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Dilma e a hora de Pavlov

Estava a escrever isso como resposta ao artigo Copa: os dentes de Dilma, depois pensei que isso afinal pode ser o começo dum discurso diferente.

Dilma ou não Dilma?
Tanto faz.

É perfeitamente inútil defender perante mim qualquer ideologia ou cor política: felizmente ultrapassei esta fase e hoje posso observar os vários actores políticos com o mesmo afastamento. Isso, que fique claro, não tem nada a ver com a inteligência ou as capacidades duma pessoa; acho serem mais as experiências que moldam neste caso.

No caso de Dilma e, como diz o amigo Cara Pálida:

Caro Max a tua fonte de informação não precisava estar no Perú e
escrever em italiano e posteriormente fazeres a tradução para o
português. Quanto trabalho, hiperbólico. Tu escreve e lê em português,
bastaria visitar os blogs brasileiros, temos milhares e de todos os
matizes e para todos os gostos.

Justo: mas assim não teria sido possível propor aos Leitores Brasileiros uma visão do Brasil de quem está “fora” dele. Visitar blogues brasileiros? É o que faço todos os dias (inclusive há blogues brasileiros que republicam quanto escrito aqui). Mas a ideia de base era outra.

não se pode julgar um governo por conta de um evento esportivo e
fazer disso argumento para justificar a endêmica pobreza do Brasil,cujo
governo nos últimos onze anos fez o “milagre” de tirar milhões de
brasileiros da extrema pobreza, ainda que tendo que conviver com um
sistema capitalista selvagem que privilegia o capital sobre o ser
humano.

Não acho que a subida dos indicadores económicos seja um bom sistema para medir a bondade dum governo. Se assim fosse, deveria ser necessário reavaliar pessoas que no passado tiveram o poder e fizeram milagres também. Um nome? Adolf Hitler. É óbvio que seria absurda qualquer comparação com Dilma, mas não podemos esquecer que Hitler pegou num País de miseráveis e tornou-o uma potência económica no prazo de poucos anos. Mussolini também fez algo parecido.

Onde quero chegar com isso? Simples. Acho que é como crescer um filho: o que desejamos deixar ao nosso filho? Uma enorme riqueza, para que não tenha problemas no futuro? Eu acho que não: eu gostaria muito, infinitamente mais deixar ao meu filho os instrumentos para que ele possa escolher, construir a sua própria fortuna, entender como é e como funciona o Mundo, o Homem. Os instrumentos para que possa ter consciência de quem ele é, quais os seus reais desejos e como realiza-los. Ou, pelo menos, tentar realiza-los.

Esta é uma herança, a melhor que seja possível deixar, a única com um sentido..
O dinheiro? Valha-me Deus. O dinheiro.

É por isso que não entendo a Copa. Será uma Copa bonita? Já disse, acredito que sim. Mas importa?
A razão pela qual publiquei a reflexão não minha é outra.
 

A razão

É suficiente criticar Dilma (mas nem tanto) para ter o espaço dos comentários cheio de pessoas que defendem, justificam , explicam. Na altura em que escrevo, ainda ninguém teve o bom gosto de tratar do mesmo assunto do artigo: as favelas. Não, preferem vir aqui e defender Dilma, a honra de Dilma. É um gesto nobre, que fique claro: mas não é disto que o artigo falava.

Nem por um segundo passou na mente dos Leitores algo do tipo “Mas olha este filho da …. de Max que, mais uma vez, provoca os Leitores do Brasil”. Faço isso há quatro anos, tal como costumava fazer com os Leitores Portugueses (depois fartei-me: não dá gozo ser inteligentes em Portugal). E a resposta é sempre a mesma: levantam-se os escudos para defender. É como uma reacção de Pavlov.

Quatro anos a tentar explicar porque não acredito nos partidos, porque as ideologias falharam, porque o que conta nesta sociedade não são as bandeiras mas os cheques dos bancos. Aplausos, bravo Max, isso sim que é falar.

Depois meia palavrinha contra Dilma? Então passar de bestial para besta é um segundo.
A vitória de Pavlov.

O que tentei fazer entender muitas vezes é que a mais valia deste blog não é o que eu penso ou o último artigo sobre o Bilderberg, estes são disparates que cada um pode escrever. A mais valia deste blog é o que pode transmitir, e nisso o meu papel nem é tão relevante.

A Europa é um continente ainda muitas vezes mais rico do que a América do Sul, mas o que conta é que está mais velho, já passou pelas mesmas experiências que o Brasil enfrenta hoje. Assim como os Estados Unidos são o futuro da Europa (com um desfasamento de 15-20 anos), a Europa é o futuro da América do Sul. Atenção: não falo aqui do aspecto económico, falo das dinâmicas sociais.

