A força das palavras e o lucro do FMI

Ajuda ou empréstimo?
Não é a mesma coisa.

Um exemplo:
O leitor quer comprar uma sandes mas não tem dinheiro. Contacta Informação Incorrecta que, sem um tostão, organiza uma recolha de fundos.
Ao fim de 12 anos, o blog consegue recolher 2,50 Euros que o leitor poderia ter utilizado para comer algo se entretanto não tivesse morrido de fome.

Ok, vamos com um outro exemplo, é melhor.

Primeira hipótese:
X não tem dinheiro para acabar a própria casa, então surge Y que diz: “Querido X, fica descansado, eis 1.000 Euros para acabar as obras. Depois, quando puderes, vai devolver-me o dinheiro, está bem?”
X, satisfeito, agradece e, com o tempo, devolve os 1.000 Euros.

Esta é uma ajuda.

Segunda hipótese:
X não tem dinheiro para acabar a própria casa, então surge Y que diz: “Querido X, fica descansado, eis 1.000 Euros para acabar as obras. Depois vai devolver-me o dinheiro, com uma taxa de juro de 5%, está bem?”
X, satisfeito mas nem tanto, agradece e mensalmente devolve os 1.000 Euros com prestações e juros.

Esta não é uma ajuda, é um negócio. 

Agora uma notícia:

FMI prevê resultados de 524,8 milhões de dólares este ano

O FMI teve lucros em quatro dos últimos seis anos fiscais -entre 2005 e 2010 – e já reviu em alta de 63 por cento as previsões de resultados operacionais para este ano, graças aos empréstimos aos países europeus em dificuldades.

Para o ano fiscal de 2011, que termina em 30 de Abril, o Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê resultados operacionais líquidos de 328 milhões de direitos especiais de saque (SDR, na sigla inglesa), os activos financeiros do fundo, com uma valor baseado num cabaz de divisas composto pelo dólar americano, o euro, a libra esterlina e o iene.
As previsões de 328 milhões de SDR (524,8 milhões de dólares, ao câmbio de hoje) comparam com projecções iniciais de 202 milhões de SDR, feitas em Abril de 2010, e reflectem os reflexos positivos – para as contas do fundo – dos empréstimos à Grécia e à Irlanda, sem contar ainda com o empréstimo a Portugal, cujo valor ainda não foi fixado.
Os novos empréstimos, aprovados depois de Abril de 2010, incluindo os 30 mil milhões de euros à Grécia e os 22,5 mil milhões à Irlanda, “fizeram aumentar as previsões de resultados de crédito em cerca de 102 milhões de SDR [163,2 milhões de dólares], incluindo 74 milhões de SDR em taxas de serviço e 28 milhões nas margens da taxa de juro cobrada“, refere um recente relatório financeiro do FMI.
Os empréstimos à Irlanda e à Grécia, no seguimento da crise da dívida soberana, que atingiu as economias periféricas da zona euro, são dos maiores na história do fundo. A Grécia paga ao FMI cerca de 3,3 por cento pelo empréstimo e a Irlanda entre três e quatro por cento, segundo o prazo dos empréstimos. Para 2011, o FMI prevê gastar menos 34 milhões de SDR que o previsto, sobretudo com poupanças em despesas de pessoal. 

Lucros? Mais de 500 milhões de Dólares? 3 e 4 % de Juro?

Como “ajuda” é bastante esquisita. Talvez seria melhor parar duma vez por todas de utilizar o termo: esta não é ajuda nenhuma, este é um empréstimo, pago com taxas de juros ao longo dos próximos anos.
Um negócio.

Mas a palavra “ajuda” não é utilizada por acaso, tem um sentido.
Podemos recusar um empréstimo? Sim, podemos.
Podemos recusar uma “ajuda”, sobretudo se o País estar em dificuldade? Não, claro que não podemos.
Eis a força das palavras.

A “ajuda” é um favor, uma espécie de colete salva-vida que alguém, com coração de manteiga, atira na altura da necessidade.

E perante tamanha bondade, como levantar objecções? Como, por exemplo, avançar com condições? É uma ajuda, um presente do céu, não podemos avançar com condições, temos que aceitar e ficar em silêncio. Não podemos passar por ingratos, pois não?

E se o coração de manteiga impor medidas pesadas, como o corte dos ordenados, o corte dos serviços?
Meus amigos, é uma ajuda, não podemos questionar.

Curioso. O Fundo Monetário Internacional é formado por banqueiros, na maioria dos casos dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Alemanha.
São as mesmas pessoas que levaram os juros dos Países em crise até níveis insustentáveis.

Claro, alguém pode objectar que assim não é, quem causou isso forma os “investidores”, estes indivíduos misteriosos que, de repente e todos juntos, decidem de atacar um País.
Mas como somos maiores e vacinados, vamos falar duma forma clara: os banqueiros do FMI antes levam as economias até o colapso, depois intervêm com a “ajuda”.

Esta “ajuda”, além do dinheiro (e dos lucros do FMI, como visto), de facto torna o País “ajudado” numa espécie de protectorado, uma nova colónia. Pois, como afirmamos várias vezes: quanto vale um País sem autonomia financeira?

Mas nós há escolha, dizem, não há outras hipóteses. Por isso podemos só obedecer e dizer: Obrigado.
Pois afinal é uma ajuda.

Ipse dixit.

Fonte: Diário de Notícias

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