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Google e o computador quântico

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Nota 1: Para os Ouvintes que não gostam das músicas, lembro que o player tem os comandos necessários e suficientes para evitar a escuta:

E não é que na imagem inverti “Avançar” e “Atrás”? Bom, dá para entender, não é? As duas setas circulares são os controles: dá para ir na frente, atrás, 15 segundos de cada vez. Façam “clickclickclick” e a música está acabada. E depois é possível regular a velocidade de reprodução e até compartilhar com amigos, vizinhos, parentes próximos ou afastados.

Nota 2: para já não tive tempo de experimentar os tais programitos speech to text, pelo que hoje vou escrever o artigo e lê-lo no podcast. A partir de amanhã… speech to text para todos!

P.S.: obrigado Eu, vou experimentar 🙂

Google e o computador quântico

Um computador do Google alcançou a supremacia quântica. Ou assim parece. O anúncio assinado por um pesquisador da empresa, publicado pela primeira vez no site da NASA e depois removido, foi divulgado pelo diário Financial Times. E deve ser considerado como um marco real no campo da computação quântica. De facto, nenhuma máquina tinha ido tão longe até agora. O super computador do Google seria capaz, de acordo com os relatórios, de realizar cálculos com velocidades nunca antes vistas: em 3 minutos e 20 segundos executaria o que um computador avançado actual faria em 10 mil anos.

Mas o que é um computador quântico?

Há anos que Google, assim como IBM, Microsoft, Intel e outras grandes empresas de tecnologia, estão a trabalhar para construir computadores quânticos com cada vez mais altos desempenhos. São máquinas baseadas em arquitecturas completamente diferentes daquelas dos computadores clássicos. Os computadores tradicionais, de facto, são sistemas que funcionam através de bits. E o bit é um sistema de dois estados: não ou sim, falso ou verdadeiro, ou mais simplesmente 0 e 1. Todas as operações dum computador tradicional estão baseadas nesta lógica binária (chamada Álgebra Booleana), construída tendo como base dois algoritmos, estes 0 e 1.

Os computadores quânticos, por outro lado, são baseados em bits quânticos, chamados de qubits. Os qubits podem assumir qualquer valor entre 0 e 1, cada qubit pode assumir vários valores simultaneamente. Para ser um pouco mais técnico: um qubit pode estar simultaneamente nos dois estados 0 e 1, ou seja, estar ligado e desligado ao mesmo tempo, ou assumir todos os valores intermédios entre 0 e 1. Oito bits convencionais podem armazenar apenas uma das 256 combinações possíveis de 0 e 1, enquanto 8 qubits podem conter todas estas possibilidades ao mesmo tempo.

O que significa isso? Vamos fazer um exemplo: imaginem procurar a palavra “quantum” num documento. O computador clássico analisa linha por linha para procurar essa palavra. E encontra a palavra várias vezes ao longo do tempo. Com o computador quântico é como ter todas as páginas do documento na frente ao mesmo tempo, em diferentes “camadas”, o que reduz grandemente o tempo de pesquisa. Na prática, o computador quântico analisa as páginas do documento todas na mesma altura. Essa capacidade pode não ser fundamental na procura duma palavra num texto, mas é uma enorme mais valia se o problema a ser resolvido for mais complexo.

A arquitectura quântica, portanto, permite resolver uma série de problemas que os computadores clássicos não conseguem decifrar num período de tempo razoável.

Até hoje, no entanto, a dificuldade em manter o comportamento quântico dos qubits por um período utilizável (algo chamado de “tempo de coerência”) impediu que os pesquisadores utilizassem a aceleração quântica. Também por esse motivo, o anúncio do Google seria um recorde mundial.

No momento, não há muitos detalhes sobre qual cálculo o computador executou: sabemos que a empresa de Moutain View trabalha há muito tempo num dispositivo de 72 qubits chamado Bristlecone, com o qual espera alcançar a supremacia quântica. Mas, de acordo com o que o Financial Times escreve, o experimento vencedor foi realizado com um processador de 53 qubit com o nome de código Sycamore.

