Dólar: crise para os próximos 15 anos?

Numa entrevista a Russia Today, cujo resumo foi publicado no site Eurasia, o economista e analista geo-politico William Engdahl fala da crise grega, dos bancos americanos, do futuro da Eurozona e do papel geo-político da Europa. 

William Engdahl apresenta o seu último livro, Gods of Money (Os Deuses do Dinheiro), uma obra fruto da pesquisa do autor acerca do desenvolvimento do sistema económico e financeiro internacional baseado no Dólar.

Engdahl afirma que já no começo da actual crise, em Agosto de 2007, foi evidente como a Federal Reserve, o Tesouro e o Congresso dos Estados Unidos estavam prontos para salvar e suster (com bilhões de dólares dos contribuintes) os bancos de Wall Street responsáveis, com atitudes enganadoras e fraudulentas, pela mesma crise. 

Numa recente entrevista a um diário londrino, o CEO da Goldman Sachs até teria afirmado que “nós somos simplesmente banqueiros que fazem o trabalho de Deus“, expressão significativa que revela a maneira de pensar da elite financeira com respeito à sociedade e ao mundo: numa palavra, acima da moral. 

Acerca da crise que a área do Euro vive, continua Engdahl, é preciso inseri-la na justa perspectiva e na correcta proporção, também quando se fala dos chamados PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha). O centro de gravidade actual da crise é e ficará New York, em particular Wall Street e o sistema baseado no Dólar. Logo a seguir, em termos de importância, encontramos a City de Londres e a Esterlina. Em comparação com estes dois centros económicos/financeiros, o que acontece na Grécia parece uma tempestade num copo de água e nada mais. 

A activação desta tempestade é certamente política e foi obra dos mesmos “gods of money” (Goldman Sachs, JP Morgan, Citigroup) que influenciam fortemente as agências de rating como Moody’s, Standard and Poor’s e Fitch.
Numa altura de grande pressão sobre o dólar, em Novembro de 2009, estas agências baixaram a avaliação do crédito grego, revelando que a Grécia tinha manipulado as próprias contas para conseguir entrar na zona Euro em 2002. Ironia, JP Morgan e Goldman Sachs (o principal conselheiro financeiro do governo de Papandreu) tinham ajudado Atenas nesta operação de cosmética financeira.  

Mais em geral, segundo Engdahl, existiriam enormes problemas políticos ligados à natureza do processo que caracterizou a adopção do Euro. França e Alemanha estariam à procura, com os partner europeus, de pôr as bases para que o que se passou na Grécia não possa repetir-se na UE. Todavia, além de palavras bonitas, a verdade é que diversos hedge funds estão já a preparar ataques especulativos concentrados para gozar com os eventos gregos. 

No que diz respeito ao FMI (Fundo Monetário Internacional) e o seu papel na solução desta crise, é preciso não esquecer que este foi criado em 1944 por Washington e Wall Street como maneira de manter o poder financeiro dos EUA a nível global. É suficiente lembrar que, até hoje, os EUA têm (único País) o direito de veto acerca de qualquer decisão do Conselho de Administração do Fundo.
Existe assim um vivo debate na UE acerca da oportunidade de envolver o FMI na resolução de crises como a explodida na Grécia. Apesar das contrariedades, Bruxelas acabou por dar espaço ao FMI: um clássico caso de “operação de guerra económica” conduzida pelo sistema-Dólar contra o Euro.  
O primeiro, actualmente muito débil e alvo de fortes pressões, não parece estar na estrada da retoma, embora as palavras da Administração americana. E, provavelmente, não estará ao longo dos próximos 15 anos
A entrada do FMI na Eurozona, fortemente desejada por Berlim, é “como fazer entrar uma raposa num galinheiro”, e prejudica a mesma ideia de União Europeia. Ao mesmo tempo, representa um sinal para a comunidade económica e financeira internacional: o potencial do FMI não está esgotado. Pelo contrário, o FMI tem o poder de actuar medidas capazes de anular as escolhas económicas e financeiras da União.

Engdahl revela como nos relacionamentos internacionais a UE tem uma atitude fundamentalmente esquizofrénica. Desde 1945 os relacionamentos transatlânticos foram o principal factor de estabilidade para o Velho Continente ao longo da Guerra Fria. Com a queda da União Soviética também o Pacto de Varsóvia acabou. O mesmo não aconteceu com a Nato. Washington decidiu ampliar a Aliança até às portas da Federação russa, com o apoio às assim chamadas “revoluções coloridas” e a promoção de governos-marionetas à volta da Russia. Todavia esta estratégia revelou-se um fracasso.
Moscovo e Pequim entraram na nova Organização para a Cooperação de Shangai (OCS) e colaboram sobre temas de segurança, defesa e economia também. De facto, emergiu uma nova dinâmica, uma dinâmica euro-asiática, a única potencialmente capaz de fazer frente ao domínio económico do Norte América. 

A dúvida fundamental no Velho Continente é assim o seguinte: entrar no jogo euro-asiático, com atenção aos recursos energéticos e ao comércio, ou entrar no sistema Dólar, cada dia mais parecido com o Titanic? Uma pergunta complexa, que precisa duma resposta articulada, capaz de considerar o actual cenário geo-político global. A União Europeia ainda não escolheu a direcção e por isso a sua política parece esquizofrénica. Escolher a Euroásia significaria enfrentar a imediata retorsão americana. Escolher os EUA significaria subir num barco que afunda. 

Fonte: Eurasia
Tradução: Massimo De Maria

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