Já tínhamos falado do “caso Suécia“. É bom voltar a espreitar o assunto.
A Suécia é o único País da Europa que não impôs o bloqueio. Embora os vários Estados tenham implementado restrições de diferentes graus, a Suécia é um caso diferente. Enquanto aqui em Itália falamos com os outros através duma máscara ou dum painel de plexiglass, na Suécia bares, restaurantes e escolas nunca fecharam. O que o Governo fez foi, na sua maioria, recomendar que fosse mantida uma distância segura.
Neste momento, o número de mortes é superior ao dos vizinhos que implementaram o encerramento, a Dinamarca e a Noruega, mas inferior sobretudo (mas não só) aos valores dos Países mediterrânicos. A Suécia inclui no seu cálculo todas as mortes no País e não apenas as mortes hospitalares, o que pode dar alguma margem de interpretação quando se comparam os números com outros Países em termos de casos por milhão de habitantes e de mortos por milhão de habitantes.
Algumas comparações (dados WorldOMeter):
País | Casos/milhão hab. | Mortes/milhão hab. |
Suécia | 1.800 | 217 |
Luxemburgo | 5.928 | 136 |
Espanha | 4.786 | 490 |
Bélgica | 3.911 | 597 |
Irlanda | 3.759 | 215 |
Italia | 3.231 | 436 |
Portugal | 2.294 | 86 |
França | 2.474 | 346 |
Reino Unido | 2.186 | 299 |
Holanda | 2.170 | 257 |
Interessante notar, comparando estes valores com os fornecidos pela Organização Mundial de Saúde, como a Suécia ainda fique abaixo do valor médio de mortalidade por gripe sazonal, valor que a OMS indica como 309/milhão de hab. no período entre os anos de 2002 e de 2011 (a nível mundial, nesta altura a média da “pandemia” fica na casa de 26.1/milhão hab.).
O serviço de saúde sueco não tem sido esmagado como em muitos outros Países da Europa. “Sempre houve pelo menos 20% das camas de cuidados intensivos vazias e capazes de cuidar dos doentes da COVID-19”, afirmou o homem por detrás da estratégia sueca, Anders Tegnell. Numa entrevista com Nature, perante a pergunta “Em que se baseia a sua estratégia?” Tegnell responde:
É difícil falar da base científica de uma estratégia com este tipo de doença, porque não sabemos muito sobre ela e estamos a aprender dia após dia”. Fechar, bloquear, fechar fronteiras: nada tem, na minha opinião, uma base científica histórica. Examinámos alguns Países da União Europeia para ver se tinham publicado uma análise dos efeitos destas medidas antes do seu início e não vimos quase nenhuma. […] O grande debate que enfrentamos neste momento é sobre os lares para idosos, onde tivemos surtos muito infelizes de Coronavírus. Isto explica a taxa de mortalidade mais elevada na Suécia em comparação com os nossos vizinhos. A investigação está em curso, porque precisamos de descobrir quais as recomendações que não foram seguidas e porquê. É claro que estamos a entrar numa fase da epidemia em que veremos muitos mais casos nas próximas semanas, com mais pessoas nos cuidados intensivos, mas este é um País como qualquer outro. Em parte alguma da Europa a propagação abrandou significativamente.
Tom Britton, um professor de estatística que trabalha com o Serviço Nacional de Saúde sueco, afirma que metade da população de Estocolmo estará infectada até ao final de Maio, um número que rapidamente levaria a capital à “imunidade do rebanho”, o que não é o objectivo central da estratégia sueca, embora seria bem-vindo. Os dados desta investigação são muito diferentes dos cálculos efectuados pelo Imperial College London, cujo modelo afirma que, neste momento, apenas 2.5% da população está infectada, e a imunidade de rebanho distante. A discrepância dos modelos leva-nos a ver estas duas visões como duas apostas: se os dados dos suecos estivessem correctos, uma vez alcançada a imunidade do rebanho, assistiríamos a uma queda drástica do número de mortes, que há alguns dias atrás excedia o 2000.
Mas, segundo a Directora da agência de saúde pública sueca Karin Tegmark Wisell, o principal objectivo da estratégia não é a imunidade mas a protecção dos grupos de maior risco na sociedade, mantendo instituições como as escolas abertas, “embora a imunidade do rebanho ajudaria o desenvolvimento da Suécia”.
Embora algumas figuras públicas e académicas estejam preocupadas com o aumento do número de mortes e gostariam de ver uma linha mais semelhante à dos Países vizinhos, a maior parte das críticas, como explicou o antropólogo Robin Öberg, não é tanto no sentido de não ter havido um encerramento, mas no sentido das pessoas não estarem a seguir devidamente as práticas de distanciamento social:
É mais uma questão de controlo social horizontal do que de controlo vertical. Pelo que vi até agora, a estratégia sueca parece funcionar. O grande problema é que muitas casas de repouso para idosos têm casos de Coronavírus e ninguém compreende como isto pode acontecer. Estão a rastrear os contactos que tiveram, mas ainda não existem teorias válidas. É o grupo de maior risco e ainda não foram suficientemente protegidos.
Os vizinhos da Noruega fizeram o bloqueio total e, enquanto um relatório da semana passada mostrou a eficácia absoluta da sua estratégia, com apenas 1% da população infectada, um dos epidemiologistas mais eminentes daquele País afirmou que seria mais inteligente adoptar uma estratégia mais semelhante à da Suécia. Eiliv Lund, professor emérito da Universidade de Tromsø, disse ao jornal VG:
Há uma fraqueza na estratégia. Se tivéssemos feito o que os suecos fizeram, teríamos tido uma taxa de infecção mais elevada e, portanto, mais imunidade. O governo tinha muita fé na linha dura de “matar” o vírus. Acreditava-se que, se conseguíssemos trava-lo por um tempo suficiente, teria desaparecido, mas não podemos impedi-lo de entrar a partir do exterior. Teremos então de esperar por uma vacina ou um tratamento medicamentoso, mas se isso não acontecer, será muito dispendioso para a sociedade. Estamos apenas a adiar o problema.
Eis a situação na Suécia:
- Os bares, restaurantes e centros comerciais estão abertos.
- As escolas ainda estão abertas e os pais são obrigados a continuar a enviar os seus filhos para lá.
- O Governo pediu para não realizar viagens não essenciais.
- As pessoas são encorajadas a trabalhar em casa se puderem, a ficar em casa se não se sentirem bem, a manter alguma distância dos outros em público e a lavar as mãos regularmente.
- As pessoas com mais de 70 anos ou pertencentes a um grupo de alto risco são encorajadas a permanecer em casa.
- As únicas restrições são que as reuniões de mais de 50 pessoas são proibidas, os bares e restaurantes só podem servir clientes sentados para reduzir a lotação e as pessoas não podem visitar lares de idosos.
- O Parlamento sueco deu ao Governo o poder de introduzir rapidamente novas restrições, se necessário, mas estas ainda não tenham sido utilizadas.
Anders Tegnell afirmou que a probabilidade de encerramento diminui de dia para dia e a a sua agência sublinhou a eficácia das actuais restrições.
Pelo que: sem bloqueio, sem negar aos cidadãos os direitos constitucionais basilares, sem pôr de joelhos a economia nacional é possível combater a “pandemia” com óptimos resultados. A Suécia está a mostrar a melhor maneira para enfrentar uma vaga de “algo” que mata menos duma gripe. Por qual razão políticos e “especialistas” mundiais não tomam o exemplo? Porque não citam o exemplo da Suécia?
Ipse dixit.