O anúncio do Google, no entanto, é bastante controverso. Numa entrevista ao Financial Times, Dario Gil, chefe de pesquisa da IBM, afirma que o que o Google alega está “errado”. O Sycamore não pode ser chamado de computador quântico, afirma o especialista da IBM, porque foi projectado para resolver um problema específico. De acordo com uma fonte anónima com a qual o FT falou, a equipe que redigiu o documento não gostou de utilizar o termo “supremacia quântica”.

Numa uma discussão no Twitter, o antigo desenvolvedor do Bitcoin, Peter Todd, aprofundou o assunto, argumentando que a mais recente criação de Google não representa uma ameaça à segurança do Bitcoin: segundo Todd, “Tudo isso não significa nada, porque esse sucesso de Google é apenas um tipo primitivo de computação quântica, que nem chega perto de quebrar a criptografia”. Além disso, tentar aumentar o tamanho de um dispositivo semelhante pode aumentar exponencialmente os custos: “É muito provável que, adicionando qubits, os custos aumentem de forma exponencial”.

Alguns dias após o sensacional anúncio (que, lembramos, mais tarde foi removido), Google não negou as notícias do Financial Times. No entanto, falta uma comunicação e a confirmação por parte da comunidade científica. A notícia deve ser recebida com um optimismo cauteloso, porque se for verdade que o computador quântico conseguiu resolver um problema de enorme complexidade em duzentos segundos, no entanto isso não significa que aquela máquina possa resolver todos os tipos de problemas.

Quanto às aplicações práticas, computadores deste tipo permitirão a descoberta de novos materiais e novos medicamentos, acelerarão a pesquisa em todos os campos e darão uma contribuição decisiva para o sequenciamento do DNA. Mas o mais provável é que os serviços quânticos se tornem acessíveis primeiro nas clouds, nas nuvem (aqueles espaços onde podemos guardar dados e que parecem estar acessíveis a qualquer momento e em qualquer lugar, simplesmente usando uma conexão Internet). Realidades como Amazon, Google e Microsoft poderão começar a explorar o computador quântico neste sentido.

Como? Imaginemos uma empresa que precise encontrar material para construir alguma coisa. Poderia ser um problema complexo a ser resolvido: encontrar o material perfeito para uma tarefa específica. A empresa pode não ter um computador quântico próprio, mas poderia conectar-se à nuvem, inserir os dados e fazer com que a computação quântica na nuvem processe tudo.

Para os consumidores comuns, de momento não há possibilidade de ter um computador quântico, também porque essas tecnologias são muito caras e funcionam em temperaturas próximas ao zero absoluto. Para aproveitar o potencial do computador quântico, em resumo, os mortais comuns terão que ser pacientes e esperar um pouco mais.

Na prática, embora esse teste possa ser considerado um recorde de classe mundial no mundo quântico, o tempo da utilização prática dos computadores quânticos ainda está longe. E há também outros problemas: o verdadeiro limite continua a ser o algo conhecido como “tempo de coerência” e, segundo os especialistas, serão precisos pelo menos dez anos até conseguir obter um sistema suficientemente poderoso para ser relevante para a nossa sociedade.

Os objectos quânticos são extremamente sensíveis: um campo magnético muito pequeno é suficiente para interferir com o estado deles. Além disso, para tirar proveito dessa máquina, são necessários software e linguagem completamente diferentes dos actuais, e hoje muito poucos desenvolvedores sabem onde colocar as mãos.

Em resumo, estamos num estágio inicial no desenvolvimento da computação quântica. Mas é por isso que é estratégico colocar as mãos nisso. E, aparentemente, o Google está na linha da frente. As possibilidades são enormes e, não acaso, Google actua nesse campo assim como outros gigantes tais como IBM, Microsoft e Intel, além das pesquisas como aquelas do MIT e de Harvard, na China, na Rússia e na União Europeia.

