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Covid: não há nenhum “caso Brasil”

Nas últimas semanas tivemos duas notícias constantemente repetidas acerca da Covid-19: a vacina AstraZeneca e as mortes no Brasil. Aqui falamos da carnificina epidémica no País sul-americano governado por Jair Bolsonaro. Que, obviamente, o PT acusa de “genocídio”, nada menos. Os artigos nas páginas do Partido dos Trabalhadores parecem retratar a obra do novo Nero que toca a lira na varanda enquanto o povo inocente morre de peste negra. Mas é mesmo assim?

Resposta curta e simples: não, trata-se de propaganda política.

Resposta cumprida: 4.000 mortes num único dia são muitas? Sim e não. São muitas em termos absolutos, não são muita sem termos relativos. Apesar de ser o País com o segundo maior número de mortes “de” Covid no mundo (depois dos EUA), é preciso comparar este número com a população. E no Brasil existem 211 milhões de habitantes.

Para fazer um exemplo prático: o impacto das 332.000 vítimas “de” coronavírus na população brasileira é muito inferior às 112.374 mortes em Itália que tem 60 milhões de habitantes. Se olharmos para o número total de vítimas, desde o início da epidemia até à data (sempre em relação ao número de habitantes), vemos que o Brasil está no 16º lugar nesta triste classificação. Não em primeiro, não em segundo, mas em décimo sexto lugar, abaixo de Portugal (15º). A Italia está em 12º lugar, os EUA em 14º lugar. No topo encontramos República Checa, Hungria, Bósnia, Montenegro e Bulgária. Outros Países da Europa Central muito afectados são a Eslovénia, Macedónia e Eslováquia, juntamente com Países da Europa Ocidental como Bélgica e Reino Unido.

Em Gibraltar, República Checa, San Marino, Hungria, Bósnia e Herzegovina, Montenegro, Bulgária, Macedónia, Bélgica, Eslovénia, Eslováquia, Italia, Reino Unido, EUA e Portugal morreu-se e muito mais do que no Brasil. Mas aí ninguém acusa o governo no poder de “genocídio”.

O Brasil é o mais afectado na América do Sul, mas os valores estão particularmente próximos do Peru (1.653 mortes/milhão no Brasil, 1.647 no Peru). Com a diferença que o Peru nunca chegou às primeiras páginas dos diários: porque será?

Número recorde de mortes num dia? O Brasil não é o País que regista o maior número de mortes por dia. De facto, desde 1 de Março, existem outros Países que registam uma taxa de mortalidade diária (mortes confirmadas “de” Covid-19 por 1 milhão de habitantes por dia) muito mais elevada do que o Brasil. No passado dia 6 de Abril: Hungria (24.6), Bósnia (23.2), Macedónia (18.7), Bulgária (14.8), Montenegro (13.6). O Brasil? (12.9). Não apenas estes Países (juntamente com a República Checa) registam uma taxa de mortalidade diária superior, mas também a taxa de crescimento é mais rápida do que a do Brasil.

Recapitulando. O Brasil não é o País com o maior número de mortes de sempre: primeiro há os EUA. Não é o País com o maior número de mortes em relação à população: fica em 18º lugar, atrás da Itália e de Portugal. Nem sequer é o primeiro País em termos de crescimento da taxa de mortalidade no último mês: antes há 5 outros Países europeus. E nem regista o maior aumento no número de mortes nas últimas duas semanas. Quanto à tendência na propagação dos casos, o Brasil está a registar um declínio (dados semanais), pelo que a tendência está a melhorar.

Resumindo: não há nada que torne o Brasil um caso “excepcional”, a não ser a propaganda partidária devidamente apoiada pelos órgãos de comunicação. Não há nenhum “caso Brasil” relacionado com a Covid, nenhuma “variante brasileira” que mate mais (doutro lado, é bom lembrar que a dita variante tinha chegado em Portugal também, passando praticamente despercebida). Existe, isso sim, um partido político que explora as mortes, semeando o medo entre os cidadãos, para ganhar a quem não conseguiu derrotar nas urnas.

Este é o verdadeiro “caso” do Brasil: um partido que não tem problemas em cavalgar as mortes (“de” Covid? “com” Covid? Nunca vamos saber) para os seus objectivos político. Espantem-se: quem faz isso não é um partido da obtusa Direita, é um partido “amigo do povo”.

Não é uma questão de opinião: é uma questão de números oficiais (WorldoMeter).

 

Ipse dixit.

Imagem: Lusa/Fernando Maia via Público