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A nova guerra de classes aos nossos bares

Artigo da autoria de Mick Hume, cronista da revista digital Inglesa, Spiked.

A última resposta do governo Britânico à crise do coronavírus fortalece aqueles que odeiam os pubs e se acham moralmente superiores.

As medidas anti-pub do reformulado regime de confinamento do governo do Reino Unido reflectem um outro tipo de sistema «em camadas»: uma guerra de classes contra o tipo de hospitalidade desfrutada pelas massas que bebem.

A exasperada chefe-executiva da UK Hospitality, Kate Nichols, declarou esta semana que:

«Não entendemos a justificação do tratamento especial no atendimento a certos pubs para este efeito».

Entre na fila, Kate (mas não no bar; serviço de mesa apenas com refeições adequadas, se houver).

Muitos questionaram porquê que os pubs foram duramente atingidos pelo sistema autoritário de novos níveis de medo do governo do Reino Unido, que entra em vigor na próxima semana.

Os pubs nas regiões de Nível 3 não terão permissão para abrir as suas portas, enquanto os de Nível 2 só poderão servir bebidas como parte de «refeições substanciais» (exemplo: almoço, jantar, refeição, ndt.) – mesmo para fora.

Isso, alerta a indústria, será uma sentença de morte para muitos «wet pubs» (pubs que só servem bebidas, ndt.) – ou seja, os mais comuns que tendem a vender mais cerveja do que filetes de peixe panado e cerveja – no período que antecede o Natal.

Os críticos pedem em vão por evidências que mostrem como essas medidas extraordinárias e persecutórias aos bares farão diferença na disseminação da Covid-19.

Dos conselheiros científicos que agora aparentemente conduzem a desastrosa política de «confinamento seguido de confinamento» de um governo Tory desnorteado e que observam esses meandros, não chega nenhuma resposta.

Você não precisa de ser um tipo excêntrico ou um negacionista do Covid, para ver o motivo pelo qual muitas autoridades se contentam em criticar dessa forma o sector da hospitalidade, porque esses elitistas odeiam pubs, e sempre odiaram.

Eles odeiam especialmente os «wet pubs» (pubs que só servem bebidas, ndt.) , onde a classe trabalhadora vai para o bar, bebe cerveja e festeja em conjunto.

O medo e a aversão à taberna refletem o medo e a aversão que os nossos governantes e superiores sentem em relação a grande parte das pessoas.

Como observei no Spiked de Março, perto do início da crise do coronavírus, «algumas dessas vozes exigindo o confinamento nunca gostaram de reuniões em massa, pubs barulhentos e viagens frequentes. Uma crise também pode servir como oportunidade.».

Nisto, como em outros lugares, a crise da Covid agiu como um catalisador para acelerar tendências já existentes na nossa sociedade.

Não, não, Boris e os melhores Tories vão insistir, nós amamos o pub, coração da antiga sociedade Britânica e tudo isso. Talvez seja assim, mas o tipo de hotelaria de que alguns deles podem desfrutar é muito diferente daquele preferido pelos normais frequentadores de pubs.

O jogo deles é bem evidente e demonstrado nos novos regulamentos do Nível 2, que determinam que a bebida só pode ser servida nos pubs que também ofereçam «refeições substanciais» (almoço, jantar, refeições, ndt.).

Menu de gastro-pub e uma boa garrafa de Gavi numa mesa à luz das velas?

Certamente, madame. Duas canecas de cerveja e um pacote de batatas fritas no bar?

Dá de frosques, amiga.

A Campanha pela Real Ale enumera quatro características definidoras de um pub tradicional britânico: é aberto ao público, serve cerveja ou sidra sem exigir o consumo de alimentos, possui áreas internas não preparadas para as refeições e permite a compra de bebidas no estabelecimento.

Com estes critérios, deixará de haver pubs com estas características na Inglaterra no futuro próximo.

A cervejaria Inglesa tem uma longa história, mas os pubs como os conhecemos realmente desenvolveram-se no Século XIX, junto com as classes trabalhadoras industriais que os frequentavam.

