Portugal volta a uma situação de calamidade com uma série de medidas que, mais uma vez, limitam as liberdades individuais. A declaração é acompanhada por um curto documento Pdf, que merece ser analisado.
Nas primeiras quatro páginas é repetido até a exaustão que “Graças ao sucesso da vacinação, estamos melhor do que outros países”, tudo acompanhado por gráficos. Portugal, por exemplo, tem 87.78% de pessoas vacinadas. Não é explicado se com uma ou duas doses, mas tudo bem. Nem fica muito claro por qual razão:
- Países como Espanha, Malta, Suécia ou Eslováquia vacinaram menos e têm menos internamentos (página 3);
- porque Malta, Dinamarca, Italia, Finlândia, Suécia ou Roménia têm menos vacinados e menos internamentos nos UCI (página 4);
- porque Países como Malta, Espanha, Dinamarca, Irlanda, França, Suécia ou Chipre têm menos vacinados e menos óbitos (página 5)
… mas ainda tudo bem, estes são apenas pormenores.
Nas sucessivas quatro páginas é novamente repetido ad nauseam que “Graças ao sucesso da vacinação, estamos melhor do que há um ano”. Portanto não pode haver dúvida: a vacinação foi um sucesso e não se discute mais disso.
Dado este sucesso, seria lícito esperar que a vida pudesse regressar à normalidade, acompanhada por indicadores que mostrassem os números deste sucesso. Mas não é isto que acontece. É exactamente o contrário.
Página 11: “Não obstante o sucesso da vacinação, estamos a entrar numa fase de maior risco” devido, como é explicado, a factores quais o crescimento da pandemia no resto da Europa, a proximidade do Inverno e a época de convívios familiares e festivos. Tudo isso não deveria ser um grande problema: a vacinação foi um sucesso. A pandemia cresce na Europa? Mas nós temos a maior taxa de vacinação! O Inverno? O que tem a ver com a Covid? Convívios e festas? Sim, mas 87.78% das pessoas são vacinadas, portanto…
Nas quatro páginas sucessivas: “A situação está a agravar–se”.
- Página 12: a matriz de risco piorou.
- Página 13: os internamentos aumentam
- Página 14: os internamento nos cuidados intensivos aumentam
- Página 15: os óbitos aumentam.
Pronto, já percebemos: são aqueles criminosos dos não vacinados. Verdadeiros miseráveis individualistas espalhadores de pragas, são eles que impedem um sucesso total da campanha da vacinação. Portanto, eis as medidas introduzidas que, como é claro, irão atingir prioritariamente os não vacinados: pelo contrário, os que receberam a vacina podem gozar de festividades normais, como é justo que seja.
- “Máscaras – Obrigatória em espaços fechados e todos os recintos não excecionados pela DGS” (página 19. Só uma nota: “Máscaras” é plural, “Obrigatória” é singular. Mas estes são médicos, não docentes de Português).
Portanto: máscara para todos. Ok, não é um grande esforço.
- “Certificado digital: Obrigatório no acesso a: Restaurantes, Estabelecimentos turísticos e alojamento local, Eventos com lugares marcados, Ginásios” (página 20)
Justo: sem o certificado fica-se de fora. Assim aprendem os não vacinados que não podem entrar nem com um teste feito na hora. Os vacinados, pelo contrário, podem entrar à vontade, sem testes e espalhar o vírus. Porque, como sabemos, um vacinado pode ser positivo e transmitir o vírus. Mas isso não parece ser um grande problema.
- “Testagem – Teste negativo obrigatório (mesmo para vacinados) no acesso a: Visitas a lares, Visitas a pacientes internados, em estabelecimentos de saúde, Grandes eventos sem lugares marcados ou em recintos improvisados e recintos desportivos, Discotecas e bares” (páginas 21)
Curioso: assim sabe-se que um vacinado pode ter Covid e transmiti-la. Então por qual razão nada de testes em restaurantes, estabelecimentos turísticos e alojamento local, eventos com lugares marcados e ginásios? A intenção é punir os não vacinados ou travar a propagação do vírus?
- Teste negativo obrigatório – para todos os voos que cheguem a Portugal Fronteiras, Sanções fortemente agravadas para as companhias de aviação (página 22)
Esta é uma medida que faz sentido na óptica da prevenção.
- Teletrabalho obrigatório – Semana de contenção de contactos, Recomeço das aulas a 10 de janeiro, Encerramento de discotecas (página 23)
Então vamos encerrar tudo só depois das festividades? Qual o sentido? Esta medida, eventualmente, deveria ter início antes do dia 24 de Dezembro e continuar até o dia 2 de Janeiro. Feita a partir do dia 2 do próximo ano evita a altura em que maior será a concentração das pessoas.
E por qual razão fechar os trabalhadores vacinados em casa entre 2 e 10 de Janeiro se entre 1 de Dezembro e 1 de Janeiro podem tranquilamente entrar em todos os espaços públicos sem um teste e espalhar alegremente o vírus ou ficar infectados?
Aliás, a pergunta com mais sentido seria: por qual razão fechar tudo aos vacinados também? A vacinação não foi um sucesso? Sim, foi: foi um sucesso, Portugal está entre os Países europeus que mais vacinaram, pelo que estamos de volta ao estado de calamidade para todos….
Ipse dixit.