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NewsGuard, Wikipedia e a cruzada contra as Fake News

A empresa NewsGuard Technologies publicou um plug-in para browser (navegador), cujo nome é NewsGuard. Podemos instalar NewsGuard no nosso browser, seja ele Google Chrome, Microsoft Edge, Firefox, ou Safari e eis que as notícias que aparecem na internet serão avaliadas. NewsGuard, fundada pelos hebreus L. Gordon Crovitz (The Wall Street Journal) e Steven Brill (Newsweek), faz isso mesmo: determina a confiabilidade das notícias. Por exemplo: segundo NewsGuard, páginas como aquelas de Sputnik, RT, e Wikileaks não são de confiança. E já isso permite fazer uma boa avaliação da extensão avaliadora.

NewsGuard promete interessar-se de perto das próximas eleições europeias e, com um golpe de mestre, elegeu o fundador da Wikipedia no seio do seu conselho de administração, demonstrando assim que a psicopolítica neoliberal também tem sentido humor.

No seu esforço para “combater a desinformação online”, NewsGuard introduziu verdadeiros defensores da integridade jornalística no seu comité consultivo, como o ex-Secretário Geral da Nato, Anders Fogh Rasmussen, e agora o co-fundador da Wikipedia, Jimmy Wales. E falamos aqui daquela Wikipédia “enciclopédia que qualquer um pode editar”, onde propaganda e fraudes fundem-se, gerando teorias que fariam corar um qualquer tabloide do século XIX. Tanto para ter uma ideia: Wikipedia continua a apresentar na lista dos terroristas do 9/11 indivíduos que estão vivos e em boa saúde e que logo após os atentados fizeram questão de tomar publicamente as distâncias dos acontecimentos. Mas, como os nomes deles ainda fazem parte da versão oficial, Wikipedia continua a propo-los.

Para entender a filosofia contorcida de Wikipédia é preciso entrar no pensamento do seu fundador: Jimmy Wales é um auto-declarado Objectivista, algo que enfatiza a razão, o individualismo e o Capitalismo. Afirma que é inútil procurar a verdade absoluta, portanto, o melhor que podemos esperar é a “verificabilidade”. Isso é alcançado questionando as “fontes confiáveis” e endossando o consentimento, seja ele qual for.

Os editores são proibidos de tirar conclusões com base nas fontes que usam; se uma “fonte confiável” não menciona um facto, isso não aconteceu. Mas o que Wikipedia considera confiável? O mesmo tipo de publicações para as quais o NewsGuard atribui uma avaliação positiva: os principais órgãos de comunicação, os periódicos académicos, os textos de editores famosos e assim por diante.

Obviamente esta visão é facilmente alvo de críticas e é por isso que, em 2017, Wales deu luz verde ao projecto WikiTribune com o objectivo ambicioso de “consertar” as notícias, tentando combinar o modelo dos editores voluntários de Wikipedia com o dos media tradicionais. Previsivelmente, não funcionou e Wales demitiu todos. O projecto permaneceu em suspenso durante todo o ano passado, mas agora está a ser relançado como um “wiki de verificação dos factos”, nada menos. E agora Wales entra no conselho de uma empresa que deseja tornar o seu plugin de “verificação dos factos” uma componente de uso comum da Internet.

Paradoxalmente, Wales deveria ser o último indivíduo no planeta a ser chamado para uma organização “da verdade”. A disseminação por parte de Wikipedia de boatos que foram tornados “verdadeiros” é preocupante: vale a pena lembrar a falsa divindade australiana Jar’Edo Wens que permaneceu por quase dez anos como legítima voz da enciclopédia online antes de ser notada e cancelada em Março de 2015. Mas entretanto, Jar’Edo Wens tinha já sido incluída num livro de 2012 sobre o ateísmo, como parte de uma longa lista de “deuses e religiões da história que caíram em desgraça”.

Ou ainda, o caso do editor Edward Patrick Alva que havia falsificado os artigos de Wikipedia relativos a alguns crimes de estupro ocorridos em campus universitários, a fim de torná-los compatíveis com a versão dos eventos relatados em The Hunting Ground, filme que ele co-produziu. A mesma Wikipedia ficou anos envolvida na conspiração fictícia sobre um suposto conluio do governo russo com Donald Trump: ao procurar os termos sensíveis Seth Rich ou kompromat no Google, os primeiros resultados geralmente são aqueles de Wikipedia. E antes do relatório Mueller ter aniquilar a farsa do Russiagate, os editores de Wikipédia (incluindo vários administradores) estavam a pensar seriamente em impedir que os usuários “pró-Trump” pudesse modificar os artigos políticos: já tinham “limpado” um artigo sobre a “interferência russa nas eleições de 2016 nos EUA”, eliminando as fontes que contradiziam as alegações acerca dos hackers russos. Afinal, não eram fontes confiáveis aquelas que afirmavam ter havido​ conluio?

Poucos sabem que Wikipedia não proíbe a edição após pagamento, nem que Jimmy Wales a condena, desde que o editor admita ser pago (mas quantos lêem a página do perfil dele?). O pay-for-play é comum entre assessores do Congresso, agências de inteligência, membros do Parlamento, sionistas e Vaticano (para não mencionar o exército de fantoches corporativos).

Então, como explicar a iniciativa NewsGuard e a inclusão do chefe de Wikipedia?

O facto é que a confiança nos media caiu para os mínimos históricos depois da eleição de Trump e do referendo britânico em favor do Brexit, eventos ambos recebidos com consternação apocalíptica pela classe dominante. Este surto de “populismo” foi atribuído às fake news, “notícia falsa”, um fenómeno nascido nas mentes dos propagandistas dos mesmos media para explicar a tendência exasperante do povo de votar em algo que os media já tinham identificado como “o lado errado”. Embora as fake news sempre existiram e sempre constituíram um problema desde o advento da tipografia, somos agora informados que esse novo ataque de desinformação, obviamente obra de Putin & Amigos, poderia abalar as nossas frágeis democracias. Solução? Pôr de lado os órgãos de informação independente e voltar aos reconfortantes braços das “fontes confiáveis”.

O NewsGuard carrega o fardo de espalhar rótulos coloridos. “Bom” é verde, “Mau” é vermelho. Resultado? WikiLeaks tem a classificação “vermelha”, não confiável. Wikipedia? “Verde”.

Mais exemplos:

Estamos falados.

 

Ipse dixit.