Isso não autoriza ninguém da Europa a dar lições acerca da América do Sul: mas permite que Vocês, os Brasileiros, possam desfrutar as nossas experiências para tentar melhorar o vosso futuro, por exemplo evitando os mesmos erros. Quantas vezes atiro para o meio do artigo a frase (“porque afinal é assim que funciona em todos os lados, não apenas aqui” (mais ou menos com estas palavras)? O que significa isso?

Ainda Cara Pálida (peço desculpa por tomar sempre ele como exemplo, nada de pessoal!):

Bem sabe que o problema não é a copa do mundo, o problema é
macro-econômico, as mazelas daqui estão replicando aí. Enquanto a Banca
ditar na política não haverá solução tanto para nós brasileiros como
para os queridos europeus.

Exacto. Poucos entre nós gostam da globalização, mas todos vivemos nela, esta é a realidade. Há um padrão, muito claro e definido, que juntos descortinámos (e nem todo) ao longo do tempo. É um padrão que não respeita língua, cor da pele ou ideologia política: é um padrão transversal e por isso excepcionalmente perigoso e eficaz. Se ainda raciocinam em termos de “bons dum lado” e “maus do outro”, então é triste mas tenho que avisar: erraram de blog.

Por razões económicas e históricas, o padrão começou a ser implementado na América do Norte, depois chegou no Velho Continente e agora observa a Ásia e a América do Sul. E, mais uma vez: atenção, porque não estamos a falar apenas dum padrão económico. É algo muito mais complexo, que parte da economia para depois abranger toda a nossa sociedade, inclusive a nossa maneira de pensar.

Quatro anos depois de ter começado, publico um artigo (não meu) que enfrenta um problema real (podem corrigir-me se acham o caso: existem as favelas ou é apenas a imaginação de quem mora fora do Brasil? Há confrontos por causa da Copa ou é só a vontade de criticar a Grande Dilma?) e lá vamos outra vez. Pavlov.

Um gajo aqui espera “será que depois de tantos escritos, por uma vez, não haverá a defesa ideológica”? Será que alguém consegue afastar-se das bandeiras e observar a realidade com os olhos da curiosidade?

Nada.
Critiquei Dilma. Tive a ousadia de escrever algumas linhas que não concordam com quanto estabelecido pelo PT. Horror. Em defesa, já, formação quadrada para defender a nossa bandeira, este é um ataque (e dum Europeu, imaginem!).
Pavlov.

Admito: o objectivo deste blog falhou. E como sou eu que aqui trata dos artigos, é um falhanço todo meu. Paciência, há coisas piores na vida, não é? A fasquia era muito elevada, provavelmente demais para um simples blogueiro. Nisso sim, reconheço ter sido arrogante: pensava fosse possível reunir um grupo de pessoas com as quais não falar apenas para defender esta ou aquela ideologia, mas para tentar olhar para o mundo de forma diferente.

Algumas pessoas receberam a mensagem ou já estavam na mesma onda (e, em qualquer caso, agradeço-as, profundamente), outras (a maioria) nem por isso.

Realçar os erros, as falhas de quem está no poder, sem abrandar perante “um dos nossos”, porque eu não sou assim e espero que Vocês não sejam assim também (erro!). E tentar individuar as possíveis soluções. Não para serem implementadas já, até eu percebo que isso seria demais, mas porque cedo ou tarde este blog irá fechar e, analogamente ao exemplo do filho, o melhor que pode deixar não é repetir vezes sem conta quanto afirmado pelos partidos ou pelos apoiantes do partido: é deixar a curiosidade.

Curiosidade que significa olhar para tudo e para todos à procura duma verdade, duma explicação, dum padrão, para não ficar presos a uma ideologia e continuar a dividir. Porque já sabemos quem ganha com as divisões.

Ontem encontrei as reflexões do italiano que mora no Peru, li e pensei “vamos fazer o teste de Pavlov”. Após este tempo todo, bem sei para que lado “pende” a maioria dos Leitores, apesar de ser este um blog totalmente apolítico (e sou mesmo, acreditem!). Infelizmente funcionou mais uma vez. E, tipo Nostradamus, posso já antecipar outra consequência: o blog vai perder Leitores ao longo dos próximos dois dias.
Pavlov.

Voltarei a fazer isso no futuro e, fiquem descansados, continuará mais uma vez.
É sempre a hora de Pavlov.

Bom fim de semana para os Leitores.

Ipse Dilma!