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Armas: a CIA e o “supermercado” do Isis

Com anos de atraso, os mass-media (USA Today, Reuters, BuzzFeed…) publicam relatórios “exclusivos” que testemunham como um vasto arsenal militar enviado à Síria pela CIA em colaboração com aliados dos EUA alimentou o rápido crescimento do Isis.

Só agora que o Isis ficou derrotado, só agora que a revolta na Síria ficou controlada, só agora que a tentativa de criar um Estado Islâmico radical no coração do Médio Oriente falhou, só agora a verdade é dita. E porque só agora? Porque já ninguém está interessado nesta história: agora o que é trendy é seguir as falhas de Trump ou a revolta no Irão. Síria e Isis, com as centenas de milhares do mortos provocados, são um episódio que pode ser tranquilamente esquecido (como a guerra no Yemen: alguém sabe alguma coisa?): este tipo de notícia será ignorado pela maioria dos órgãos de informação.

BuzzFeed conta como o Isis possuía um poderoso míssil que a CIA comprou secretamente na Bulgária e começa por se referir a um novo relatório acerca de como o Estado Islâmico construiu o seu arsenal, com munições compradas pelos Estados Unidos e destinadas aos rebeldes sírios que acabaram nas mãos do grupo terrorista.

Também ao revelar a verdade com culpado atraso os media mentem: o “novo” relatório em questão é o trabalho duma organização independente, a Conflict Armament Research (CAR), que segue o caso há anos: o “novo” relatório é apenas o seguimento da pesquisa que teve início em 2013 e que até agora tinha sido alegremente ignorada.

A síntese do trabalho é a seguinte: a maioria dos sistemas de armas avançadas do Estado islâmico tinham sido adquirido pelos Estados Unidos e aliados.

A equipa de
especialistas em armas e munições do CAR, no terreno do Médio Oriente, analisou equipamentos recuperados do Isis e de outros grupos
terroristas no Iraque e na Síria. Graças aos números de série, números
de envio nas embalagens e outros dados confiáveis, os
especialistas do CAR determinar que:

O fornecimento de material por parte de Países estrangeiros – em particular Estados Unidos e Arábia Saudita – no contexto do conflito sírio permitiu indiretamente que o Isis obtivesse quantidades substanciais de munições anti-blindados. Essas armas incluem mísseis guiados antitanque e foguetes de cabeça dupla, projetados para penetrar armaduras defensivas modernas.

O estudo também revela que, num caso particular (a entrega de um sistema avançado de mísseis), o equipamento passou da intelligence dos EUA para os grupos “moderados” sírios e destes para o Isis em apenas dois meses.

Até a BBC dedica um especial de 30 minutos com o seguinte título: “Os jidahistas que tu pagas”. Espantem-se: existe um programa segredo dos EUA e da Arábia Saudita que alimentou o crescimento do Isis e de outros grupos terroristas ligados à Al-Qaeda.

São os mesmos media que até pouco tempo atrás ridicularizavam qualquer tentativa de pôr em conexão os EUA com os grupos terroristas do Califado. O Daily Beast (um milhão de visitas diárias, um dos sites de notícias e informações de mais rápido crescimento) em 2015 definia “conspiração” a ideia de que Washington estivesse ligada aos extremistas islâmicos. E isso não obstante já no mesmo ano The Guardian olhasse com interesse aos “estranhos” relatórios não apenas do CAR.

E a propósito: voltemos ao relatório destes dias.  
O documento é fruto de anos de investigações no terreno e que produziu 40.000 objectos militares recuperados do Isis. As conclusões são exaustivas e irrefutáveis. O longo relatório confirma o que o ex-espião (MI6) e diplomata britânico Alastair Crooke tinha já afirmado: a CIA tinha estabelecido uma espécie de “supermercado” para os jidahistas, de acesso simples e imediato. Numa entrevista de 2015, Crooke salientava que “o Ocidente não entrega armas directamente à Al-Qaeda ou mesmo ao Isis, mas o sistema que construiu tem exactamente esse propósito”.

Isso permite que ainda hoje os órgãos de informação oficiais desvalorizem o significado da notícia,  enfatizando aspectos como “deficiências na supervisão e na regulamentação” e, ao mesmo tempo, frisando a natureza “acidental” do facto de que os mísseis fornecidos pelos EUA tenham “acabado” nas mãos dos terroristas do Isis.

Pegamos na notícia de BuzzFeed acerca do relatório do CAR:

Um míssil anti-tanque de controle remoto acabou nas mãos dos terroristas do Isis menos de dois meses após o governo dos Estados Unidos tê-lo comprado, no final de 2015, o que destaca as fraquezas da supervisão e da regulamentação do programa americano de armas secretas de acordo com as informações publicadas na Quinta-feira pelo grupo de vigilância das armas do CAR.

Não é bem assim: um míssil anti-tanque não “acaba” nas mãos do Isis, não é um telemóvel caído do bolso. E não é um problema de “supervisão e regulamentação”: ou temos de acreditar que ao longo dos anos o exército dos EUA “perdeu” milhares de valiosas peças (todas “acabadas” nas mãos do Califado) só por distração?

Não é credível também porque, sempre em 2015, o ex-chefe da intelligence do Pentágono, o General Michael Flynn, avisava aos microfones de Al-Jazeera que as armas dos EUA na Síria estavam a transitar para as mãos de Isis, Al-Qaeda e de outros jihadistas. Pelo que, os serviços secretos americanos sabiam muito bem o que se estava a passar.

O que CIA e outras agências de intelligence fizeram perante este aviso? Continuaram a fornecer armar aos “rebeldes” da Síria, continuaram a reforçar as milícias do Isis. Continuaram naquela que segundo o mesmo General Flynn era uma “decisão intencional”.

Isis & drones

Entretanto, no passado Sábado (dia 6 de Janeiro), os russos frustraram um maciço ataque de 13 drones armados contra a base naval russa em Tartus e contra a base aérea de Hmeymim (na Síria).

Seis desses drones foram travados eletronicamente ao interagir com o sistema de navegação, os outros 7 foram derrubados com o Pantsir-S1 (sistema antiaéreo com mísseis e artilharia). Estes drones estão equipados com sistemas de GPS de última geração, bombas e têm um alcance de 100 quilómetros.

Seguindo o especialista em armamentos Igor Korotchenko:

Podemos dizer que esta é uma nova página na história do terrorismo internacional. Vale a pena notar que os drones partiram de longe.

Acerca da origem destes drones:

É bastante claro que, por conta própria e sem assistência, é improvável que os terroristas possam organizar um bombardeio maciço com drones equipados com explosivos artesanais, o mecanismo de desprendimento destas mini-bombas não pode ser improvisado.

Conclusão: “só poderia ser obtido dum País com altas capacidades tecnológicas”.
O supermercado continua aberto.

Ipse dixit.

Fontes: Conflict Armament Research – Weapons of the Islamic State (ficheiro Pdf, Inglês), BuzzFeed, The Guardian, Daily Beast, BBC, Zero Hedge, Foreing Policy Journal, Voci dall’Estero, Sputnik