Onde estão as reservas de ouro? – Parte II

Ao longo das últimas 4 décadas, o esvaziamento dos cofres teria acontecido de duas formas: por meio de leilões e de operações encobertas.

Os leilões foram a maneira mais simples e também aquela oficial. Os primeiros dados apareceram em 1975, quando foi revelado que o total das reservas de ouro de todas as Nações e organizações internacionais do mundo totalizavam 36.700 toneladas. O Global Finance Power decidiu envia-las para o leilão e “optimizar” os procedimentos para a venda, a permuta e a alocação do metal.

O processo em larga escala foi desencadeada pela abolição do Gold Stantard (a teoria com base na qual cada moeda ou nota tinha ter uma correspondência de ouro no banco central) feita por Nixon em 1970-71. Após séculos, o ouro perdeu o papel de garante do valor do dinheiro em circulação, ficando o metal para joalheiros, dentistas e fabricantes de sofisticados gadgets tecnológicos, incluindo os aeroespaciais. Nesta altura, tornou-se uma matéria-prima como outras. Pelo menos em teoria.

Todos os leilões das reservas oficiais de ouro e ouro podem ser divididas em três categorias:

  1. os primeiros leilões: activas desde a segunda metade da década de 1970 até o início de 1980, organizados pelo Tesouro dos EUA e o Fundo Monetário Internacional;
  2. os leilões dos bancos centrais, no âmbito do chamado Washington Gold Agreement (WGA), assinado no Outono de 1999;
  3. os leilões isolados, organizados por bancos centrais e organizações internacionais em anos diferentes.
Na década de ’70, os EUA cedeu a diferentes sujeitos 530 toneladas de ouro e o FMI 732 toneladas: um total de 1.262 toneladas. Na década de ’80, a actividade continuou com pouca publicidade. Nos anos ’90, as vendas de ouro dos Países economicamente desenvolvidos atingiram o considerável total de 2.900 toneladas. No final de 2000, as reservas oficiais de ouro do mundo tinham 3.600 toneladas de ouro em menos do que em 1975.

Como mencionado, em Setembro de 1999 tinha sido assinado o primeiro WGA entre 17 bancos centrais, incluindo o Banco Central Europeu. O documento regulamentava as vendas de ouro ao longo dos sucessivos cinco anos e destinava-se oficialmente a pôr ordem no mercado. Afirma Katasonov Valentin, analista de Global Research:

Na verdade o seu objectivo era forçar os bancos centrais a vender as reservas para manter baixos os preços do ouro.
Também Marco Saba, director de pesquisa do Centro Estudos Monetários concorda:
Há entre os bancos centrais uma continua manipulação activa.
Foram estabelecidos “limites” para cada País, num total de 2.000 toneladas. Em Setembro de 2004, o acordo foi actualizado com novas regras. (WGA-2). Finalmente, em Setembro de 2009, foi assinado o WGA-3.

De 2001 até 2009, os maiores vendedores foram: Suíça (1.300 toneladas), França, Grã-Bretanha e Holanda, Espanha e Portugal. O volume médio anual das vendas dos bancos centrais foi de 385 toneladas. Em 2009, no entanto, no auge da crise financeira, houve uma reviravolta nas políticas dos bancos centrais, especialmente daqueles da Ásia. Porquê? Pode também ser considerada como um importante sinal de falta de confiança no Dólar americano?
Responde Saba:
Ainda antes do que mera falta de confiança, poderia ser o primeiro passo de um projecto antagonista de criação duma nova moeda apoiada pelo ouro.
Em qualquer caso: nos 40 anos seguintes à abolição do Gold Standard, um total de 6.500 toneladas de ouro foram vendidas, emprestados, “alugadas”. Segundo os dados oficiais, as reservas de ouro são agora apenas um pouco mais de 30 mil toneladas.

Estranhamente (por assim dizer…) uma análise detalhada das vendas de ouro por parte dos bancos centrais mostra que as transferências foram feitas quando os valores do metal eram mais rentáveis para o comprador e não para o vendedor. Um exemplo clássico de “privatização”.

Aqui estão alguns dos casos.

O ouro de Gordon Brown 

Entre 1999 e 2002, quando o mercado de ouro estava no seu ponto mais baixo em comparação com os 20 anos anteriores, o Banco da Inglaterra vendeu em 17 leilões mais 400 toneladas de ouro, mais do que a metade das suas reservas. A decisão de vender foi tomada pelo Ministro das Finanças, Gordon Brown. Antes do leilão, havia 715 toneladas de ouro nos cofres britânicos, no final restavam pouco mais de 300 toneladas. Os recursos obtidos com as vendas do ouro foram convertidos em Dólares, Euros e Yens. Moedas que hoje estão todas em sofrimento.

É interessante realçar como na mesma altura, entre 2000 e 2001, o Bundesbank reduziu o seu ouro detido em Londres de 1.440 toneladas para 500 toneladas, oficialmente porque os custos de armazenamento eram muito altos. O metal foi transportado por via aérea para Frankfurt. Qual a razão daquela mudança? É lícito pensar que Berlim quis evitar que o seu ouro também fosse vendido para nunca mais voltar?

