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Moedas digitais: 100% seguras? Nem por isso…

Como será o dinheiro do futuro? Será digital, óbvio.

Com mais de 80% dos Bancos Centrais mundiais a estudar as moedas criptográficas, pesquisando, desenvolvendo, criando e mesmo implementando dinheiro digital do Banco Central (em inglês: central bank digital currency, CBDC), estamos a aproximar-nos dum ponto de viragem, uma guerra das critpomoedas da qual irá sair o novo domínio monetário global. Com boa paz do Dólar.

Nos EUA, o Presidente da Federal Reserve, Jerome Powell, rejeitou a ideia de que o Banco Central dos EUA possa implementar o Dólar digital. E dado que a coerência é tudo, a seguir abençoou o Dólar digital, garantindo o futuro da nova moeda da Federal Reserve, o FedCoin. Não podia ser diversamente: as elites tecnológicas e monetárias do M.I.T. e da Fed de Boston continuam com a Digital Currency Initiative (“Iniciativa de Moeda Digital”) para “apoiar o desenvolvimento o dinheiro digital e da tecnologia blockchain na América.

Entretanto, na Europa, o BCE (Banco Central Europeu) ainda não deu luz verde ao Euro digital, colocando o Velho Continente atrás da concorrência enquanto o governo britânico criou uma task force para estudar os possíveis sistemas Britcoin, tal como o Sveriges Riksbank (o banco central sueco) completou o seu protótipo e-Krona.

De todas as superpotências globais, no entanto, são os chineses que estão à frente. O Banco Popular da China concluiu o maior projecto de moeda digital até à data, aproximando-se da criação de um Yuan Digital ou Digital Currency Electronic Payment (DCEP, em chinês 数字货币电子支付)DCEP. No seu programa piloto, o Banco Central chinês distribuiu “envelopes vermelhos”, ou seja prendas sob forma de carteiras, com 200 Yuan digitais, a 50.000 cidadãos e planeiam emitir mais 6.2 milhões de DCEPs durante a festa Dragon Boat deste ano.

Ao mesmo tempo, as Bahamas tornaram-se o primeiro País a criar e implementar um CBDC em pleno funcionamento: o Banco Central das Bahamas introduziu o Sand Dollar, permitindo a consumidores e empresas comprar e vender bens e serviços em qualquer uma das mais de 700 ilhas das Bahamas (em colaboração com Mastercard).

Tudo isso é o futuro? É, sem dúvida. Richard Turrin, especialista em tecnologia financeira residente na China:

É a cola que mantém grande parte da minha vida aqui junta. Não há limites. Podes passar da conversa com os amigos à compra de bilhetes de avião e encomendar a entrega do café sem nunca sair da aplicação.

Um smartphone, uma aplicação e eis a moeda digital: porque as empresas por detrás destas aplicações, Alibaba e Tencent, têm o monopólio dos pagamentos digitais na China, sendo possível encontrar as suas plataformas em todas as lojas, em todos os websites e em todos os dispositivos. Não ter uma carteira digital para pagamentos significa acabar por viver “fora”. AliPay e WeChat: os duas “super-apps” dominantes que revolucionaram a forma de vida dos cidadãos chineses.

Como AliPay e WeChat continuam a tomar conta de todos os mercados na China, as potências do mundo ocidental começam também a vislumbrar a revolução no horizonte: a construção de um monopólio de pagamento digital é a chave para ganhar o futuro poder monetário e político. Quem criar o sistema de pagamento mais fácil de usar ganhará a maioria dos corações dos americanos e, sobretudo, e o dinheiro dele. China, EUA, depois será o resto do planeta.

Mas será que esta iminente “revolução” monetária resolverá os imensos défices e dívidas? Ou as enormes desigualdades na sociedade? De modo algum. Apenas alterará o meio de troca, não a arquitectura financeira subjacente ao sistema. A transição será completada com o grito de batalha “A moeda digital é segura!”. Segura? Seguríssima, absolutamente inviolável.

