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Xi Jinping abre o Fórum Económico de Davos

Xi Jinping está de volta em Davos. O Presidente chinês não tinha participado no Fórum Económico Mundial durante quatro anos, ou seja, desde o discurso em 2017 que foi definido como um hino à globalização. Aquele discurso tinha sido proferido apenas alguns dias após a tomada de posse de Donald Trump na Casa Branca, e o recém Presidente tinha feito do desafio à China um cavalo de batalha da sua campanha eleitoral. Mas agora não há Trump, há ZomBiden. E Xi Jinping volta ao Fórum Económico Mundial, virtualmente (videoconferência), com um discurso de quase meia hora e intitulado “Que a tocha do multilateralismo ilumine o caminho para a humanidade“. Faz lembrar “Que a força este convosco”? Pois faz. Mas não há nada de divertido aqui: a globalização fica como cavalo de batalha de Pequim.

No discurso de abertura dos trabalhos em Davos, Xi Jinping argumenta que “o Coronavírus não deve ser uma desculpa para a desglobalização”. Começamos bem… Mas é assim: a China quer a globalização e isso tem que ficar claro. Só podemos imaginar os sorrisos na sala na Suíça: a China vai ser um óptimo aliado.

Continua o Presidente reforçando o papel das Nações Unidas: “A Carta das Nações Unidas é a norma básica e universalmente reconhecida que rege as relações entre Estados. Sem o direito internacional e regras internacionais que são formadas e reconhecidas pela comunidade global, o mundo pode voltar à lei da selva, e a consequência seria devastadora para a humanidade”. Supérfluo lembrar que a OMS é parte integrante das “regras internacionais”. Outros sorrisos, sem dúvida.

Depois Xi apresenta quatro objectivos:

1.reforçar a política macroeconómica para responder à “pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial”. Não “revolucionar”, “mudar”, “rever” mas “reforçar”: Pequim não quer que as regras mudem. O que não admira: foi com estas regras que conseguiu alcançar o actual poder económico e até ganhar uns trocos durante a “pandemia”.

2. “Abandonar preconceitos ideológicos e seguir um caminho de coexistência pacífica” porque “cada país é único em termos de história, cultura e sistema social” e “ninguém é melhor do que outro”. Leram bem: o Presidente do maior partido comunista mundial fala em “preconceitos ideológicos”. Seria como ouvir Lenine dizer que andam por aí demasiados comunistas.

3. “Colmatar o fosso entre nações em desenvolvimento e nações desenvolvidas”, assegurando que as primeiras sejam ajudadas pelas segundas. Pelo que é fácil imaginar que a partir de agora a China utilizará as imensas extensões de terra adquiridas nos outros Países para ajudar as populações locais. É uma boa notícia e estaremos a ver.

4. “Unir para combater os desafios globais” porque “nenhum problema global”, desde a crise económica às alterações climáticas, “pode ser resolvido por uma só nação”. Xi fala em “promover o desenvolvimento verde” e “implementar a Agenda para o Desenvolvimento Sustentável 2030”. Sim, aquela Agenda 2030, a mesma financiada por Rockefeller. Não podia faltar o apelo à união decisória e à questão climatérica.

Nesta altura na sala começam as primeiras cãibras nos músculos da cara: sorrir sempre dói. Mas não dá para parar: tempo ainda para lembrar que “devemos reforçar o G20 como o principal fórum para a governação económica global” (e paciência para os que ficarem de fora) e que “a China continuará a promover a liberalização e facilitação do comércio e do investimento”, que Pequim promoverá “um ambiente empresarial baseado nos princípios do mercado, regulado por lei e em conformidade com as normas internacionais, e libertaremos o potencial do enorme mercado chinês e da procura interna”.

Algo acerca do infame papel das multinacionais? Corrupção? Umas palavrinhas sobre as guerras ao redor do planeta, como no Yemen, ou sobre as novas ameaças de ZomBiden à Afeganistão (que até faz fronteira com a China)? Xi, diz algo, afinal és o Presidente dum partido comunista, não és? Nada, nem um pio: o que Xi oferece são “os princípios do mercado”. Dificilmente em Davos poderiam ter ouvido algo melhor.

Pelo que, a China indica claramente o caminho escolhido. Que, por acaso, é o mesmo caminho do Fórum Económico Global. Nenhuma novidade: Pequim continua a preparar o seu papel de “novo umbigo do mundo” seguindo a tabela de marcha.

Xi fala em “multilateralismo” à medida que pede o reforço das “regras do mercado” e até consegue ficar sério. Não repara na contradição? Aparentemente não: as regras do mercado nunca conseguiram construir um panorama democrático, sendo antes um elemento de divisão e prevaricador. Mas Xi não se ri porque a ideia faz sentido se tomarmos em conta o seu apelo para o reforço do G20 (que, lembramos, é um grupo formado pelos Ministros das Finanças e Chefes dos bancos centrais das 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia) e da ONU também. Ao fazer isso fica mais simples entender qual a visão do governo chinês: um multilateralismo em molho globalista, dominado por um grupo de Países “iluminados” e empenhados em enfrentar os desafios globais da diversidade, da emergência climática, da pobreza… Resumindo: uma governação global nas mãos de poucos. E quem são estes “poucos”? Os mais ricos. Olhem a novidade.

Mas onde é que já vimos isso? Ah, sim, agora lembro-me: nas páginas do World Economic Forum de Davos. Igualzinho, mesmas palavras. Pelo que: erra quem ficar apavorado com o “perigo comunista”. Não há nenhum perigo comunista para o futuro: há um projecto que já foi apresentado nestas páginas e que prevê a fusão e a exploração de duas ideologias até agora em aparentemente em contraposição: a ideologia liberal mais aquela socialista. Uma espécie de “bloco central” global, no qual Pequim já tem um lugar reservado. Xi foi até Davos só para lembrar que a China já fez a marcação.

 

Ipse dixit.