Mercado demente

Ok, a primeira pergunta é: mas é normal?
Não, não é. Esta é tudo menos uma economia normal.
E ainda menos podemos falar duma economia em fase de retoma.

A cada semana temos que ter um “dia negro” dos mercados.
Hoje a Bolsa de Madrid afundou com -3,80%, mas os outros mercados não foram muito melhores: Paris, Bruxelas, Milão, Lisboa todos abaixo do -2%. Wall Street além do -3%, abaixo dos 10.000 pontos.

Do Euro nem vale a pena falar. Há quem (Roubini) afirme que o destino da moeda única é de ficar ao mesmo nível ou até abaixo do valor do Dólar.

As razões? Duas, basicamente: os dados relativos ao emprego nos EUA, bem inferiores às previsões, e a situação da Hungria que ao que tudo indica poderá ser a próxima Grécia.

Entrámos na segunda fase da crise? A fase dos default soberanos? Assim parece.

Vamos ver o que escreve e os dados que reporta Cobraf:

Entre os gestores a maioria pensa e uma parte também diz que deve haver necessariamente uma reestruturação da dívida de Países europeus como a Grécia, Espanha, Portugal e Itália, isso é, default parciais, com os quais alongar os prazos e reduzir o fluxo de caixa dos credores para os próximos dez anos

Neste link um exemplo do tipo de relatórios que circulam agora, calcula-se como pode Portugal pagar as dívidas e simulam-se hipóteses de reestruturação da sua dívida.

Por exemplo, aqui temos o perfil dos financiamentos de Portugal, estas pessoas infelizes precisam refinanciar nos próximos anos bilhões de Euros que representam 10 ou 15% do próprio PIB anual. Imaginem pagar num ano 15% do PIB para interesses, principalmente aos bancos estrangeiros. Uma vez que dum lado há um Estado soberano e democrático e de outro lado bancos estrangeiros, chegará uma altura na qual os Portugueses dirão “Desculpem, mas nós preferimos um default parcial”.

O plano de resgate de 750.000 milhões da UE e do FMI, como mostrado, apenas prolonga os tempos e, basicamente, desloca para a frente os principais encargos da dívida que os Portugueses têm que pagar em prestações e juros a cada ano. Em vez de ter de encontrar 16% do PIB neste ano será preciso só 10%, mas no prazo de três anos chegará o duro golpe.

Como pode ser visto claramente aqui é apenas um adiamento do problema.

Em azul: necessidade de financiamento da dívida pública portuguesa 
(em percentagem do PIB) antes do plano EU-FMI.
Em vermelho: mesma necessidade depois do plano EU-FMI.

O ponto é que na Europa, além dos problemas já conhecidos da dívida, os bancos têm agora 22.000 biliões de crédito concedido ao sector privado, famílias e empresas (dito de outra forma: os privados europeus têm uma dívida com os bancos igual a 22.000 biliões); com um PIB da eurozona de 9,000 biliões; e um capital dos bancos que talvez chegue aos 5-600 biliões.

22.000 biliões de créditos (que para nós são dívidas) contra um PIB de 9.000 biliões e bancos que podem chegar aos 600 biliões.
Se olharmos para os resultados das Bolsas de hoje podemos ver como os títulos mais penalizados são os dos bancos. E é óbvio: quem realmente acredita que com números destes alguém será capaz de reembolsar os créditos?

Só Espanha, Irlanda, Portugal e Grécia têm cerca de 2.000 biliões de dívida privada (atenção: dívida privada, não dívida pública que aqui fica fora das contas), e são os bancos europeus, franceses, alemães, austríacos, suíços, holandeses, belgas e italianos que detêm estes créditos cruzados.

Os governos em conjunto destinam grandes somas de dinheiro em fundos destinados ao apoio de Países em dificuldades e a BCE compra todos os dias biliões de títulos Gregos, Espanhóis, Portugueses ou outros créditos do sector privado; por isso parece que o sistema  funciona.

Mas os governos europeus têm um deficit público também: este ano, por exemplo, a França tem um deficit público de 8% ou 9% do PIB. Mas se somamos a dívida pública equivalente a 83% do PIB, eis que um País agora “são” alcança o 90% do PIB em 2010 e em 2012 uma dívida pública equivalente a 100% do PIB.
E esta “saudável” França empenhou-se na ajuda de outros Países débeis, o que significa outros 70 ou 80 biliões adicionais.

Aqui falamos de números como dezenas ou centenas de biliões, que todos os governos utilizam para sustentar um sistema bancário absurdo que tem 22.000 Euros de créditos (ou dívidas, ponto de vista)!.
O BCE, no entanto, é um banco com um capital de 60 biliões de Euros.
60 biliões, não mais.
Então onde encontra o dinheiro para adquirir títulos de Estado?
Já adivinhado?
Exacto: imprimindo moeda.

A Grécia (mas poderia ser a Espanha, Portugal…) quer vender X biliões de bond. O BCE quer comprar mas não tem dinheiro. O que acontece? O BCE imprime o dinheiro a partir do nada. Mas o dinheiro imprimido não reflecte riqueza nenhuma, é só papel.

E a coisa paradoxal (ou se calhar não, se calhar é esta loucura a normalidade) é que este dinheiro sem valor é empregue para pagar um pedaço de papel com o qual a Grécia se empenha a pagar no prazo de X meses o mesmo valor mais os interesses. Se a Grécia não falir antes!

Depois ficamos espantados se o Euro perde cada vez mais valor?
Ou temos que interpretar este mecanismo perverso como um sinal de retoma?

Ipse dixit.

Fonte: Cobraf.com

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