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Ucrânia: as incongruências da peça

O poder da mentira que se crê ser real perante o poder do real que se crê ser uma mentira.

 

Estou um pouco farto. Lamento pessoal mas a partir de hoje Informação Incorrecta não vai continuar a seguir a guerra na Ucrânia. No canal Telegram sim, pois é perfeito para isso, mas no blog não. A razão? Já disse: fartei-me.

A “operação especial”, o erro

Desde o início esta “operação especial” do Kremlin na Ucrânia não me convenceu muito. Os EUA gritavam há meses que Moscovo teria atacado, toda a imprensa ocidental já saboreava o rio de sangue provocado pelo ataque. O mesmo Kremlin continuava a negar. Nessas condições, a coisa melhor teria sido evitar qualquer “operação especial”, manter as tropas quentinhas nos quartéis, deixar que o Ocidente ficasse com um derrame de bílis à espera do nada. Além de que, como é supérfluo relembrar, desencadear uma guerra nunca é algo digno de louvor, bem pelo contrário.

Todo o contexto fazia pensar numa armadilha preparada pelos americanos para forçar a Rússia a causar um conflito e, eventualmente, explorar os problemas político-militares que teriam acabado por surgir. E tudo de graça, utilizando os ucranianos (e, em parte, os russos) como carne para o matadouro. Infelizmente, Moscovo aceitou a sugestão: um grande favor que a Rússia fez aos EUA e ao Ocidente todo.

Baixa intensidade?

As dimensões da invasão pareciam muito ambiciosas. Mas, ao mesmo tempo, as forças empregadas eram limitadas: não é preciso ser um analista militar para saber que uma força atacante, para ter uma boa probabilidade de sucesso, deve ser muito superior em número aos defensores, mesmo que tenha superioridade aérea (fundamental em qualquer guerra moderna). Uma regra que não foi respeitada nesta circunstância. Além disso, Moscovo continua a não utilizar as armas “topo de gama”, mas algo já visto e previsível (única excepção: o lançamento dum par de mísseis hipersónicos).

Mesmo a condução das operações foi desde o início bastante suave e relaxada, de “baixa intensidade”, sobretudo após as primeiras 48 horas. Faz sentido: os Russos estão a lutar contra um povo “irmão”, a ideia nunca foi aquela de provocar o máximo de danos possíveis, sobretudo entre os civis. Mas sempre guerra é: e, neste aspecto e dado que foi iniciada (indesculpável), quanto mais depressa for resolvida melhor é.

Gás?!?

Mas aqui começam as coisas esquisitas. O que temos testemunhado foi (e ainda é) a continuação do funcionamento de todas as (já escassas) infra-estruturas ucranianas: caminhos-de-ferro, estradas, televisão, internet, telemóveis, iluminação em quase todo o País, excepto onde os próprios ucranianos a impedem. Mesmo o gás continua a fluir através dos gasodutos ucranianos para Países que se declararam inimigos. Este último é um ponto muito significativo, já em tempos tinha dito que a continuação do fornecimento de gás a Países “inimigos” teria sido um dos aspectos mais importantes para verificar a “solidez” desta guerra. Aqui não posso que confirmar: a Rússia continua a fornecer gás àqueles Países que agora enviam armas contra os soldados russos. Ao mesmo tempo, os Países que recebem o gás russo continuam a pagar e a financiar a guerra na Ucrânia: tudo isso não sugere nada?

Mas tudo bem: Vladimir Putin tem a reputação de ser um estadista muito capaz e um bom estratega. Certamente deve saber muito melhor do que eu o que está a acontecer e quais são as decisões mais rentáveis. Por isso: em frente.