Na Primavera de 2010 Londres pediu uma investigação: o preço do ouro tinha aumentado mais de quatro vezes em relação ao preço de venda de 10 anos antes (1.250 Dólares por onça-troy contra quase 300 Dólares). Descobriu-se que as perdas decorrentes da venda imprudente tinham atingidos 7 biliões de Esterlinas. Entre 1999 e 2001, o secretário do Tesouro dos Estados Unidos era Larry Summers, que estava em contacto com Gordon Brown e pressionava para que houvesse a venda das reservas inglesas.

A Suíça e os 60 biliões perdidos

Outro exemplo é a Suíça. Em 1999, as reservas oficiais de ouro da Suíça eram de 2.590 toneladas. Entre 2000 e 2005, o Banco Nacional da Suíça vendeu um total de 1.300 toneladas de ouro. O preço médio do metal na época era de 350 Dólares por onça-troy (variou entre 250 e 450 Dólares). No outono de 2012, o preço do ouro nos mercados mundiais aproximava-se ao valor de 1.800 Dólares, mais de cinco vezes da média do período 2000-2005. Assim, estima-se que as perdas da operação foram de 60 biliões de Dólares. Cerca de 9 vezes as perdas decorrentes da venda das reservas britânicas. Uma coisa verdadeiramente esquisita.

Estes exemplos mostram como os leilões do ouro não foram feitos em favor das autoridades monetárias ou dos contribuintes da Grã-Bretanha e da Suíça, mas em favor dos compradores, que, obviamente, preferem manter o anonimato. É possível perguntar como é que Ingleses e Suíços puderam cometer tais erros?

Sublinha Marco Saba:

Quem tem o poder de imprimir dinheiro não se preocupa com o preço do ouro.

Verdade. Mas vende-lo a preços de saldos?

As operações secretas para remover o ouro
dos cofres dos bancos centrais

Em 1990, os bancos centrais começaram a fornecer activamente ouro em leasing.
Segundo Katasonov:

Estas operações foram mantidas escondidos ao público, aos órgãos reguladores e aos governos. Um dos principais objectivos destas práticas secretas era baixar o preço do ouro, que indirectamente continuava a rivalizar com o Dólar. Naquela época, a oligarquia financeira precisava de um Dólar forte para compras em todo o mundo.

Muitos analistas revelaram os planos secretos da finança global, que já tinham escravizado a maioria dos bancos centrais de todo o mundo para os seus próprios interesses. Foi criada a GATA (Gold Anti-Trust Action), com o objectivo de descobrir as operações secretas do “Cartel de Ouro”, uma associação de facto constituída por: Federal Reserve, Banco da Inglaterra, bancos de Wall Street (em primeiro lugar Goldman Sachs) e uma série de outros bancos e sociedades financeiras, incluindo os europeus Bundesbank e Banco Nacional da Suíça.

No cartel entravam também empresas de mineração de ouro. Uma deles, a Gold Fields Mineral Services (GFMS) admitiu que no início do século XXI “cerca de 5.000 toneladas de ouro, que estão listadas nos balanços dos bancos centrais, estão fora dos cofres “.

De acordo com James Turk, analista financeiro autor de The Collapse of Dollar:

Ao estudar as estatísticas aduaneiras da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos, pode-se concluir que, só nestes dois países, a fuga secreta das reservas oficiais de ouro entre 1991 e 2002, foi de 7.287 toneladas.

As estimativas de Frank Veneroso, que publicou um estudo sobre o mercado do ouro intitulado 1998 Gold Book Annual e é membro da GATA, são ainda mais dramáticas. No seu relatório, Veneroso chega à seguinte conclusão:

A venda de ouro por parte dos bancos centrais (4.000 toneladas por ano) suprimiu artificialmente o volume total da demanda de ouro (cerca de 1.600 toneladas por ano).

De acordo com os cálculos da Veneroso, em vez de 33 mil toneladas os bancos centrais tinham em 1998 18 mil toneladas do metal. Fora dos Bancos Centrais, portanto, circulam 15.000 toneladas de ouro entregues a organizações externas por meio de operações de leilões, leasing, crédito.

As estimativas de Veneroso não contradizem as de James Turk: são maiores, uma vez que levam em conta não apenas a remoção do ouro do oficial da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos, mas também da maioria dos outros grandes bancos centrais.

Mas como fazem os bancos a declarar ouro que na verdade já não possuem? É o que vamos ver na terceira  e última parte do artigo.

Ipse dixit.

Relacionado: Onde estão as reservas de ouro? – Parte I

Fontes: no final do artigo

3 Replies to “Onde estão as reservas de ouro? – Parte II”

  1. "Ainda antes do que mera falta de confiança, poderia ser o primeiro passo de um projecto antagonista de criação duma nova moeda apoiada pelo ouro."

    ou seja, uma moeda oriental antagonista e mais forte que o dólar, apoiada no valor do ouro com o nosso ouro?

    seria isso?

  2. Evolução das reservas de ouro, Banco de Portugal:

    •Em 1971, o BoP tinha 818,3 toneladas

    •Em 2001, o BoP tinha 606,7 toneladas

    •Em Abril de 2012 o BoP tinha 382,5 toneladas

    Max tens um gráfico completo?

    Cumprimentos

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