muitos bolos-reis também trás efeitos secundários

    A malta que vive aí em Lisboa é que pode levar um saco dos Amigos do Continente ou do Banco Alimentar contra a fome e ir entregar pessoalmente ao Palácio… entreguem ao Guarda que está à porta (esperemos é que o Guarda não desvie a oferta… pois também andam a ser muito mal pagos! E comida é comida!)

  2. Olha aí pessoal: uma sugestão que impede que os políticos brasileiros morram de fome: qualquer deputado, qualquer senador,qualquer presidente da república, após o seu mandato, garante aposentadoria (reforma) vitalícia correspondente aos valores da ativa. Façam uma campanha urgente para tornar lei em Portugal esta medida filantrópica imprescindível! Abraços

  3. A notícia não deixa de ser pertinente e indignante o timming é que cheira a esturro… Veio inundar os noticiários imediatamente após o anúncio da alteração da lei laboral. A esta altura do campionato já pouca gente se lembra do pacote de 150 h (que aliás também foi falado aqui).
    De qualquer maneira… o presidente nem revela grande actividade cerebral… Afinal de contas é político, não haveria maneira mais inteligente de dar a volta à questão em vez de dizer "Ganho 10.000€/mês e nem isso me chega!".

Obrigado por participar na discussão!

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