Estima-se que, a partir de 2025, 10% do PIB global (Produto Interno Bruto) será realizado usando a tecnologia blockchain. Uma blockchain é uma ferramenta que usa técnicas criptográficas para proteger as informações contra alterações não autorizadas. A tecnologia blockchain também é a base da operação de criptomoedas, incluindo o famoso Bitcoin. Os produtos baseados na tecnologia blockchain já são usados ​​em todos os lugares, no mundo financeiro, mas também no mundo da produção e da saúde, num mercado geral com um valor estimado de mais de 150 biliões de Dólares.

No entanto, dentro de alguns anos, os computadores quânticos poderiam forçar o código criptográfico usado pela blockchain, quebrar códigos para proteger comunicações e transacções financeiras na internet. Esse tipo de criptografia, amplamente utilizado, ficará instantaneamente obsoleto. Uma organização criminosa equipada com um computador quântico poderia falsificar qualquer assinatura digital e apropriar-se dos recursos digitais duma empresa ou dum indivíduo.

A maioria dos pesquisadores acredita que esse resultado requer um computador quântico cuja realização, actualmente, ainda está muito distante. No entanto, outros pesquisadores sugerem que isso poderia acontecer mais cedo do que o esperado, utilizando dispositivos de computação quântica com recursos mais limitados, como aqueles desenvolvidos pela IBM, Google e outros. Em teoria (e realçamos: em teoria), os computadores quânticos poderiam encontrar rapidamente soluções critpográficas permitindo que poucos utilizadores sabotem transacções ou acedam aos dados de biliões de utilizadores, públicos ou privados. O perigo é que, se nada for feito para actualizar os actuais protocolos de segurança, as criptomoedas e todos os dados sensíveis entrarão em colapso quando os computadores quânticos, com esses recursos, estiverem disponíveis.

É o caso de alarmar-se? Sim e não. Provavelmente não, porque felizmente, as tecnologias quânticas também oferece a oportunidade de melhorar a segurança e o desempenho da segurança. Como? Com a criptografia quântica, que é intrinsecamente segura. Essa tecnologia usa os estados de partículas únicas (os fótões) para codificar os bits e transmiti-los. Os princípios da mecânica quântica afirmam que os estados quânticos não podem ser copiados ou medidos sem serem alterados. Qualquer pessoa que deseje interceptar a transmissão seria, portanto, imediatamente descoberta.

A criptografia quântica pode ser usada para substituir assinaturas digitais clássicas e criptografar todas as comunicações ponto a ponto na rede blockchain. No entanto, a complexidade e o custo das redes criptográficas quânticas limitarão inicialmente a sua adopção. A pesquisa nesse sentido está a progredir rapidamente, mas ainda está longe da realização de um dispositivo comercial. Doutro lado, não podemos esquecer que também o computador quântico se encontra num estado inicial: as duas cosias procedem lado a lado.

Enquanto isso, as funções criptográficas “não revertíveis” devem se tornar um pouco mais resistentes a ataques. Como alternativa aos sistemas actuais, foram propostas algumas funções criptográficas mais resistentes que podem utilizar tanto computadores convencionais quanto aqueles quânticos. Embora não sejam completamente seguros, esses sistemas podem ser usados no hardware existente e economizar tempo.

E há mais um pormenor: utilizar tecnologias quânticas para comunicar, realizar cálculos, tornar a blockchain e a segurança mais eficiente requer a construção duma Internet quântica para conectar computadores quânticos por meio de uma rede de comunicação quântica. Mas a realização de uma Internet quântica é bastante distante.

Concluindo, o mundo das blockchains, da segurança online, deverá actualizar o seu software para usar funções criptográficas difíceis de reverter, tanto nos computadores tradicionais quanto nos quânticos. Mas antes da internet quântica é preciso lembrar que tudo isso requer investimentos importantes por parte dos governos centrais, pois falamos aqui de infraestruturas complexas, que hoje pertencem ao mundo da fantasia. Para já, melhor ficarmos preocupados com os métodos de espionagem clássicos, que são muitos e bem eficientes.

 

Ipse dixit.

Música: Homeworld Collapse by Arthur Vyncke | https://soundcloud.com/arthurvost, Music promoted by https://www.free-stock-music.com, Creative Commons Attribution-ShareAlike 3.0 Unported, https://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/deed.en_US