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Covid: Unicef, medidas de prevenção mataram centenas de milhares de crianças

Não tinha intenção de falar da Covid hoje. E que raio, de vez em quando uma pausa…

Depois, eis que encontro um relatório da Unicef, o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância. O relatório apresenta dados sobre os quais é preciso reflectir. Ou melhor: sobre os quais deveriam reflectir todos aqueles que apoiam as medidas de distanciamento social, como o confinamento, mas não só.

O documento é disponível em duas versões, ambas em língua inglesa: uma versão completa e outra resumida (quatro páginas). Por uma questão prática, vamos observar a versão mais curta.

O estudo centra-se nos seis Países mais populosos do Sul da Ásia: Afeganistão, Bangladesh, Nepal, Índia, Paquistão e Sri Lanka.

Quando a pandemia global foi declarada pela Organização Mundial de Saúde a 11 de Março de 2020, os serviços essenciais de saúde materna, neonatal, infantil e adolescente (SRMNCAH) em todo o Sul da Ásia já estavam a ser encerrados. Durante o segundo trimestre de 2020, o acesso a todos os serviços SRMNCAH essenciais diminuiu substancialmente, e por vezes de forma precipitada. Mesmo onde os serviços permaneceram abertos, a utilização diminuiu. No Bangladesh e no Nepal, por exemplo, o número de crianças pequenas a serem tratadas por desnutrição aguda grave diminuiu em mais de 80 por cento. Tanto a Índia como o Paquistão registaram reduções no número de crianças que receberam a vacina DPT3/Penta 3 [contra difteria, tétano e pertússis, ndt] de cerca de 35 e 65 por cento, respectivamente.

As nossas estimativas indicam que, até ao final de 2020, uma perturbação desta dimensão terá provavelmente contribuído para mais de 228.000 mortes adicionais de crianças com menos de cinco anos nos seis maiores países do Sul da Ásia, em comparação com o ano anterior. Espera-se também um pico no número de mortes maternas de mais de 16%, com mais 7.750 na Índia e mais de 2.000 no Paquistão, perfazendo um total de cerca de 11.000 mortes maternas adicionais estimadas em todo o Sul da Ásia.

É provável que tenham ocorrido mais 3.5 milhões de gravidezes involuntárias durante o ano 2020. Durante o segundo trimestre de 2020, as taxas de anemia materna por deficiência de ferro aumentaram mais de 40 por cento no Nepal e 22 por cento no Bangladesh em comparação com o mesmo período de 2019. Entre os adolescentes, é provável um aumento da mortalidade relacionada com doenças, com quase 6.000 mortes adicionais por malária, tuberculose, VIH/SIDA e febre tifóide. Cerca de 420 milhões de crianças do Sul da Ásia foram afectadas pelo encerramento de escolas desde o início da pandemia, e estima-se que cerca de 9 milhões abandonarão definitivamente a escola. Cerca de 50 por cento delas serão raparigas.

Dado o contexto cultural e social da Ásia do Sul, espera-se que isto leve a um aumento dos casamentos de crianças, resultando em mais 400.000 gravidezes adolescentes, bem como um aumento do número de mortes maternas e neonatais, e em taxas de atrofiamento de crianças. As medidas de mitigação Covid-19, incluindo restrições de viagens e bloqueios, tiveram também consequências mais amplas para a saúde pública, devido ao aumento dos níveis de desemprego, pobreza e insegurança alimentar. Espera-se que as maiores nações do Sul da Ásia registem um aumento das taxas de pobreza entre 0.6 e 3.7 por cento, e um aumento médio da insegurança alimentar de 18 por cento.

A Unicef reconhece que os modelos utilizados no estudo “têm várias limitações, a maioria se não todas, resultantes de restrições em torno da disponibilidade de dados, especialmente a nível subnacional” (página 35 do relatório completo).  No caso do abandono escolar, por exemplo, foram aplicados como pressupostos os dados do abandono na Indonésia durante a crise financeira asiática de 1997. O resultado é que as conclusões “podem muito bem ser subestimadas”: um documento muito recente do Bangladesh, por exemplo, indica que a proporção de famílias que ganham menos de 1.90 Dólares por dia aumentou de <1% para quase 50% e as que sofrem de insegurança alimentar aumentaram em mais de 50%”. Além disso, o modelo de impacto económico não inclui as distinções relacionadas com o género e esta é uma limitação importante “uma vez que o tipo de indústria, posição hierárquica, nível de pagamento e percentagem de cada sector são todos afectados pelo género”.

Sendo a Unicef uma organização no seio da ONU, as conclusões são previsíveis (pág . 36 do relatório completo):

Aumentar a cobertura das medidas de mitigação da Covid-19, tais como a utilização de máscaras e a higiene das mãos, o que pode levar a ~400.000 mortes a menos no próximo ano.

O que é ridículo: os efeitos negativos apresentados não dependeram da utilização de máscaras ou da limpeza das mãos. É exactamente o contrário: a falta de serviços, de assistência, o fecho das escolas, as interrupções das cadeias de abastecimento… todas estas foram as medidas “preventivas” na luta à “pandemia”, todas elas foram as responsáveis pelos impressionantes números contidos no relatório da Unicef.

Para ter uma ideia, vejamos os dados oficiais (WorldoMeters) relativos aos Países que o relatório analisou:

O que perfaz um total de 187.990 óbitos provocados pela Covid. Se os dados do relatório da Unicef estiverem correctos (o condicional é obrigatório porque 1. é um organismo da ONU 2. trata-se de estimativas), as medidas de “prevenção” mataram mais da doença e isso considerando só as faixas etárias dos mais jovens.

Paradoxalmente, por terem uma demografia dominada pelos jovens, os Estados da Ásia do Sul nunca estiveram em alto risco de Covid-19. A tragédia é que tenham sido seduzidos a fechar pela campanha de terror espalhada a o nível global.

Os encerramentos têm sido frequentemente justificados no último ano com base no princípio da precaução, criando o mito de que não têm qualquer custo, pelo menos em termos de vidas, e que qualquer custo financeiro deve valer a pena porque as medidas salvariam “centenas de milhares” de vidas. Um ponto de vista profundamente errado: o encerramento “por precaução” é mortífero, assim como a ideia de proibir a interacção e as actividades humanas durante meses de cada vez.

Todos os estudos com dados reais não mostram qualquer correlação entre restrições e mortalidade por Covid. Também não há provas de que estas “centenas de milhares” de mortes tenham ocorrido em lugares que evitaram restrições severas, tais como a Suécia, o Dakota do Sul, a Coreia do Sul, a Tanzânia ou a Florida. No entanto, este mito básico do isolamento persiste, não porque haja provas reais que o apoiem, mas para preservar a consciência daqueles que apoiaram medidas que tanto prejudicaram os Países e as pessoas mais vulneráveis em todo o mundo.

Mas, passado um ano, é altura de começar a ter a coragem para fazer as contas.

 

Ipse dixit.

Imagem de abertura e tabela original: © Unicef