Os três grande erros do Euro

Segundo e último encontro com analistas universitários italianos.

Neste caso o convidado é Giulio Sapelli.

Licenciado em História Económica ganhou uma especialização em Ergonomia. Conduziu pesquisas pela Faculdade de Ciências Políticas e Economia em Londres, Universidade de Barcelona e Universidade de Buenos Aires. Foi director de estudos na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais em Paris.

Actualmente é professor de História Económica da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade de Milão.

A seguente entrevista foi realizada no dia 12 de Maio de 2010.

Professor, ontem, as Bolsas fecharam em Vermelho e o Euro voltou a perder terreno contra o dólar. Isso significa que o plano europeu não funcionou?

Não fique impressionado com os altos e baixos do mercado, porque estamos num período de alta volatilidade financeira. Por isso medir a funcionalidade do plano em tão pouco tempo com o valor das Bolsas é errado. Em vez disso devemos perguntar se esse plano vai resolver os problemas no longo prazo.

E acha que vai acontecer?

Sempre fui contra este tipo de intervenção. Fiquei sozinho por muito tempo, depois vi que Francesco Forte expressou posições semelhantes à minha: acredito que não era “preciso” salvar a Grécia. Lamento que a posição da Alemanha tinha sido vista como egoísta e anti-europeia. O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, de facto tinha percebido que resistir e pedir que a Grécia colocasse ordem nas suas contas, ou então entrar em default, era o melhor. Acho que o plano foi um erro grave por três razões.

Quais?

O primeiro é que os Países, ao contrário das empresas, podem entrar em default e não pagar as dívidas, não se esqueça, não são com milhares de pequenos investidores, mas com grandes bancos de investimento ou gigantes como Goldman Sachs, que ajudou a Grécia para “esconder” a realidade das contas do seu governo. Economistas e jornalistas podem ter esquecido que, no século passado, tivemos cerca de vinte default na Europa. Não entendo agora porque tanta ênfase é colocada sobre esta crise. Além disso, esse plano irá aumentar exponencialmente a dívida dos Estados. Por fim, corremos o risco de aumentar o risco moral (moral hazard, NTD). Agora todos sabem que podem comportar-se não de modo virtuoso, pois haverá sempre a Europa para salva-los. Em resumo, acredito que este plano não vai funcionar, pois só afasta o cálice amargo. A solução do problema só pode vir da reestruturação da economia grega e dos outros países que estão em risco.

Então acredita que ainda exista o risco de contágio da crise?

O risco antes era mínimo. Agora, com todo esse dinheiro colocado em campo, o nível da dívida pública vai alcançar as estrelas e, provavelmente, haverá ondas de ataques especulativos com alvo os títulos soberanos de nações europeias.

No entanto, graças a este plano, o BCE tem o direito de comprar títulos de Países em perigo.

Penso que este foi um grande erro. Assim, na verdade, prejudica-se o objectivo da independência do banco central. Com a veia do populismo que há corremos grandes riscos de aumento da dívida pública, então sim que será “lágrimas e sangue”. Era melhor reformar o estatuto, tipo a Federal Reserve, com o BCE a ocupar-se não só da estabilidade não mas também do desenvolvimento, permitindo um mínimo de inflação. Um Euro um pouco mais fraco, e mais um pouco de inflação, não prejudicam. Pelo contrário.

Mas a verdade é que esta crise mostra que alguém viveu por muito tempo acima das próprias possibilidades.

Sim, é verdade, alguém viveu acima das próprias possibilidades, mas foi mesmo a “fábula” do Euro que alimentou a ilusão de que os Países poderiam ter vivido dessa maneira: a moeda única teria pensado a ajeitar tudo.

Antes lembrou que o fracasso da Grécia teria consequências negativas para os grandes bancos. A impressão é que o plano europeu, para salvar as exposições dos Estados-Membros com os grandes grupos financeiros, irá pedir sacrifícios de todos. Em suma, as pessoas pagam para salvar os bancos.

Isso é verdade também. Por isso era preferível  a criação de um fundo de solidariedade europeu para os desempregados e para os funcionários públicos que irão ver os salários reduzidos. Hoje vemos que a globalização financeira é revelada por aquilo que nos últimos tempos é: uma ferramenta para aumentar a terrível desigualdade social e para fazer pagar aos trabalhadores o custo duma finança sem sentido. A Grécia também é uma vítima.

Agora o que a Europa deve fazer? Precisa de um empurrão da política?

Devemos estar cientes de que a união monetária europeia foi um grande fracasso. Não nós apercebemos das falhas que o Euro está causando à economia, porque esta é a primeira vez na história que há dinheiro sem um Estado. Em vez disso, a “loucura” dos economistas neo-liberais e dos banqueiros centrais foi pensar que uma vez feita a economia, o resto teria vindo. A sociedade rebelou-se, mas agora são os elementos mais fracos a pagar o preço deste erro. Onze anos mais tarde descobrimos que a criação do Euro foi um enorme erro. Os economistas americanos, a partir de Krugman a Samuelson, já o tinham entendido.

Quais foram as piores consequências do euro?

Fazer a moeda única antes da Europa política tem facilitado a formação de uma classe financeira descontrolada, que ganha super-salários e, infelizmente, cúmplice dos bancos centrais. Está tudo no longo ciclo de dominação do capital financeiro na economia real e na política. Muitos, na verdade, os políticos europeus que já foram parceiros de grandes realidades financeiras. Talvez apenas Tremonti, Schaeuber e Merkel são imunes e não acaso são eles que defendem ainda a primazia de uma verdadeira independência política. Agora precisamos de uma política europeia unitária.

E quais são os primeiros passos a tomar para conseguir isso?

Europa deve partir com a unificação dos sistemas de previdência, que terão de ser profundamente de-estatalizados e apoiados. Precisamos também de políticas em matéria de fiscalidade e de defesa.  Antes teria sido preciso formar os Estados Unidos da Europa, depois pensar em ter a moeda única. Infelizmente, hoje temos uma situação onde é preciso manter o euro e esperar obter depressa uma Europa unida antes do Euro provocar uma enorme estagnação. Mas, francamente, acho isso difícil, devido também à fila de Países que estão dispostos a aderir à união monetária.

Que acha da situação em Itália?

O problema da Itália não é tanto a dívida ou o deficit. Nesse sentido, temos sempre “âncora” da poupança e de inexistência de dívidas privadas. O fato é que o nosso País está crescendo lentamente, com a pequena dimensão das empresas e a baixa produtividade do trabalho. É neste último ponto em particular que devem ser desdobrada a maior parte do esforço.

Ainda sobre o tema da Itália, que acha do mapa da Europa publicado pelo Economist que mostra que o nosso País dividido em dois, com o Sul marcado com a palavra “Bordel”?

É sem dúvida uma coisa vulgar, uma queda no estilo Economist. Honestamente não era para ser publicado. Fica o fato que os Apeninos realmente marcam uma fronteira entre duas formações  social-económicas: a Europa continental e a do sul. Ao longo dos anos não conseguimos integrar estas duas realidades tão diferentes.

A primeira das duas entrevistas, com Francesco Forte, pode ser encontrada aqui.

Fonte: Il Sussidiario
Tradução: Massimo De Maria

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