O Nobel da Paz e o poço da Síria

A dúvida: mas afinal Assad atacou o próprio povo com o gás sarin?
A resposta: não sabemos.

A dúvida é legitima: quem ganhou com o massacre?
Assad que arrisca uma intervenção militar estrangeira só para reconquistar dois bairros duma cidade?
Que arrisca assim perder o apoio daqueles Sírios (a maioria) que ainda apoiam o governo dele? Agora, com os rebeldes claramente presos num impasse com sabor à derrota?

Não faz muito sentido. E, além disso, não podemos esquecer que já nos últimos meses tinham sido os mesmos rebeldes a utilizar o gás contra os civis.

Mas vamos ver o que acontece fora da Síria.
O Presidente dos Estados Unidos, o simpático Barack Obama, anuncia uma intervenção militar contra o regime de Assad. Não é por nada: é Nobel da Paz. Mas não haverá tropas no terreno: apenas algumas centenas de mísseis empenhados numa operação cirúrgica. E sabemos desde os tempos do Iraque quanto precisas sejam estas intervenções. 

No entanto, o simpático Obama está com problemas: a rejeição do Parlamento britânico da hipótese militar deixou o Presidente dos EUA sozinho e mais fraco.
Na verdade, existe apenas um forte argumento a favor da intervenção militar na Síria. Mas há muitos outros contra. O argumento não é o gás sarin: é que, por causa da indecisão demonstrada ao longo dos últimos dois anos, se Obama desistir de atacar a Síria irá reduzir a zero a já baixa credibilidade dos Estados Unidos.

Pior, quando Obama declarou que não teria tolerado a utilização das armas químicas, de facto colocou o futuro dele nas mãos dos rebeldes e de Assad: porque houve uso de armas químicas e agora adversários (Irão, Rússia e China) e aliados (Turquia e Arábia Saudita in primis) esperam para ver.
Somamos o recente caso egípcio e a dolorosa derrota da diplomacia americana no caso Morsi: Obama tem o problema de reconstruir pelo menos um pouco da credibilidade perdida.

Até a única razão que pode suportar uma intervenção.
Depois há as contrárias. E são muitas.

A mais importante: qual o objectivo? Porque neste caso não há um claro objectivo político: na Síria não há uma ordem local que possa ser reconstituída com a derrota de Assad, a situação está fora de controle. A intervenção militar pode revitalizar os rebeldes, talvez leva-los até a vitória. Mas isso aumentaria ainda mais o caos e o número das vítimas: não há uma solução no horizonte.

Depois, Obama arrisca: o público americano mal sabe onde fica a Síria e é contra a intervenção. Uma “democracia” que vai para a guerra sem ter por trás a opinião pública está logo enfraquecida: seria suficiente um “acidente” (por exemplo, um indesejado massacre de civis) para provocar reacções negativas, cujos primeiro alvo seria obviamente o mesmo Obama.

Mais: uma intervenção demasiado “convencida” poderia de facto reforçar os “rebeldes”, até abrir-lhes a estrada da vitória. Mas vitória de quem? Da frente muçulmana mais radical. Mesmo agora, quando até em Teherão lidera um moderado? Qual o sentido?

A América deveria ter decidido o que fazer na Síria há muito tempo, na fase inicial da guerra civil. E o que fazer era claro aos olhos do especialista Edweard Luttwak (hebreu, ex-Conselho de Segurança , Nacional, ex-Departamento de Estado dos Estados Unidos, ex-Marinha, Exército e Aviação Militar dos Estados Unidos, ex-Nato: o gajo sabe): não tomar partido. Num choque entre os sunitas e o radicalismo xiita, o Ocidente deveria ter ficado “de fora”, sem intervir directa ou indirectamente onde não é chamado.

Num panorama bem pouco claro, nem o Primeiro Ministro do Reino Unido conseguiu convencer o Parlamento, que evidentemente ainda lembra-se das “armas de destruição maciça” do Iraque.
Sobram apenas os Estados Unidos e a França, sempre à procura da perdida Grandeur (especialmente quando as sondagens não forem favoráveis ao governo, como no caso do Presidente Hollande).

Sem uma autorização das Nações Unidas (nem um simulacro de legalidade, portanto), sem o principal aliado (a Inglaterra), com uma opinião pública contrária, sem objectivos políticos claros, com uma série de consequências imprevisíveis. Esta é nova guerra do Prémio Nobel da Paz, Barack Obama.

Que, não por acaso, decidiu apelar-se ao Congresso, na esperança que este possa salva-lo do profundo poço no qual enfiou-se com as suas próprias mãos.

