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Uma taxa de juro de 10% é um crueldade.
E uma taxa de 24%?
Pode ser um homicídio?
Pode.

Devinder Sharma é indiano: é jornalista e escritor. E segue os problemas do próprio País.
Na Índia há pobreza: o milagre e económico nasceu há pouco, ultrapassou a fase embrionária mas o caminho é ainda comprido. E, ao lado das empresas que actuam nos mercados internacionais, há um nível de pobreza aterrador.

Enquanto o bengalês Mauhmmad Yunus, Prémio Nobel da Paz e inventor o sistema do micro-credito, enfrenta graves acusações de desvio de fundos, as empresas indianas de micro-credito são culpadas de levar os pobres até o desespero e o suicídio.

Eis o relato de Devinder.

Eu também tenho um sonho. 
E eu sei que podemos juntos mudar esse esquema. 
Uma longa viagem começa sempre com o primeiro passo. 
Venha, junte-se a mim.
Devinder Sharma

 

Devinder Sharma

No dia 9 de Novembro passado, a Corte Suprema de Allahabad definiu a taxa de interesse de 10% pedido pelo Estado Indiano aos agricultores em atraso nos pagamentos no estado indiano de Uttar Pradesh como uma “crueldade” e fez a comparação com uma pessoa moribunda que é fisicamente batida.

Esta notícia chega depois da nota SKS Microfinance [a maior instituição de microfinanças na Índia, NDT] ter baixado a sua taxa de juros de 24,55 para 24%. Esta é a segunda vez durante o mês que, após um grande escândalo, a SKS reduziu a própria taxa de juro oficial.

Pergunta: como pode o interesse de 10% cobrado ao camponês ser uma “crueldade” e o 24% cobrados à sua esposa, em nome da microfinança ir sob a categoria de ajuda humanitária?

É bastante óbvio que a microfinança explora os pobres e sugar cada gota do sangue deles. E Vijay Mahajan, administrador Delegado da grande empresa de empréstimo Basix, tem até a coragem de afirmar que “é preciso um estudo acerca dos suicídios feito por parte de cientistas sociais independentes.  Caso fosse verificado os suicídios são devido às actividades das MFI [as MFI, Micro Finance Institution, são as instituições de microfinança, e não têm nada a ver com o FMI, sempre abutres mas de outra raça, NDT], iremos compensar as famílias e os funcionários que cometeram erros serão punidos.”

Porque somente os funcionários que cometeram erros? Por que não o Sr. Vijay Mahajan?

Tudo isso lembra também o que os apáticos funcionários do governo invariavelmente dizem quando chegam as notícias acerca dos mortos por causa da fome. Toda as vez eles negam a notícia dizendo que essas mortes não são devidas à fome, mas é alguma doença crónica. Vijay Mahajan não é diferente.

Business Standard (10 de Novembro de 2010) cita K. Venkatanarayana da Universidade Kakatiya, que estudou o sector das MFI em Andhra Pradesh. Diz que quem beneficiou dum empréstimo são obrigados ao suicídio. “Durante as sessões de formação, as MFI dizem que a devolução do empréstimo não será cobrada se a pessoa que beneficiou morrer. Tudo isso poderia ter agido duma forma negativa “, explica..

As MFI são projectadas para matar. Além do mais, os assassinos ficam livre. Porque o governo de Andhra Pradesh não está a preencher os FIR [os FIR, First Information Report, são os documentos que a polícia indiana preenche ao receber informações acerca dum suposto crime. Com base nos FIR começa a investigação, NDT] contra eles? Basta olhar para os quatro casos estudados abaixo.

Porque essas viúvas não deveriam ter justiça? Porque as MFI responsáveis pelas mortes dos seus entes queridos não devem ser responsabilizadas com a acusação de homicídio?

Entretanto, aqui está o relatório de Business Standard:

Os suicídios de Andhra Pradesh 
levantam questões sobre o modelo MFI

A proibição de vários empréstimos ao mesmo tempo, maior transparência e cortes nas taxas de juros. Só isso pode salvar o sector, dizem os activistas.
[…]

Um silêncio ensurdecedor está presente em Venkatadripet, perto da estação Ghanpur.

Nos últimos dois meses, vários moradores desta pequena vila colidiram com a alegada coação das MFI por atrasos nos pagamentos.

O único recurso: entregar as próprias vidas.

Com o crescente número de mortes, o governo finalmente teve de intervir. Mas as histórias de partir o coração dos familiares das vítimas ainda permanecem no ar. O distrito de Warangal é o mais duramente atingido, com 17 suicídios relatados. As fontes falam de 57 casos problemáticos, incluindo suicídios, em Andra Pradesh.

