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França: as eleições pré-determinadas

Em França estão em curso as eleições legislativas. Os resultados do primeiro turno são os seguintes: Macron (Centro) 27.8% e LePen (Direita) 23.1% avançam para o segundo turno. Eliminados Mélenchon (Esquerda) 21.9%, Zemmour (extrema Direita) 7.1% e todos os restantes candidatos, nenhum dos quais alcançou o patamar de 5% dos votos.

Para já temos que realçar como o partido mais votado tenha sido aquele do não-voto: 45% dos eleitores não foi às urnas (-4.4% em relação às últimas eleições). Mas os órgãos de informação não se preocupam muito com isso é já preparam o terreno da segunda volta. Diário italiano La Repubblica:

Eleições francesas, as sondagens para o segundo turno (e porque é que Le Pen ainda pode ganhar). As primeiras sondagens e a análise dos fluxos eleitorais não condenam o candidato de extrema-direita, que chegou ao segundo turno. Mas em comparação com 2017, tudo é muito diferente

Não, não é “tudo muito diferente”. Aliás, é exactamente igual: Marie LePen não tem a mínima hipótese de ganhar. É uma questão matemática: os eleitores de Centro e Esquerda juntos representam a maioria dos votantes. Macron (Centro) e Mélenchon (Esquerda) juntos alcançam 49.7% das preferências. Ao somar Jadot (Verdes, 4.6%), Lassalle (Centro, 3.1%), Roussell (extrema Esquerda, 2.3%) e Hidalgo (Centro 1.7%) mais algumas outras migalhas, ultrapassamos tranquilamente 60% dos votos. Pelo que, a não ser que haja uma extremamente improvável abstenção em massa entre os votantes de Centro e de Esquerda, a vitória de Macron é coisa feita.

O que se está a observar agora é a tentativa por parte dos órgãos de comunicação de criar o “perigo fascista” que consiga atrair mais eleitores às urnas, de forma que Macron possa ser validado pelo maior número possível de eleitores. Porque a abstenção é um problema.

Quase metade dos jovens de 18-24 anos (42%) e 25-34 anos (46%) não votaram. Em termos de categorias socioprofissionais, um em cada três trabalhadores (33%) evitou as urnas. Além disso, Macron vence LePen no voto dos eleitores com mais de 60 anos, mas está atrás em todas as outras faixas etárias, dos 18 aos 59 anos.

Emmanuel Macron foi de longe o candidato mais escolhido pelos franceses satisfeitos com as suas vidas”: 37% dos votos entre os eleitores “bastante satisfeitos com as suas vidas”, 43% entre os eleitores “muito satisfeitos”. Pelo contrário, menos de 20% dos votos nestas categorias foram para Marine LePen ou Jean-Luc Mélenchon. No que respeita à origem social, Emmanuel Macron obteve os votos de mais de metade (53%) dos eleitores que se auto-identificaram como de origem rica ou privilegiada, e também lidera entre os eleitores que se auto-identificam como classe média, alta (38%) ou baixa (28%). Por outro lado, é precedido por Marine LePen e Jean-Luc Mélenchon entre os eleitores que afirmam pertencer às categorias populares ou desfavorecidas.

Não há uma divisão entre Esquerda, Centro e Direita: há uma separação entre quem goza dos resultados duma sociedade que explora e quem é explorado. E é importante realçar como estes últimos, os explorados, não escolhem o candidato de Esquerda mas são divididos de forma quase igual entre LePen (Direita) e Mélenchon (Esquerda). Mais uma prova de que a clássica divisão entre “proletariado” oprimido de Esquerda e “patrões” de Centro e Direita já não pode ser aplicada e faz cada vez menos sentido.

Todavia, o Centro ganha porque o sistema eleitoral é concebido explicitamente para favorecer os candidatos mais “tranquilizadores” e conservadores do Centro. Perante os “excessos” dos partidos mais “radicais” (com muitas aspas…), o eleitorado prefere sempre refugiar-se no porto calmo e sonolento de quem apresenta um bem conhecido discurso conciliante. Pelo que temos uma situação na qual a maioria dos (já escassos) eleitores votam para uma alternativa (LePen e Méchelon somam 45% dos preferências), mas o vencedor será o centrista Macron com 27.8% dos votos agora e a maioria no final do segundo turno.

Este é o sistema eleitoral “à francesa”, quanto de mais anti-democrático possa existir. Em França utiliza-se o sistema eleitoral de dois turnos, também conhecido como sistema maioritário, onde um candidato deve alcançar ou exceder a maioria absoluta (50% + 1) para ser eleito na primeira volta. Se nenhum candidato for bem sucedido, é utilizada uma segunda volta de votação. Para ser eleito na segunda volta, no sistema uninominal “ao estilo francês” é suficiente obter uma maioria relativa dos votos.

Este tipo de sistema eleitoral é muito problemático por diversas razões, a primeira das quais é a sua falta de justiça. Em geral, todos os sistemas favorecem os grandes partidos, mas isto é muito mais evidente nos sistemas maioritários como aquele francês, porque punem severamente as terceiras opções que, de facto, deixam simplesmente de existir.

Além disso, este sistema tende a encorajar os eleitores a votarem com sinceridade na primeira volta, enquanto na segunda votação prevalece um voto estratégico. No caso francês, como lembrado, os eleitores irão votar em Macron para evitar o “perigo fascista”. Pelo que, este sistema tende a recompensar os partidos de centro, cujos candidatos estão geralmente melhor colocados na segunda volta para atrair votos tanto da Direita como da Esquerda moderadas.

No caso da França, o resultado é o seguinte: no final do segundo turno o vencedor será Macron, o candidato que no primeiro turno tinha conseguido apenas 27.8% dos votos. Isso significa que a grande maioria dos eleitores franceses (72.2%), que não votou no candidato dos Rothschild e que tinha escolhido uma alternativa, terá uma posição minoritária no parlamento.

É um problema? Na verdade não. Suponhamos que na segunda volta, em 24 de Abril, a massa de abstencionista e de votos contrários franceses aproveitem a possibilidade de mudar o resultado final, votando em massa para Marie LePen. Uma hipótese totalmente improvável, como é óbvio. Mas se acontecesse: achamos que União Europeia, World Economic Forum e o sistema globalista todo aceitariam a escolha popular? Não: usariam a força máxima para esmagar o governo, criando uma situação de elevada tensão social, “escândalos” e “acidentes” vários que resultaria na impossibilidade de governar. Sempre que LePen decidisse ser fiel ao programa dela, o que ainda deve ser provado…

 

Ipse dixit.

Imagem: Lorie Shaull via Flickr Attribution 2.0 Generic (CC BY 2.0)