Quantitative quê? Parte I

Quantitative Easing.

Estes termos em Inglês (talvez seja melhor dizer “idioma económico”) mostram um processo implementado pela Fed (Federal Reserve) e BCE (Banco Central Europeu) que não é difícil de entender. 

Como muitas vezes acontece, esses termos podem ter fascínio e sugerir mecanismos complexos (com o fim de afastar os simples curiosos), mas na verdade indicam algo de muito simples. E, do nosso ponto de vista, podem fazer entender quanto difícil seja a situação da economia e também a natureza fraudulenta das duas instituições que aplicam este processo.

Porque falamos disso? Porque já muitas vezes utilizámos o termo “Quantitative Easing” e porque assim será mais simples ter uma ideia do que acontece e do que acontecerá. Enfim, o papel que deveria ser desempenhado pelos órgãos de informação.

O conceito fica muito claro em poucas linhas: a expressão Quantitative Easing indica a aquisição, por parte da Fed ou do BCE, duma grande parte dos ativos tóxicos presentes nos bancos dos Estados Unidos ou da Europa. Uma questão chave é perceber como funciona o mecanismo, porque isso acontece, quais resultados implica e implicará da próxima vez.que será aplicado. Para o sistema todo e para cada cidadão.
O mecanismo é o seguinte: a Fed cria dinheiro e entrega-o aos bancos em troca de títulos tóxicos (isso é, sem valor efectivo), sendo estes últimos avaliados segundo o valor nominal e não real (porque na verdade são lixo): desta forma os bancos podem baixar, de forma sistemática, as perdas, e podem voltar a ter a reserva em dinheiro que, por lei, são obrigados a ter (depósito de reserva fracionária).

Esta solução (solução, por assim dizer …) teve lugar há 18 meses, quando a queda de Lehman Brothers e AIG abriu a tampa da situação real: os bancos, praticamente em todo o mundo, estavam tão cheios de títulos tóxicos (isso é, lixo) que de facto eram insolventes.  
Falidos. Sem poder pagar as próprias dívidas.

Foi o assunto da reunião histórica em que a Fed decidiu criar 1.000 biliões (um trilião!!!) de Dólares e dá-los aos bancos, porque estes são grandes demais para falir (Too Big To Fail).
 

Os resultados

Os resultados que foram alcançados através do Quantitative Easing são de dois tipos, e têm uma terceira consequência.

O primeiro resultado é quase zero: os bancos (e o mundo) ainda estão cheios de ativos tóxicos, nos Estados Unidos fecham com um ritmo de vários por dia, não conseguiram capitalizar e, como segundo resultado, a Fed, para fazer isso, criou do nada (literalmente do nada, por meios electrónicos ou outros) uma quantidade anormal de dinheiro: o que comporta a perda de credibilidade do Dólar (se é criado a partir do nada não vale nada, simples), dos títulos de Estado dos EUA (para além do aumento da dívida de cada cidadão norte-americano) e da estabilidade econômica do mundo (que envolve a todos nós).

Síntese: um desastre. 
Um verdadeiro crime contra a humanidade. E tudo para não “não deixar os bancos falirem”, como teriam merecido.

Para confirmar isso, e aqui está a terceira conseqüência, não aconteceu o que a Fed tinha esperado: os bancos começarem a fazer os bancos e, por isso, facilitar o crédito aos cidadãos para pôr em marcha os investimentos e a economia.
A tão desejada retoma.

Isso não aconteceu e, de facto, não houve hiperinflação: que era esperada, porque literalmente não há dinheiro a circular embora, como acabámos de ver, a Fed imprimiu um rio de dinheiro. Os bancos ainda estão sem dinheiro (são realmente insolventes), ainda têm uma quantia anormal de activos tóxicos nos cofres, de modo que não podem emprestar dinheiro a ninguém.

Em outras palavras, drenaram o que a Fed (e o povo americano) deu e, em troca, não fizeram nada, se não (e que é pior) continuar a fazer aquilo que sempre fizeram e que levou até a crise: usura e especulações a custa dos cidadãos.

Entre outras coisas, e aqui o círculo se fecha, a liquidez fornecida aos bancos por parte do Fed tem sido usada para comprar Títulos do Estado dos EUA O círculo, percebe-se, é vicioso e ilusório: a Fed imprime dinheiro do nada e dá-lo aos bancos para impedir que estes possam falir; e os bancos dão o dinheiro ao Estado (através da compra de Títulos) para que este não possa falir.

Demasiado estúpido para ser verdadeiro. Mas, mesmo assim, verdadeiro.

O dinheiro (digamos assim) voltou até a Fed sob a forma de reservas: os activos tóxicos dos bancos foram considerados pela Fed, como “excesso de reservas” (eheheh!) e a ilusão parecia real.
 

Quantitative Easing 2: o regresso

A coisa é de grande actualidade, porque a Fed, a curto prazo (Novembro), terá de escolher se fazer ou não a mesma operação uma segunda vez. Um Quantitative Easing 2. E desta vez muito mais massivo do que o primeiro. Falamos, para ser exactos, de mais de um trilião de Dólares.

