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2021: o novo fim do mundo (com messias novinho em folha!)

Mais um fim do mundo. De vez em quando merecemos um: Nibiru, 2012, Elenin, etc. Desta vez alguns estudiosos afirmam que foi descoberto um código bíblico oculto, que conteria uma profecia iminente sobre o “fim do mundo” em 2021 (ou melhor, sobre o fim do actual sistema-mundo). E no coração desses códigos, escreve Henry Holloway no site inglês Keep The Faith, haveria também as inevitáveis previsões de Nostradamus, que nunca pode faltar. Sempre em 2021 a vinda do messias judeu. Nada menos.

A exegese bíblica tende a “desmantelar” o carácter profético do Antigo Testamento, demonstrando – com base na datação dos textos – que são invariavelmente profecias falsas, escritas pós-evento ou até manipuladas (muitas vezes com uma tradução errada). Mas não faltam os que estão prontos para ver, naqueles versos, também acontecimentos recentes, como a tragédia da Shoah ou mesmo os ataques de 11 de Setembro e a eleição de Donald Trump para a Casa Branca.

Neste caso, a chave para descodificar as mensagens encriptadas seria a ghematric-cabalistic, que permite reconstruir qualquer conteúdo escondido atribuindo valores numéricos precisos a cada palavra, ou melhor, a cada individual letra hebraica. Depois é só saltitar em diagonal pelo texto todo: com sorte é possível conseguir palavras com sentido.

A fazer manchetes, também no YouTube, é um venerável rabino, Matityahu Glazerson (aqui uma versão em espanhol, neste link o canal do rabino com todas as “descobertas”), segundo o qual a própria Torah (lida através da nova metodologia) revelaria o que está prestes a acontecer. “Usando o algoritmo de computador”, escreve Holloway, “o rabino Matityahu Glazerson afirma que o ‘fim dos tempos’ está marcado para 2021, após uma ‘contagem decrescente’ que começou em 2016”. Começou uma contagem regressiva? E ninguém avisou? Mau…

“O fim dos dias, para o judaísmo, anuncia a vinda do messias judeu que irá inaugurar o reino de Deus: ele irá governar durante a Era Messiânica, que verá o fim do mundo tal como o conhecemos”. Para o rabino, a fonte “reveladora” seria o Livro do Levítico. O testemunho de Glazerson foi também capturado no documentário Torah Codes dirigido pelo recentemente falecido Richard Shaw (podem procurar no Youtube a expressão “Torah Codes Richard Shaw”, material em inglês não falta): “O texto bíblico quase parece um código informático por causa da forma como foi escrito”, disse o cineasta. “Com os computadores de hoje, podemos descodificar alguns dos seus mistérios”.

Se o tal código misterioso tivesse sido descoberto, então seria simples apresentar outras profecias além daquela do “fim do mundo” e da vinda do messias. E de facto no artigo Holloway há uma: o Irão irá desenvolver a bomba atómica. Wow… ficamos boquiabertos: quem poderia ter imaginado? Só um código oculto na Bíblia.

A profecia principal, no entanto, é aquela acerca do tal Messias que, nas palavras do rabino, “acabará e queimará os inimigos de Israel”. Praticamente a maior parte da humanidade. “E então a paz e o sossego virão para o mundo inteiro”. Óbvio, já não estaria aqui quase ninguém…

Mas donde poderia surgir este messias? Não sabemos ao certo, mas um influente grupo israelita, o Regavim, que considera como iminente o aparecimento do “salvador do povo judeu”, denunciou a autarquia de Jerusalém após a descoberta de túneis e escavações (não autorizadas, segundo o Regavim) entre o subsolo da Igreja Católica da Dormição de Maria e o Monte Sião, onde estariam guardadas as relíquias de David, o lendário governante bíblico. A acusação é incrível: alguém gostaria de “clonar” os restos de David para “fabricar” geneticamente um novo messias.

Como afirmado antes, a Bíblia não apresenta profecias. No limite poderia ser discutida a Apocalipse de S. João que, todavia, é um texto excepcionalmente complexo, altamente simbólico e que, em boa parte, trata de acontecimentos da altura (I – II séc. d. C.). No Antigo Testamento nada de profecias. Porque não era aquela a função da Bíblia, sobretudo da versão mais antiga.

O Antigo Testamento é um relato, cujo papel é lembrar aos fieis (judaicos mas também cristãos e islâmicos) a Aliança entre o povo escolhido e o “deus” chamado Jeová. Mas a Aliança não era a primeira do género assim como Jeová não era o primeiro “Deus”: já tinha havido uma aliança mais antiga e mais importante porque estipulada entre o “Deus dos Deuses” e povo que “trouxe” a civilização entre a espécie humana. É esta aliança original que (em parte) está na base da Grande Obra; é nela que podemos encontrar as origens da União Europeia, por exemplo.

É por esta razão que é um erro ver como motor do mundo a “conspiração judaica” ou, ainda pior, aquela sionista. Que existem, sem dúvida, mas que não são determinantes, não tendo todo aquele poder que seria necessário para governar os destinos do planeta ao longo de milénios.

Portanto, este novo “fim do mundo” com tanto de messias incluído tem o mesmo valor dum Nibiru, duma profecia Maya ou dum cometa Elenin: bons para encher as páginas da informação alternativa e do Youtube, mas nada mais. A verdade é um pouco diferente e fala dum mundo inteiro sob o domínio da hipnose da emergência da Covid, utilizada para devastar a economia e suspender a democracia.

 

Ipse dixit.