Ipse dixit.

8 Replies to “O Nobel da Paz e o poço da Síria”

  1. Factos:

    – Em 21 de agosto os rebeldes sírios afirmam que o governo fez um ataque em que utilizou armas químicas

    – Os EUA e aliados de imediato deram esta afirmação como verdadeira. (Era bom que os nossos tribunais agissem do mesmo modo. Era um poupar de tempo
    e dinheiro. Ouvir testemunhas e analisar relatórios? Perca de tempo. O primeiro a apresentar queixa ganha a causa e pronto. Prenda-se o outro).

    – A ONU envia para a Síria 13 peritos para verificarem se houve ou não ataque químico.

    – A equipe da ONU ainda não terminou o relatório que, quando estiver concluído será distribuído por todos os países membros.

    – Os EUA, sempre um passo á frente, conseguiram um relatório em que se prova que o governo sírio fez um ataque químico. Eles são muito bons a conseguir relatórios. Já no Iraque também conseguiram um relatório muito jeitoso.

    – O Sergei Labrov não ficou muito convencido com o relatório dos EUA.

    – Eu também não, mesmo sem o conhecer. Culpa dos antecedentes.

    – O Rasmussen já veio a público apoiar um ataque à Síria. Não quero pensar que foi para pressionar os países membros da NATO. Longe disso.

    Vamos aguardar os próximos desenvolvimentos

    Krowler

  2. Parece-me que o caso Síria é cada vez mais semelhante ao caso Iraque. E ao caso Líbia. "Vamos lá lançar as bombas democratizadoras."

    Sobre o ataque químico: um hacker afirma ter descoberto informações acerca do ataque químico na Síria. Ele deixa informações no PasteBin, com alguns detalhes.

    (http://pastebin.com/zeXpsRnh)

    A acusação é grave, e a confirmar-se a veracidade da informação, seria um golpe muito sujo. Mas também não seria a primeira vez que os EUA recorreriam a um false flag para iniciar uma guerra/justificar acção militar.

  3. Lá vem esse português CAGÃO, com MEDO do conflito-fake na Síria: que eu nem sei, se o """proeminente""" (com muitas aspas) patrício, sabe aonde fica.

    Quero lembrar ao meu amigo LESADO, que coloque uma coisa na sua cabeça de bacalhau cheirando à podre. NÃO ACONTECERÁ TERCEIRA GUERRA MUNDIAL, nem nada parecido com isso.

    Grato Max-LESADO, pelo espaço que me proporcionou. Cuidado com o estoque de papel higiênico. Porque você terá prejuízo indo desse jeito.

  4. Té'quinfim querido Max, estava eu a imaginar que estivesse pendurado em algum "Pau-de-Arara" a tomar alguns choques nos países baixos, mas foi mesmo esquiar nos Alpes onde não ha internetE.
    Quanto aos motivos da guerra faltou o tal oleoduto, que vai ser o dono dele quando estiver pronto?
    Abraço

  5. "Sem uma autorização das Nações Unidas (nem um simulacro de legalidade, portanto), sem o principal aliado (a Inglaterra), com uma opinião pública contrária, sem objectivos políticos claros, com uma série de consequências imprevisíveis." Olá Max: nada disso é significativo diante da possibilidade de controle dos rios de petróleo encanado que correm pelos oleodutos no Oriente Médio, para a desgraça daqueles povos que lá vivem. Na Líbia também corria um caudaloso rio de água trazida do subsolo e que traria a independência real dos povos subsarianos. E também continua havendo o petróleo da melhor qualidade, já em mãos ocidentais. A Síria, do meu ponto de vista, só não foi destruída faz tempo, porque o emblema invadir para "libertar" já fez "jurisprudência" ( Russia e China estão de olho nos próprios interesses desta vez) e a criatividade da equipe do Prêmio Nobil da Paz anda em baixa. Abraços

  6. não têm melhor protetor para Israel mas não estão a gostar do "amigo" Assad. para já desamigaram-no no facebook. vamos a ver se o palhaço Holland consegue puxar o ig-nobel para o que gostam os EUA= guerra aos maus(desde que não sejam eles)

  7. O Teatro sionista do bem contra o mal continuará até quando? O mundo pagará essa conta indefinidamente? Sucumbiremos ao domínio da educação burguesa e de sua nefasta propaganda que garantem uma lógica perversa e dissimulada por interesses estritamente econômicos. Os povos assim como seus Estados Nacionais serão escravizados por uma pseudo modernidade que controlam de forma absoluta todo o establishment mundial.

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