Tudo controlado

Dado que o que é transmitido pelos media ocidentais é quase tudo e só propaganda, e farto de ser sujeito a disparates vinte e quatro horas por dia, dirigi-me aos sites de analistas políticos e militares que costumam fazer um certo sentido, tais como The Saker ou South Front, adicionando também os meios de comunicação russos (via VPN), sabendo que também aí a propaganda não brinca. E o resumo do que encontrei tem sido: a evidente desaceleração das operações não é preocupante, é parte do plano, não é uma invasão tradicional mas uma “operação especial” (!!!), a forma de conduzir a guerra reflecte a situação no terreno, a intenção muito louvável é aquela de não fazer vítimas civis. Isso apesar da última tentativa no terreno para evitar vítimas civis ter provocado oito anos de bombardeamentos das mesmas, com dezenas de milhares de mortos.

Pelo que, tudo parecia fazer um certo sentido, com os nazis de Kiev em evidente dificuldade e uma guerra que, em teoria, deveria ter acabado de forma rápida. Afinal era isso que os analistas diziam. Quem sou eu para contradizer?

O acordo

Pessoalmente já tinha condenado a decisão de atacar a Ucrânia desde a primeira hora, confirmo quanto dito e não vou retomar o assunto. Mas agora a medida está cheia: li que haveria importantes passos em frente nas negociações com o governo nazi de Zelensky, algo que poderia em breve conduzir a um acordo de paz. “Genocídios” permitindo, pois é evidente a vontade de Washington de continuar no banquete.

Acordo de paz. Um acordo de paz com quem? Com aqueles nunca respeitaram os tratados de Minsk? Com quem continuou a bombardear partes do seu próprio povo durante oito anos? Com quem proibiu milhões de cidadãos de usar a língua materna deles? Com quem não passa dum fantoche que pede instruções à Washington antes de abrir boca? Quão fiáveis podem ser aquelas pessoas para um acordo?

…e os objectivos declarados

A ideia não era “desnazificar”? Lembramos que os objectivos declarados da “operação-invasão” eram:

  1. desmilitarização, desnazificação e neutralização da Ucrânia;
  2. reconhecimento da soberania russa sobre a Crimeia;
  3. reconhecimento da independência das repúblicas de Donetsk e Lugansk.

O que aconteceu aos objectivos? Afinal foi guerra para quê? É evidente que se por alguma razão não forem alcançados, a guerra deve ser considerada perdida e tudo o que foi feito até agora, incluindo as mortes, como inútil e mesmo prejudicial para os interesses da Rússia. Se for acordada uma paz porque o exército é incapaz de continuar, então é uma derrota militar; se for feito porque o equilíbrio político dentro do Kremlin mudou (e o papel de pessoas como Abramovich nas negociações pode levantar suspeitas), então poderia pensar-se em algo semelhante a traição. Mas a verdade é simples: os objectivos desta guerra não foram alcançados até agora, nenhum deles.

Qualquer sobrevivência do actual governo ucraniano, um fantoche dos americanos e nada mais, significaria a derrota militar e política da Rússia. A única coisa que poderia ser tratada com Zelensky é a sua rendição, por uma questão de coerência. Uma vez iniciada a guerra (algo que nunca deveria ser feito, independentemente de quem ataca ou das suas razões), só se pode perdê-la ou continua-la até conseguir os objectivos.

A peça

Infelizmente, cada dia que passa confirma que esta guerra é só uma peça encenada, não apenas por parte da Rússia. Uma guerra tanto para entreter o povo e para alcançar objectivos que não seria simpático divulgar.

A atitude sobretudo da Rússia (os EUA vivem de guerras) durante os últimos dias faz cada vez mais pensar nisso: a vontade não parece ser aquela de eliminar os nazis de Zelinsky mas sim aquela de criar uma espécie de “Afeganistão” no coração da Europa, um conflito destinado a continuar ao longo de muitos meses ou até anos. Uma zona de fractura semi-permanente que viabilizaria uma série de escolhas (por parte de ambos os lados) “devidas” e justificáveis só com um regime de emergência. Algo perfeito para a continuação de outra emergência, aquela da “pandemia”.

Obviamente posso sempre estar errado. Mas, até prova contrária, acho inútil continuar a falar de algo que de autêntico tem só os mortos, como já feito no caso da “pandemia”.

 

Ipse dixit.