R Subrahmanyam, secretário do desenvolvimento rural de Andhra Pradesh, fala em termos inequívocos: disse que as MFI estão a embolsar lucros elevados à custa dos pobres. “As MFI também estão a conceder vários empréstimos múltiplos sem ter os devidos cuidados”

As MFI cobram taxas de juros que variam entre 26 e 32%. “Exorbitantes”, diz Venkatanarayana. “As MFI desviaram do caminho de ajudar os pobres. Simplesmente empurraram os pobres numa armadilha de dívidas, feita de vários empréstimos e empréstimos que estão além da capacidade dos beneficiários. Há várias MFI que operam na mesma área. O modelo é baseado no lucro puro ”

Contudo, as MFI rejeitam as acusações de agiotagem, afirmando que os juros sobre os empréstimos incluem o custo para encontrar os clientes em áreas remotas, a necessidade de avaliar e seleccionar os que merecem o crédito, o pagamento de dinheiro e a cobrança dos reembolsos ao longo de mais de 50 semana, a administração e a captação de recursos.

“Os bancos não vão bater à nossa porta para oferecer empréstimos. Nós garantimos que o beneficiário não perca um único dia de ganhos “, diz P. Kishore Kumar, Administrador Delegado da Trident Micfrofinance, acrescentando que na taxa de juro está incluída a cobertura do seguro.

Há cerca de cem MFI que operam em Andhra Pradesh, e destas apenas 18 estão legalmente registadas, conclui.

Venkatanarayana culpa os bancos comerciais para a confusão criada pelas MFI. Os bancos não querem investir em situação de pobreza rural. Ajudar os pobres significa investir em mão de obra, infra-estruturas e outras actividades, que não querem fazer.

E os resultados são os seguintes.

Caso 1: Ranjitha

Todos conheciam K. Ramesh. A esposa dele, Ranjitha, obteve um empréstimo de 10,000 rupias de Spandana, uma MFI, para comprar um búfalo. A família pagou 15 prestações semanais de 225 rupees cada. Mas então não conseguiu mais. Fazia parte dum grupo de aldeões que haviam obtidos um empréstimo.

Da primeira vez, os outros membros do grupo conseguiram parar por ela. Mas logo depois insistiram com Ramesh para pagar a dívida. Os funcionários da Spandana também começaram a pressionar. Ranjitha encheu-se com querosene e acabou em chamas.
No dia seguinte, Ramesh enforcou-se. Ranjith foi internada no hospital com queimaduras, mas sobreviveu.

Caso 2: Kausar

Kausar, de 22 anos, moradora em Warangal, está a ceder. Tem um filho de dois anos e um empréstimo de 10.000 rupias. Pagou 25 prestações. Mas, em seguida, o filho ficou vítima dum acidente e o dinheiro foi gasto para os tratamentos. Obteve um empréstimo de outras 12,000 de empresa Swayamkrushi 12,000 e outras 12.000 através dum amigo. Com o aumento das despesas médicas, ela viu-se incapaz de retribuir. Os membros do grupo ameaçavam ao estacionar em frente de casa dela.

Isso levou Akbar, o marido, a fazer o passo extremo: o suicídio.

Caso 3: Aliya

“As MFI não fazem controlos cruzados se um empréstimo é utilizado para uma finalidade específica”, diz Suresh, um amigo de Baskaa Aliya na aldeia de Kadapikonda, perto de Kazipet. Aliya suicidou-se por não conseguir reembolsar uma MFI.

A esposa dele, Hyma, obteve emprestadas 40,000 rúpias das empresas Sharemoolah e Spandana. Suresh pagar 625 rúpias por semana para as 26.000 rúpias que a esposa pediu. Os funcionários mostram os procedimentos extenuantes que os bancos pretendem para autorizar os empréstimos. Isso afasta os pobres. Estes também acreditam que receber um empréstimo dos bancos é uma questão muito difícil para pessoas como Aliya.

Caso 4: Rama

Os vários empréstimos têm arruinado a vida de Rama.
Mownika, a filha adolescente, suicidou-se depois que quem havia emprestado o dinheiro levou a sua máquina de costura. Também o pai sofreu ferimentos na tentativa de apagar as chamas que queimavam o corpo da jovem.

Rama, que vive em Karimabad, obteve cinco empréstimos de cinco MFI diferentes. A família ainda tem que devolver 100.000 rupias, inclusive 50.000 para Pragati. Costumavam pagar 5.300 rupias por mês, mas há três meses começaram os problemas e os atrasos. “Os funcionários disseram para vender a casa para poder reembolsar”.

Rama tinha obtido um empréstimo para expandir o seu negócio. Seu marido dirige um paan shop [uma loja tipo bazar, NDT]. Depois de cair na armadilha da dívida, pediu outros empréstimos para poder pagar os antigos.

Fonte: Ground Reality
Tradução e adaptação: Informação Incorrecta

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