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Uma ideia: França fora do Euro?

Mudanças na França.

Um partido a favor da saída do Euro acaba de derrotar um os dois maiores partidos de poder (o UMP, o partido de centro-direita também do ex-presidente Sarkozy) nas eleições autárquicas.

E não é apenas o Euro que está em jogo, mas também a ameaça de saída da União Europeia, um factor que estará em discussão no referendo da Grã-Bretanha (que, segundo o primeiro-ministro britânico D. Cameron, poderá irá concretiar-se em 2017).

A Frente Nacional de Marine Le Pen ganhou com 54% dos votos. Uma derrota difícil para os gaullistas do UMP. Isso enquanto os socialistas do presidente Hollande tinham sido derrotados logo no primeiro turno das eleições.

A Frente Nacional é actualmente o maior partido da França, com 24 % dos votos, de acordo com a mais recente sondagem do Ifop (Institut français d’opinion publique): algo nunca acontecido no pós- guerra. O UMP atinge 22%, os socialistas 21%.

A Europa, um engano

Marine Le Pen tinha sido clara: em caso de vitória na eleição presidencial, como primeiro acto o anuncio dum referendum sobre a saída da União Europeia:

Negociarei […], sem uma solução satisfatória, vou pedir a saída. A Europa é apenas um engano. Por um lado, há o enorme poder dos povos soberanos, por outro lado, um punhado de tecnocratas.

Uma saída imediata?

Sim, porque o Euro impede qualquer autonomia nas escolhas de política económica. A França não é um país que possa aceitar ordens de Bruxelas.

Neste caso, os técnicos seriam encarregados de planear um regresso ao Franco. Os líderes da Zona Euro teriam de enfrentar uma difícil decisão: colaborar com a França para definir a saída, coordenando a dissolução da união monetária, ou esperar uma inevitável confusão, uma autêntico quebra-cabeça.
Le Pen:

Não devemos ouvir as cereias. O Euro deixaria de existir na altura da nossa saída, esta é a nossa força. O que eles poderiam fazem? Enviar os tanques?

Os seus quatro pontos fundamentais para manter-se na União Europeia (lembramos: um País pode ser parte da União sem adoptar o Euro): saída do Euro, reintrodução dos controlos nas fronteiras, superioridade da lei francesa perante as leis da União e “patriotismo económico”, ou seja a possibilidade da França perseguir um “proteccionismo inteligente” para salvaguardar o bem-estar social.

Não posso imaginar uma política económica sem o controle da monetária.

O partido de Le Pen consegue os maiores sucessos eleitorais nas regiões tradicionalmente socialistas, o que evidencia como o sucesso da Frente não esteja limitado aos enclaves de Direita: de facto, aspira tornar-se uma força eleitoral capaz de representar a classe dos trabalhadores.

Ultrapassa os socialistas atacando os bancos e o capitalismo internacional. Recentemente, o partido recebeu nas suas fileiras Anna Rosso- Roig, um candidato do Partido Comunista nas eleições de 2012.

O estudo da École
Marine Le Pen

O plano de saída do Euro baseia-se nos estudos dos economistas da École des Hautes Etudes em Paris,
dirigido pelo professor Jacques Sapir.

Segundo as pesquisas, França, Espanha e Itália beneficiariam com uma saída do Euro, sendo capazes de recuperar imediatamente a competitividade no lado dos custos do trabalho, sem anos de declínio. Isso com a inflação da moeda nacional.

Na prática, o percurso inverso da Zona Euro, onde não é possível reduzir o valor da moeda e é necessário criar uma desvalorização interna, isto é, reduzir os salários. No entanto, a consequência é diminuir ainda mais a procura interna e deprimir a economia. Ver caso de Portugal…

A hipótese subjacente deste estudo é que os desequilíbrios entre a Europa do Norte e os Países do Sul da Europa chegaram a um ponto de não retorno. As tentativas de reduzi-los através de uma deflação dos salários e de cortes causaria o desemprego em massa e a perda de boa parte do aparato industrial.

O Professor Sapir argumenta que a melhor solução seria um desmantelamento do Euro com controles coordenados aos movimentos de capitais e com os bancos centrais empenhados a fazer converger as várias moedas nacionais para os valores desejados.

A campanha da Frente parece estar a funcionar. Apenas uma minoria dos eleitores ainda acredita que o partido seja uma “ameaça à democracia”. A Frente, com uma liderança feminina, já não é mais um partido machista.

Critica severamente Washington e a Nato, alegando para a França uma política apartidária num mundo multipolar, e acusa o partido UMP de ter vendido a alma da França à Europa e à hegemonia anglo-americana.:

De Gaulle tinha aspectos de esquerda e de direita. Nós somos a favor de ambos.

Deja-vu

Mas há razões ainda mais profundas.

A França tinha visto na União e no Euro a possibilidade de atingir um ponto de equilíbrio, uma ocasião para travar a hegemonia da Alemanha. É esta uma questão histórica, um objectivo perseguido há séculos. Agora, a União e sobretudo o Euro dependem basicamente das decisões de Berlim, e a França percebe que, mais uma vez, o plano fracassou..

Neste dias, a França está a sofrer a mesma lenta agonia e quando aceitou estoicamente a política deflacionária do primeiro-ministro Pierre Laval. A situação só foi temporariamente controlada. Mas em 1936 deflagrou com o apoio da Frente Popular, uma coligação de esquerda , e dos comunistas.

Portanto, um deja-vu.

A Frente Nacional tem agora um caminho aparentemente fácil até as próximas eleições europeias, em Maio de 2014. E não vão estar sozinhos, pois os euro-cépticos ameaçam o hemiciclo de Estrasburgo (é o caso do Movimento Cinco Estrelas italiano ou dos conservadores britânicos).

O prédio da Zona Euro range. E é só culpa do Euro e dos seus obtusos arquitectos.

Ipse dixit.

Fonte: The Telegraph