Natural, uma vez que o primeiro passo estava errado desde o começo e não levou, naturalmente, a nenhum resultado concreto (se não evitar o pânico e salvar alguns bancos).

Mas o ponto é: evitar o pânico, ou seja, evitar que os pessoas corressem para retirar aquilo que tinham nas contas e evitar assim a insolvência imediata dos bancos, foi realmente a melhor jogada? Especialmente considerando os danos imediatos e próximos?

Quem vai pagar efectivamente essa quantidade de dinheiro criado do nada para salvar os bancos?

É claro que nem a Fed (o que está prestes a fazer o Quantitative Easing 2), nem os bancos podem explicar a coisa pela qual ele é, isso é, que a primeira está cheia de títulos que são inúteis e que os segundos estão insolventes; caso contrário, seria o caos nos balcões bancários.

Coisa que irá acontecer, ou cedo ou mais tarde: pois é claro que o truque não pode durar para sempre.

Link: Quantitative quê? Parte II

6 Replies to “Quantitative quê? Parte I”

  1. Desvendando o truque, perde-se a graça na mágica! E a crise que nunca se foi, só criou forças para dessa vez, aniquilar com tudo e todos.
    Obrigada por nos ajudar nisso Max!

    Grande abraço

  2. Na minha opinião o desastre económico de 2008 serviu para se realizar a maior transferência de riqueza do povo para as poucas famílias que controlam os acontecimentos do planeta.

    Não me parece que agora irão usar o Quantitive Easing 2 mas sim deixar o sistema colapsar e prosseguir com o plano para a sua nova era.

  3. Obrigado Ravena!

    Afinal é o que estamos a fazer todos, os que escrevem nos blogues e os que lêem: desvendar o(s) truque(s).

    🙂

  4. @NunoSav:
    Sim, deixar o sistema colapsar e uma possibilidade.
    Mas o Quantitative Easing 2 salvaria (ainda uma vez) os bancos. E estes são a "chave de volta" do sistema.

    São os bancos que ditam as regras no Velho Continente, com em primeira fila o BCE.

    São os bancos que ditam as regras nos Estados Unidos, com a Fed.

    São os bancos que ditam as regras em boa parte do resto do mundo, com o FMI.

    Se um "Too Big to Fail" ficasse insolvente não mergulharia sozinho, mas arrastaria outras instituições: numa altura de crise como esta é difícil prever as consequências. Pensamos nas implicações politicas, por exemplo, ou internacionais; mas também nas internas (poupanças e investimentos que desaparecem, vidas arruinadas, medo, revolta…).

    Por enquanto não há bancos dispensáveis. Só os pequenos, que de facto desaparecem. Mas isso ajuda a concentrar o sistema bancário nas mãos de poucas instituições.
    É por isso que existem as "Too Big To Fail".

    Os bancos são a chave do sistema.

    Abraço!

  5. Não sei se já ouviste a entrevista de uma senhora que dá pelo nome de Svali na internet, embora nunca dando 100% de credencia às pessoas eu acredito no que ela disse logo vejo no futuro os Países e/ou os bancos a ficarem insolventes e deixarem de prestar serviços (tipo o BPP) criando o caos necessário para trazer as mudanças radicais que ouvimos falar (dinheiro digital, RFIDs, etc).

    Não que interesse muito visto que o que vier será mau e cá estaremos nós para tentar fazer ver às pessoas …

    Começar é a ler sobre agricultura para não andar às cegas daqui a uns meses.

  6. Obrigado pela dica Nuno, vou já procurar a tal Svali (não conheço!): ainda bem que existe YouTube…

    Somo bombardeados por um quantia enorme de sinais, muitas vezes contrastantes, e é difícil tentar perceber qual possa ser o próximo futuro.

    Neste momento, por exemplo, acabei de ler um artigo com o qual concordo (e que acho vou traduzir): afirma que o futuro próximo (muito próximo) é uma guerra.

    Então: será a "minha" guerra ou a "tua" sociedade controlada? Em verdade uma coisa não exclui outra.

    O que dá da pensar é o facto que podes navegar na internet até a exaustão, ler os jornais, falar com as pessoas: mas só com extrema dificuldade podes encontrar alguém com uma visão "positiva" acerca do futuro. Se excluirmos os adeptos da Canção Nova, claro.

    Somos todos pessimistas e/ou masoquistas? Acho que não. Eu, por exemplo, não sou, nem uma coisa nem outra.

    O que todos já entendemos é que esta sociedade, assim como foi concebida, está desactualizada e terá de ser substituída.
    O problema é que já percebemos que uma eventual transformação não será indolor; e sabemos também que há muitos riscos nisso, pois mudar não significa necessariamente melhorar.

    "…e cá estaremos nós para tentar fazer ver às pessoas" dizes tu. Isso é que não sei: se as coisas correrem mal acho que pessoas como tu, eu e todos os que tentam ver "além" terão muito pouco espaço…E não é pessimismo: é lógica 🙂

    Abraço!

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