Tendo primeiro, procurado encorajar o consumo mais amplo de cerveja como uma alternativa saudável ao gim, mas por meio do Beerhouse Act de 1830, as autoridades rapidamente tentaram controlar o consumo de cerveja pelos trabalhadores.

De uma forma ou de outra, eles têm tentando fazer isso desde então.

Da Era Vitoriana em diante, o movimento de temperança anti-álcool deu ênfase à questão religiosa e moral contra a bebida demoníaca.

Hoje em dia, em linha com o declínio da fé Cristã e a medicalização do moralismo, aqueles que alertam sobre os perigos de beber tendem a confiar no argumento de saúde e segurança da sobriedade.

O uso da crise da Covid para fechar os bares para o bem da saúde pública encaixa-se na agenda da mesquinharia contemporânea.

Mas essas são apenas medidas temporárias, correcto? Mesmo que seja verdade, são muito más.

No entanto, devemos lembrar-nos das leis de licenciamento de «emergência» impostas para restringir o horário de funcionamento dos pubs na Grã-Bretanha durante a Primeira Guerra Mundial.

Essas regras temporárias duraram quase um século.

Mesmo quando o horário de licenciamento foi finalmente afrouxado pelo novo governo Trabalhista de Tony Blair em 2003, a intenção explícita era acalmar e higienizar os pubs criando uma «cultura de café de estilo continental» mais relaxada.

Não tendo alcançado esse objetivo por inteiro, o lobby que destrói os pubs tem procurado novas maneiras de tirar a espuma da nossa cerveja.

Para alguns em cargos importantes, o novo ataque por fases do governo ainda não foi longe o suficiente.

No Domingo, um membro do Grupo de Aconselhamento Científico em Emergências (Scientific Advisory Group on Emergencies pela sua sigla em inglês, ndt.) disse à Sky News que:

«Nos anos da Lei Seca, eles tentaram mudar o horário, eles tentaram dizer que você só poderia beber se tivesse a acompanhar uma refeição, mas todos eram muito criativos e encontravam maneiras de contornar isso. Medidas irrelevantes como horários para beber ou fechar os pubs simplesmente não são um mecanismo eficaz.»

A terrível palavra Proibição (Lei Seca, ndt.), o sistema fracassado sob o qual os EUA emendaram a sua constituição para proibir a venda legal de bebidas alcoólicas entre 1920 e 1933, pode agora voltar a ser debatido seriamente.

As autoridades estão sempre a expressar preocupação com o impacto potencial da crise do coronavírus no bem-estar social e na saúde mental do país.

Se fossem sérios, não estariam a travar uma guerra de classes contra os pubs que para muitos desempenham um papel importante em relação esses assuntos.

Sem dúvida que o desmancha-prazeres do SAGE (Scientific Advisory Group on Emergencies pela sua sigla em inglês, ndt.) está parcialmente certo, e muitos pubs e apostadores estarão de facto encontrando maneiras de contornar a nova repressão.

(A minha esposa e eu nos lembramos de como, em Manchester dos anos 1970, quando um dos poucos bares nocturnos recebeu ordens para vender comida para justificar a sua licença, eles começaram a distribuir à porta meio tomate para cada cliente.)

Mas mexer no sistema não é suficiente. Devemos assumir uma posição de princípio em defesa do pub em toda a sua glória encharcada de cerveja e às vezes sangrenta.

(Enquanto também se defende o direito de desfrutar de uma boa refeição e vinho conforme a sua preferência, obviamente).

Como o cervejeiro Sir Toby Belch diz ao hipócrita Malvolio na Noite de Reis de Shakespeare:

«Você acha que por ser virtuoso, não haverá mais bolos e cerveja?»

Ao que os idiotas actuais, que avançam sob a cobertura da crise do coronavírus, provavelmente responderiam:

«Não haverá mais cerveja para gente como você – e os bolos não constituem uma refeição substancial».

 

Artigo selecionado e traduzido por JF.

Fonte: Spiked