Nós, as nossas impressões digitais e eles

Os últimos modelos de smatphone incluem novas tecnologias, sempre ao nosso serviços, sempre para
facilitar a vida e para o nosso bem.

Além do chip GPS, conhecido por geo-localização (com o qual os usuários são encorajados a dar consentimento para desfrutar ao máximo as funções incluídas), e o chip NFC (com o qual pode usar-se o telefone como um cartão de crédito: e os nossos dados confidenciais são hiper-protegidos, ora essa), eis que agora surge um sensor para a leitura das impressões digitais.

As nossas impressões digitais.
Para quê? Para desbloquear o dispositivo e fazer compras mais rapidamente.

Em outras palavras, os consumidores são convidados a abandonar a confidencialidade dos seus dados (e dedos) em troca do capricho de explorar de maneiras diferentes os seus dispositivos, com funções que já são lindamente (há décadas) sem o uso das impressões digitais.

Eu, por exemplo, desbloqueio o telefone com uma sequência numérica e faço compras com dinheiro (de preferência) ou com um cartão de debito. E sinto-me bem com isso, não tenho necessidade nenhuma de mudar. Nunca me aconteceu de acordar no meio da noite com pesadelos acerca da sequência numérica do telefone.
Mas eu sou criatura analógica, velha. E o mundo quer o digital.

O mundo? Se calhar o mundo inteiro não, mas uma parte dele sim. Nomeadamente, aquela parte que deseja controlar a vida dos cidadãos, cada vez mais. 

De facto, até agora a recolha das impressões é autorizada no caso da visita para o serviço militar (já abolido em muitos Países) e na sequência da detenção de cidadãos por parte das forças policiais. Fora isso, ninguém é obrigado a entregar as suas impressões. Mas com a nova tecnologia, milhões de utilizadores irão entregar voluntariamente os seus dados biométricos. E tudo de borla (aliás, o cidadão pagará para adquirir o último modelo de smartphone).

É claro que os fabricantes destes dispositivos asseguram que os dados recolhidos serão armazenados localmente apenas nos dispositivos de propriedade dos usuários. Onde é que já ouvimos isso? Não sei, mas nesta altura nomes quais Edward Snowden e NSA insistem em circular no cérebro.

Esqueçam e vamos ver quais as vantagens com as quais serão vendidos os novos modelos:

  • segurança (ninguém pode roubar o nosso smartphone, só as impressões digitais permitem utiliza-lo)
  • simplicidade (basta de lembrar códigos, o smartphone irá desbloquear-se com um simples toque)
  • comodidade (basta de dinheiro ou cartões, tudo no smartphone)
  • moda (tudo com um dedo: não é bonito?)

Nós por aqui temos um par de objecções.

1. Normalmente, os usuários justificam a escolha de desistir da sua privacidade com o argumento de
que “não têm nada a esconder”.

Uma forma tão ingénua de pensar faz quase ternura. Porque não importar-se de que alguém está a observar-nos, ouvir as nossas conversas e monitorizar os nossos movimentos, significa admitir que somos escravos obedientes.

A vigilância invisível é uma forma muito insidiosa de controle do pensamento, e quando usarmos a lógica do “não tenho nada a esconder, portanto deixa que controlem” implicitamente aceitamos a nossa submissão e abdicamos da soberania da nossa mente e do nosso corpo.

2. A segunda objecção está ligada aos riscos da privacidade.

De facto, os fabricantes reconhecem que as impressões digitais poderiam ser usadas para identificar-se antes da comprar de aplicativos nas lojas on-line, em remoto, o que confirma que as impressões serão catalogadas dentro bases de dados remotas. Agora, a quem pertence a mais utilizada loja de aplicativos on-line, a App Store? Olha, olha,: é da Google. Um nome, uma garantia, não é?

Podemos ousar e descrever uma cena do futuro?

Imaginem um hacker que consiga entrar numa destas bases de dados: faz o download e com uma impressora digital cria uma versão 3D das nossas impressões. Depois participa num crime e espalha as nossas impressões na cena.

“Mas eu não tenho nada a esconder!” reclama o Leitor.
Sim, mas agora tem que convencer o juiz.

Este é um caso limite, como é óbvio. No entanto, como afirma um dos especialistas em segurança do CNET:

Tenho certeza de que alguém com uma boa cópia de uma impressão digital e uma capacidade razoável de engenharia de materiais, ou até mesmo com uma boa impressora, seria capaz de fazê-lo (…) Se o sistema for centralizado, haverá um grande banco de dados de informações biométricas que serão vulneráveis a violações por parte de hackers.

Mais nada.

Entretanto, não podemos esquecer que nem será preciso adquirir o último modelo do smartphone para entregar as nossas impressões.

Perto da metade de Outubro, a Master Card e empresa Zwipe anunciaram o lançamento do primeiro cartão de crédito contactless (sem contacto), com um sensor de impressões integrados.

A revista PC Mag experimentou o novo joguinho: é suficiente premer o dedo sobre o chip e aproximar tudo a um terminal de pagamento contactless. A máquina faz “beeeep!” para comunicar que o pagamento foi efectaudo. Chegará em 2015 e, obviamente, as nossas impressões estarão protegidas com um algoritmo inviolável.

Claro, e quem pode ter dúvidas?

Ipse dixit.

Fontes: Disinformazione, Phys.org, PC Mag, Zwipe

One Reply to “Nós, as nossas impressões digitais e eles”

  1. Meu cérebro de poucas luzes relanceou algum recôndito quase inacessível um caso ocorrido com os coxinhas de jaleco aqui da terrinha. Probos e humanistas acima de tudo, alguns mediquinhos clonaram seus respectivos dedos indicadores em formas de silicone. Sempre havia um outro probo e humanista colega a carregar o dedinho para fraudar o ponto digital(!).É a evolução, meu caro.
    Com essa rapidez na evolução tecnológica não demora e os smart estarão aptos à leitura da íris, basta um olhar para a tela. Dessa forma, em algum momento, em algum lugar,alguém saberá de inopino quando fizemos e o resultado do último exame de próstata ou o último teste papanicolau,no caso das moçoilas.
    É a escravidão imperceptível de Matrix.

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