Fukushima mon amour

Como estão as coisas no Japão?

Difícil responder.

A versão oficial do governo deixa muitas dúvidas. Esquisito, certas coisas não aconteciam apenas na URSS? Até os Estados Unidos parecem ter abandonado o executivo de Tokio e agora avançam com dúvidas e acusações.

Breve resumo? Boa, vamos com o breve resumo.

Privada

A central nuclear de Fukushima é privada. Privada? Pois é, pertence à Tokio Electric Power (Tepco), uma das principais empresas do sector a nível mundial, avaliada em mais de  67.000.000.000 Euros.

Difícil confiar num logo assim…

A Tepco tem (ou melhor, tinha) uma capacidade de produção de mais de 64,487 GW (Giga-Watts), a maior parte da qual produzida em centrais termoeléctricas (38,189 GW), mais 17,308 GW das centrais nucleares e uns miseráveis 4 MW de energias renováveis.

Em 2009 vendeu mais de 280 GW-hora de eletricidade.

A empresa japonesa atravessa ora uma fase de grande dificuldade, mas não é a primeira vez: em Julho de 2007, um terramoto de magnitude 6,8 Richter atingiu o Japão e a central nuclear de Kashiwazaki Kariwa, a maior do mundo, ficou danificada. Houve um incêndio e mais de 1.000 litros de água radioactiva foram deitadas no mar.
Inevitável o inquérito e a surpreendente conclusão: a maior central nuclear do mundo tinha sido construida acima duma falha tectónica. Não só: mas a central estava pronta para sismos de magnitude inferior ao do terramoto. A metade, para ser preciso.

A Tepco justificou alegando que na altura da construção era desconhecida a existência da falha. Mas as dúvidas ficaram: apenas 5 anos antes, a administração tinha sido apanhada enquanto falsificava os relatórios de segurança, prática utilizada ao longo de 15 anos.

Desculpas

Voltamos ao presente.

Agora a Tepco pede desculpa. O vice-presidente, Norio Tsuzumi, pediu desculpas durante uma visita a um ginásio em Tamura:

Lamentamos ter-vos causado tanto sofrimento,[…] Peço as mais sinceras desculpas. A nossa empresa causou ansiedade e danos aos habitantes em redor da central, da província de Fukushima e de todo o País

A razão da desculpa? A Tepco tinha subestimado a potência dum eventual terramoto. Outras vez? Outra vez.
Esquisito, esta empresa privada parece ter uma tendência para poupar nas medidas de segurança. Porquê será?

O problema é que as desculpam não reduzem os riscos. Segundo a Associated Press, na central de Fukushima existem 4277 toneladas de material radioactivo: 3400 toneladas de material já utilizado e 877 nos reactores. 
4277 toneladas, nada mal…

E quanto plutónio? Mistério.

Pena, seria interessante conhecer a quantidade exacta, sobretudo ao considerar que apenas um gramo pode causar a morte dum milhão de pessoas (Prof. Vincenzo Balzani, químico da Universidade de Bolonha, Italia)

Mas qual a situação agora mesmo?
Ontem foram registados novos tremores de terra: 6,3 Richter no mar em frente de Fukushima. E sempre no mar, a Tepco (sempre ela) afirma ter encontrado água com uma radioactividade 29,8 vezes superior ao normal.
O tanque de armazenamento do combustível do reactor n º 2  está perto de ebulição. As altas temperaturas podem ser a causa do vapor que sai do mesmo reactor desde segunda-feira. Se a água no tanque começar a ferver e o nível ficar abaixo do limite, as barras de combustível poderiam emergir e aumentar o nível de radioactividade.

Tic tic tic…

Radioactividade que mesmo assim já está presente.
O seguinte vídeo é da CNN, enviado por um freelancer que, armado de contador Geiger, relevou o nível das radiações numa localidade 60 quilómetros Oeste de Fukushima.

“Tic tic tic” diz o simpático aparelho.

Entretanto a nuvem radioactiva gerada nos dias anteriores está em marcha. Ao que parece, as correntes estão a empurra-la na direcção do Oceano Pacífico. No fim do qual encontramos os Estados Unidos.

