Acabou a Guerra Fria

Titula o Jornal de Negócios:

Bolsa portuguesa a caminho da maior valorização diária de sempre

E as restantes Bolsas europeias estão na mesma onda. Quase uma corrida para ver quem ganha mais.
Entretanto chegam outras noticias interessantes, como esta:

Bancos centrais da Alemanha e França já estão a comprar dívida pública

O banco central alemão e o seu homólogo francês anunciaram esta manhã que estão no mercado a comprar títulos de dívida pública, no quadro das medidas de emergência anunciadas pelos Governos da Zona Euro e pelo Banco Central Europeu (BCE) para garantir a estabilidade da união monetária europeia. “Confirmamos que estamos a comprar hoje”, confirmou um porta-voz do Bundesbank à agência Bloomberg, depois de ter sido questionado sobre se o banco central alemão está no mercado a absorver títulos de dívida soberana. Também o banco central francês confirmou que está a tomar o mesmo procedimento.

Comprar dívida pública.
Reflictam acerca deste assunto. Não compram activos, não compram empresas, não compram produtos. Compram dívidas.

Um exemplo: eu, Portugal, tenho uma dívida de 100 €. E decido vende-la. Como? Com Títulos de Estado. A cada um que adquirir parte da minha dívida prometo uma taxa de interesse de 5%.
Chega a França e diz: Eu, eu quero a tua dívida!
Após um ano a França receberá 105 €.
Mas isso significa também que Portugal deverá pagar 105 € no prazo de um ano. Isso é, 5 € mais do que a actual dívida. Assim a dívida cresce.

Já vimos tudo isso.

E as Bolsas voam porque o jogo assim funciona.

Alguém pode perguntar: mas quem paga?

Para já, como refere a notícia, pagam os bancos centrais de França e Alemanha. Pagam os Estados.
E quem são os Estados? Somos nós, óbvio.

“Pagam os cidadãos dos Estados mais ricos!”, pode ser a objecção.

Não, nada disso.

Voltamos a Portugal. O País agora não tem capacidade imediata para comprar dívida dos outros Estados, sendo o segundo elo mais fraco da União Europeia. Mas os seus cidadãos vão pagar na mesma. Como?

Teixeira dos Santos admite aumento de impostos para atingir novo objectivo de 5,1% para o défice

O ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, admitiu esta madrugada em Bruxelas a possibilidade de aumentar impostos, depois de se ter comprometido com os seus parceiros europeus a reduzir o défice para 5,1% do PIB até ao fim de 2011.

“Se tiver que ser feito reforço acrescido da consolidação orçamental, se tiver de haver aumento de impostos, teremos de recorrer a soluções dessa natureza, sendo elas necessárias”, disse Teixeira dos Santos, citado pela agência Lusa, no final de uma reunião de emergência dos ministros das Finanças da União Europeia, em que foi aprovado um mecanismo de estabilização e auxílio mútuo para socorrer países da Zona Euro que enfrentem dificuldades em financiar-se nos mercados financeiros.

Por isso: os cidadãos dos Estados mais ricos pagam ao comprar as dívidas dos Estados em dificuldades.
Os cidadãos dos Estados em dificuldades pagam com taxas acrescentadas.

Moral: o capitalismo acabou.
Entrámos numa nova fase, a fase da socialização das perdas. Esta fase não começou hoje; mas a reunião das mentes pensantes em Bruxelas oficializou este esquema estreado pelos Estados Unidos.

Washington tinha socializado as perdas ao comprar bancos privados à beira da falência ou com pesadas ajudas nos últimos dois anos.
Bruxelas aplicou agora o mesmo esquema.

Mas este não é capitalismo.

No capitalismo clássico o empreendedor arrisca o seu capital no mercado. Os ganhos são seus, assim como as eventuais perdas.
Nesta nova fase já não é assim: os ganhos são privados mas as perdas são da sociedade.

É como se o capitalismo tivesse encontrado o comunismo: só que o fruto reúne o pior das duas doutrinas.

A boa notícia é: acabou a Guerra Fria.

Ipse dixit.

Fonte: Jornal de Negócios

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