Os piratas modernos

Um fenomeno que de vez em quando merece as manchetes dos jornais para depois desaparecer ao longo de meses.

Falamos da pirataria.

Esqueçam Jack Sparrow: a realidade aqui é muito menos romântica e encontra as próprias origens nas pobreza e no desespero, em jovens sem futuro, nos Países africanos ainda à procura da própria identidade..

Alfonso Arpaia trabalha no Middlebury College, EUA, e dedicou o seguinte artigo ao tema.

Pirataria e geopolítica

Desde alguns anos existe um fenómeno perigoso que está a crescer a nível mundial e que afecta várias regiões do mundo, incluindo o litoral ocidental e oriental da África, o continente com o qual o fenómeno em questão está intimamente ligado. Falamos da pirataria, uma realidade de origens antigas que sempre tem a ver com o mar mas agora encontra as suas raízes em outros lugares: segundo o professor de Direito de Navegação e Transportes, Nicoló Carnimeo, a pirataria moderna é um fenómeno terrestre (nasce da instabilidade dos Países de origem) e não marítimo, e, portanto, deve ser combatido (ou resolvido) no chão e no mar. A pirataria da costa leste de África também é filha duma Somália sob o domínio do caos há quase duas décadas. As costas da Somália totalizam mais de duas mil milhas náuticas e, juntamente com as da África Ocidental, formam um cenário favorável para o aparecimento de ataques contínuos dos piratas africanos.

Em termos jurídicos, o conceito de pirataria refere-se às acções realizadas em alto mar, fora da jurisdição de qualquer Estado: acções criminosas executadas dentro das águas territoriais, ao invés, são classificados como assaltos à mão armada no mar.

Na Somália, os jovens sabem que podem perder a vidas em qualquer momento, sentem que não têm nada a perder e certamente muito a ganhar em acções de roubo contra navios mercantis. A situação de pobreza crónica, juntamente com o sentimento generalizado entre o povo somali de que as condições de vida nunca vão melhorar, são factores que estimulam o suficiente para tornar-se parte do cada vez maior “exército” de saqueadores do mar. Se ao nível estritamente social este é um terreno fértil para a alimentação do fenómeno, a nível político e institucional os piratas dos mares Africano podem beneficiar, no caso da Somália, dum contexto local sem uma forma eficaz de governo estável; um tal vazio institucional é contagioso para a mesma economia doméstica, terreno fértil para um mercado que favorece a colocação fácil dos despojos dos piratas modernos. Em outras palavras, existe uma osmose perfeita e interdependência entre a pirataria e Estados sem governos, entre criminalidade marítima e instabilidade institucional: e não podemos esquecer as organizações terroristas.

Actualmente, os actos de pirataria não ocorrem apenas na costa da Somália, mas também ao longo da costa entre a Arábia Saudita e o Paquistão; na África Ocidental; na paisagem imensa e complexa do Sudeste asiático; e até nas Caraíbas e nas costas do Pacífico da América Latina. Hoje o Golfo de Aden é parte do mundo mais afectada pelos ataques dos piratas, seguida pelas costas da Nigéria e da Indonésia. Em última instância são os mares africanos que sofrem particularmente o problema da pirataria. As costas entre Iémen, Somália, Djibuti e Eritreia oferecem uma conformação muito favorável aos ataques dos piratas, porque constituem um insidioso estreito que abranda a navegação.

Zonas de actuação da pirataria somali

As fronteiras marítimas da Europa (o chamado “Mediterrâneo alargado”, que se estende muito além de Gibraltar, Grécia, expandindo-se a partir da costa senegalesa até o Corno de África) é cada vez mais no centro da PESC, a Política Externa e de Segurança da União Europeia. Tanto a NATO quanto a UE têm mexeram-se em termos militares para tratar dum alarmante aumento do fenómeno criminal. Os ataques dos piratas modernos são prejudiciais ao comércio marítimo mundial e europeu: as rotas marítimas são mesmo mais caras também em termos de protecção, porque a pirataria não tem como consequência o custo para libertar os reféns, mas também os desembolsos decorrentes do desvio das rotas marítimas comerciais e os custos das seguradoras. Ao mesmo tempo, este tipo de actividade criminosa fornece capitais que muitas vezes os senhores da guerra reinvestem no sector imobiliário do Quénia e da Etiópia.

O contexto somali faz com que as redes de pirataria desenvolvam fortes laços com o terrorismo fundamentalista do Iêmen e da mesma Somália, sendo, em muitos casos, verdadeiras organizações terroristas que estão envolvidas nos ataques a navios mercantis no mar.

Não é difícil entender quanto estratégicas sejam as águas entre o Canal de Suez e o Golfo de Aden, onde transita o tráfego comercial de todo o planeta e onde os Países envolvidos, em termos de interesses económicos e comerciais, pertencem a diferentes esferas geopolítica, desde Hong Kong até os Estados Unidos, através da Ucrânia e da China, esta última com problemas de pirataria a serem enfrentados mesmo nas águas ao redor das próprias costas.

Mais, parece que a pirataria é até prejudicial para o ecossistema do mar: os piratas, de facto, muitas vezes atingem com armas pesadas os tanques de petróleo que caem nas suas garras.

Sem mencionar o perigo que os ataques constituem para a ajuda humanitária das Nações Unidas, em falta da qual a Somália poderia enfrentar uma catástrofe.

Além disso, temos que ter presente que a pirataria no Corno de África é uma ameaça para a segurança do abastecimento energético da Europa. Por seu lado, os Países ocidentais têm feito muitos passos para dar segurança ao trânsito de mercadorias com destino os próprios mercados, incluindo o transporte de petróleo.

Grande atenção deve ser dada pela Europa e os EUA aos problemas internos da Somália, onde a ala fundamentalista islâmica, que já impôs a lei islâmica no País, opõe-se aos bandos dos piratas. É verdade que a presença de formações fundamentalista estabelecidas no território somali pode não necessariamente ser garantia de um desenvolvimento frutífero nos relacionamentos internacionais de Mogadiscio, considerando também que o vizinho Iêmen é atormentado por problemas de terrorismo e também o governo fundamentalista do Sudão, com ambíguas ligações internacionais, poderia fomentar iniciativas anti-ocidentais ao longo do Corno de África: a Somália, em suma, poderia ficar fechada numa perigosa trama entre o Oriente e o Ocidente das suas fronteiras.

Não devemos esquecer que as acções contínuas dos sequestradores nos mares africanos, precisamente devido ao facto deste fenómeno ser um veículo para actividades criminosas, financeiras e não, já comportaram uma mudança na geopolítica das principais potências ocidentais e, em particular, de toda a União Europeia.

Como dizer: os piratas dos mar, na tentativa de fugir à pobreza do próprios País, arriscam ver pioradas ainda mais as próprias miseráveis condições.

Fonte: Eurasia

Obrigado por participar na discussão!

This site uses User Verification plugin to reduce spam. See how your comment data is processed.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.