Será por isso que nos EUA estão a vender comprimidos de iodo? Os especialistas convidam à calma: não há hipótese da nuvem chegar aqui, palavra de Jacqueline Williams, da Universidade de Rochester:

São próximas do zero as possibilidades que qualquer iodo radioactivo possa chegar até a costa dos EUA. Na altura em que a radioactividade atingir a costa Oeste dos Estados Unidos, será tão diluída que não vai preciso iodo  

Até que enfim, uma boa notícia. Mas há outra: a Bolsa de Tokio fechou com um positivo + 4,36%.
Imaginem a satisfação dos sobreviventes…

Ipse dixit.

Fontes: Il Sole 24 Ore, Forbes, Crisis, Público, PRC68, USA Today

8 Replies to “Fukushima mon amour”

  1. Os EUA conduziram centenas se não milhares de testes a bombas atómicas em pleno solo americano e no Oceano pacifico. Não acho que haja grande perigo na costa Oeste dos EUA. Só o tempo o dirá.

  2. Uma ilha que faz parte do cinturão de fogo, ring of fire com direito a terremotos e tsunamis ocasionais, 52 ou mais reactores em atividade… agora são 6 a menos, claro. ALGUÉM ME EXPLICA POR QUE OS JAPONESES NEGLIGENCIARAM AS NORMAS DE SEGURANÇA???????? era algum teste de resistencia orgânica? Se têm inteligência para cosntruir, por que não têm para preservar a Natureza? Agora toda aquela sucata vai esterilizar o território deles… depois o território dos países vizinhos. E a coisa ainda não se encerrou!

  3. O Fábio comentou que a radiação q chegar aos EUA não será problema, concordo! mas já chegou traços de radiação constatados na Califórnia pelos artigos que pude ler a respeito. Minha preocupação é com todo o resto, Taiwan, China, Kamchatka, Alasca e as ilhas do Pacífico abaixo do Japão! Os paraísos de férias vão ficar contaminados… É melhor repensar quem esteja pensando em viajar para a Polinésia, por exemplo. para onde está indo a água usada para conter o calor dos reactores? saindo do mar e voltando ao mar? toda vaporizada e se espalhando pelo ar? haverá chuva radiativa por quanto tempo depois de tudo isso?…

  4. Sim, a água contaminada é capaz de causar a morte de uma grande quantidade de fauna marinha e por consequência causar distúrbios na cadeira alimentar naquela região. Para não falar que grande parte da fonte de rendimento para grande parte dos japoneses é a pesca.

    Já há alguns anos que me questiono se, o dinheiro que custa criar uma central nuclear, mais o dinheiro que custa a sua manutenção, mais o dinheiro para fazer o tratamento dos resíduos nucleares, não seria suficiente para por todas as casas (que uma central nuclear abastece) com energias renováveis (eólica + solar) de forma a que estas ficassem auto suficientes.

  5. Olá Xenofonte!
    ZeroHedge? Óptimo blog, que consulto com muita frequência. Para quem percebe o idioma de Shakespeare, aconselho sem dúvidas.

    Abraço!

  6. Olá Fábio Daniel!

    Sim, acho que a nuvem radioactiva, quando atingir os EUA, já estará bastante enfraquecida e não irá criar problemas.

    Quanto aos custos: difícil um orçamento, pois algumas variáveis ao desconhecidas. Os custos dum fecho duma central nuclear são altíssimos, superiores aos de construção e manutenção.

    Mas além disso, há outro tipo de custos: onde pôr os resíduos? É preciso um lugar "seguro", do ponto de vista sísmico por exemplo, e seguro ao longo de centenas ou até milhares de anos. E não há. Não sou eu que afirmo isso, mas uma pesquisa oficial já com alguns anos de idade.

    Agora, imaginemos que o lugar onde são armazenados os resíduos seja atingido por um terramoto: fuga de radiações, contaminação do ar, da água… tudo isso tem custos, que vão a aumentar a factura, já pesada, da central desmantelada.

    Abraço!

  7. Olá GI!

    O problema das normas de segurança é bastante simples: a central estava nas mãos dos privados. E isso explica tudo.

    Quanto ao resto: o problema é que o Japão, tal como todos os Países do Mundo, é condenado a crescer, sempre, constantemente. E crescimento significa energia, muita e cada vez mais. Até um País que entrou numa fase complicada do ponto de vista económico, como o Japão, não pode parar. E tem que assumir riscos cada vez mais elevados.

    O que aconteceu no Japão já tinha acontecido em Chernobyl (1986) e antes nos EUA (Three Miles Island, 1979), que nem são zonas sísmicas.

    E reparem: cada vez o acidente é mais grave. Isso significará alguma coisa, ou não?

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