Vivemos em tempos perigosos, especialmente porque muitas pessoas nem sequer se apercebem disso.
Escrevi no Facebook durante dez anos. Ninguém me obrigou, nunca ninguém me pagou para o fazer. Achei-o agradável e divertido. Depois também útil, por vezes até importante. Sempre houve regras, limites, por vezes bastante hipócritas, aborrecidas ou estúpidas, mas o objectivo era manter o diálogo civilizado. Agora, estão a ser feitas tentativas para impor uma linha editorial, o conteúdo incómodo está a ser silenciado e afirma-se que os pensamentos daqueles que escrevem podem ser avaliados e que pode-se decidir quais pensamentos estão “certos” e quais estão “errados”, quais pensamentos podem ser expressos e quais podem ser sancionados. É imposta a adesão ao pensamento único. Facebook costumava ser um lugar para expressar e discutir o pensamento alternativo, agora está a tornar-se rapidamente um lugar onde é estabelecido o que pensar, não muito diferente da televisão ou dos jornais. Já não serve para exprimir, serve para programar.
No entanto, esta bastardização do Facebook não condiciona como faz a televisão: faz muito pior. A televisão impõe conteúdos, interpretações da realidade a partir do exterior. Tu os recebes e a sua capilaridade torna-os muito poderosos no condicionamento, mas ainda assim podes rejeitá-los enquanto externos a ti. Facebook é feito dos “teus” pensamentos, dos pensamentos dos teus “amigos”. Condicionar estas expressões não é apenas impor um ponto de vista: é impor qual deve ser o teu ponto de vista. A censura no Facebook não é sobre os pensamentos de outras pessoas, mas sim sobre os teus pensamentos. A razão pela qual as redes sociais eram uma oportunidade de liberdade é precisamente a razão pela qual hoje estão a tornar-se a mais subtil e pérfida das prisões: estão a ser usadas para reprogramar directamente “o que tu exprimes”.
Se muitos se perdem com a teoria, eis um exemplo simples: no Facebook é agora proibido o uso de algumas palavras específicas. Algumas delas são palavras “más e feias”, usadas de forma depreciativa para referir-se a pessoas homossexuais ou pessoas de cor. Tu dizes: o que há de errado com estas palavras serem banidas de uma rede social? Desta forma deixamos de espalha-las e de usa-las. Verdadeiro, mas quem decidiu isso? A diferença entre deixar de usar certas palavras e ser forçado a não as usar é enorme. No primeiro caso, entendemos o que estamos a fazer e decidimos o que fazer e o que não fazer. Há responsabilidade. No segundo caso somos treinados a não utilizar certas palavras. E a utilizar outras. É o que se faz com os animais: treino.
Mas para além das palavras “racistas”, agora também é proibido expressar conceitos “anti-científicos”, segundo a ideia de que quem decide “o que é científico ou anti-científico” é decidido por… outra pessoa. Ainda não está claro? A caça ao pensamento “socialmente perigoso” começou directamente na tua própria mente. Coisas para fazer que Goebbels tenha um orgasmo mesmo que defunto.
Para aqueles que ainda estão a lutar para lá chegar: as palavras que usamos decidem a percepção que nos formamos acerca do mundo dentro do qual vivemos e de nós próprios. Elas decidem em que tipo de mundo vivemos e quem somos. Poder impor quais palavras usar e quais não usar é impor directamente a ti “quem és”. E é exactamente isso que estão a fazer, aqui e agora.
Vivemos em tempos perigosos, especialmente porque muitas pessoas nem sequer se apercebem disso.