Ou isso ou talvez não. Porque se até recentemente as blockchains eram vistas como uma tecnologia “100% segura, agora as coisas estão a mudar. O que não é uma surpresa: inventem o melhor sistema de segurança possível e pouco depois alguém irá quebra-lo. A moeda digital não é uma excepção.

Os hackers conseguiram roubar em total quase 2 mil milhões de Dólares em moeda criptográfica desde 2017, atacando as vulnerabilidades das blockchains, como relata a MIT Technology Review. Lembramos o que é uma blockchain com as palavras da mágica Wikipedia (em alternativa é possível espreitar o artigo Blockchain, Ethereum e Bitcoin):

A blockchain (também conhecida como “o protocolo da confiança”) é uma tecnologia de registro distribuído que visa a descentralização como medida de segurança. São bases de registros e dados distribuídos e compartilhados que têm a função de criar um índice global para todas as transações que ocorrem em um determinado mercado. Funciona como um livro-razão, só que de forma pública, compartilhada e universal, que cria consenso e confiança na comunicação direta entre duas partes, ou seja, sem o intermédio de terceiros. Está constantemente crescendo à medida que novos blocos completos são adicionados a ela por um novo conjunto de registros. Os blocos são adicionados à blockchain de modo linear e cronológico. Cada nó – qualquer computador que conectado a essa rede tem a tarefa de validar e repassar transações – obtém uma cópia da blockchain após o ingresso na rede. A blockchain possui informação completa sobre endereços e saldos diretamente do bloco gênese até o bloco mais recentemente concluído.

A blockchain é vista como a principal inovação tecnológica do bitcoin visto que é a prova de todas as transações na rede.

Pelo que, “descentralização como medida de segurança”, “cria consenso e confiança”, “cada nó obtém uma cópia da blockchain”, “qualquer computador tem a tarefa de validar e repassar transações”, “a blockchain possui informação completa sobre endereços e saldos diretamente do bloco génese até o bloco mais recentemente concluído”. Honestamente: o que pode correr mal?

Num recente ataque, um hacker conseguiu ganhar o controlo sobre a rede da moeda Ethereum Classic e reescrever o histórico da transacção. Como resultado, o atacante foi capaz de “dobrar” a moeda criptográfica, retirando cerca de 1.1 milhões de Dólares. Afinal algo pode correr mal. porque as mesmas qualidades que tornam a tecnologia blockchain tão segura podem também ser a fonte de várias vulnerabilidades: para lembrar que, apesar da propaganda, as moedas criptográficas não estão isenta de problemas de segurança.

Ao ganhar cada vez mais poder computacional, os hackers conseguem defraudar outros utilizadores enviando-lhes pagamentos e depois reescrevendo o livro-mestre da blockchain existente para encobrir os seus rastros, como explica a MIT Technology Review. Este novo livro-mestre existe ao mesmo tempo daquele verdadeiro, num esquema conhecido como o “Ataque de 51%”. Embora esta seja uma operação extremamente cara quando se trata de moedas criptográficas populares, os custos são mais baixo quando se trata de moedas mais pequenas, por isso é lícito esperar muitos mais ataques “51%” no futuro.

Paralelamente há técnicas mais básicas, nas quais os piratas criptográficos atacam com phishing e malware que exploram alvos ingénuos que acabam por entregar as suas credenciais. Também os hackers são conhecidos por roubar as chaves das carteiras da moeda criptográfica, o local onde o saldo de alguém é armazenado na blockchain. Todavia, phishing, malware e roubo das chaves têm como alvo o utilizador, não a moeda em si, como nos ataques “51%”: neste último caso falamos de técnicas muito mais sofisticadas.

Em resposta a esta actividade criminosa estão a surgir cada vez mais empresas que afirmam poder tornar as blockchain mais seguras e à prova de hackers. Por exemplo, AnChain.AI usa a inteligência artificial para rastrear quaisquer transacções suspeitas num determinado livro-mestre e detectar actividade maliciosa. Mas à medida que as tecnologias das blockchains se tornam mais complexas, os hackers estão também a tornar-se mais conscientes das suas vulnerabilidades, roubando milhões.

 

Ipse dixit.