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O que é a homossexualidade? – Parte I

Após o artigo anterior e, sobretudo, os polémicos comentários relativos à homossexualidade, lembrei que até hoje nunca foi tratada neste blog a questão do que é um relacionamento gay e, mais no geral, a história da homossexualidade.

Estou consciente que um tal artigo irá desencadear as reacções indesejadas por parte de pessoas histéricas e/ou limitadas; mas não é para estas pessoas que o artigo é pensado.

E, dado que prevenir é melhor do que curar, lembro que desta vez a censura será aplicada com “tolerância zero”, pois estou farto de idiotas (não é Luciano?): perante a primeira ofensa, “zac!”, o comentário desaparece.

Ficam de fora assuntos como o casamento gay ou a adopção por parte de casais homossexuais, pois não são estes o tema principal e o risco seria de perder de vista o verdadeiro objectivo: falar da homossexualidade, da sua história, de como desenvolveu-se ao longo das épocas.
Também não é abrangido neste artigo o assunto do hermafroditismo.

Nota: as imagens forma ligeiramente modificadas para não ofender as minorias, incluídas aquela dos porquinhos.

A biologia

O Homem é um mamífero, e como tal encontra-se dividido em dois géneros: o masculino e o feminino. Esta diferenciação é necessária para que seja possível a reprodução, com a união entre um elemento macho e um fêmea. Sendo a reprodução e a consequente perpetração da espécie o fim último de qualquer entidade biológica, neste aspecto a homossexualidade representa uma anormalidade.

Entender isso é simples:

Esta é uma realidade que não pode ser posta em causa e quem pensar o contrário ou tem sérios
problemas psicológicos ou é oriundo dum outro planeta.

Todavia o homem não é apenas uma entidade biológica: há algo que diversifica uma bactéria dum ser humano (pelo menos, a maioria deles). Sem este “algo” não haveria a homossexualidade (já viram um gay pride de bactérias?), verdade, mas também a música, a poesia, a engenharia, a pintura…

Resumindo: o Homem é, na maior parte dos casos, algo mais do que uma bactéria e não pode ser julgado apenas como entidade biológica que tem como fim só a reprodução.

Então, se desejamos entender o que é a homossexualidade, temos que ir além disso.

A história

O assunto “reprodução” é importante para compreender as razões pelas quais as grandes religiões tradicionais proíbem o relacionamento homossexual. Podemos ler um texto sagrado de duas formas:

  1. na óptica religiosa
  2. na óptica racional

A óptica religiosa exclui qualquer tipo de debate: “Deus quis assim porque sim e nós só temos que obedecer”. Não há mais que possa ser dito.

Do ponto de vista racional, pelo contrário, o discurso é bem mais rico e articulado.

As “recomendações” dos textos sagrados muitas vezes têm origem em precisas necessidades do contexto histórico no qual foram escritos. Exemplo clássico é a proibição de comer carne de porco contida no Alcorão: Maomé não tinha nada contra os porcos, animais simpáticos e espirituosos, mas sabia que a gordura da carne pode provocar problemas no clima quente dos Países árabes.

Nem a Bíblia foge a estas regras. A proibição de práticas homossexuais deve ser vista como necessidade de aumentar o número de indivíduos numa altura em que não havia problemas de super-população (pelo contrário). Se este argumento pode soar estranho, lembramos que ainda no início do século XX os regimes fascistas incentivavam as famílias a ter mais filhos, segundo a equação “mais braços = mais trabalho = mais riqueza” (ou “mais homens = mais soldados”).

A sodomia representava um acto sexual não finalizado à procriação, portanto era condenado mesmo que não estivesse relacionado com acto entre pessoas do mesmo sexo: a sodomia entre um homem e uma mulher, por exemplo, ainda no século XVIII era punida com a morte. Segundo Tomás de Aquino, a sexo anal é o principal de todos os pecados.

Também não podemos esquecer que tanto a religião cristã, como a árabe ou a hebraica, defendem uma sociedade patriarcal, onde é o homem o elemento mais importante da família. A homossexualidade, portanto, representava uma ameaça contra este tipo de visão (neste caso o papel do homem era”diminuído”) e tinha que ser condenada.

A Antiga Grécia

Mas qual a situação nas sociedades onde a religião não tinha uma presença tão dominante?

É dito, por exemplo, que na Grécia a homossexualidade era considerada “normal”. Isso é falso: trata-se dum mito criado pelas comunidades gays, para justificar as raízes históricas da homossexualidade.

Pergunta: se na Antiga Grécia a homossexualidade era “normal”, como é que não temos registos de casamentos gays?

Na verdade a situação era diferente e é preciso distinguir entre pederastia pedagógica e a homossexualidade.

A pederastia pedagógica era o relacionamento entre dois elementos machos com idades diferentes: usualmente, era um relacionamento mestre (mais velho) e discípulo (um adolescente, desde os 12 anos). Actualmente, o termo “pederastia” implica o abuso de menores, mas o direito da altura  não reconhecia o consentimento e a idade como factores fundamentais num relacionamento sexual.

A pederastia grega tinha finalidades pedagógicas e mirava a transmitir aos mais jovens uma bagagem cultural para poder entrar no mundo dos adultos. No caso das Academias, a pederastia era ainda mais ligada ao aspecto cultural. O sexo era permitido mas não em todos os casos, variando as regras de cidade em cidade. Em qualquer caso, a sodomia era excluída e o relacionamento interrompia-se uma vez o discípulo ter alcançado a maturidade.

Na verdade, fora da pederastia pedagógica, a homossexualidade era recusada. Para percebe-lo, é suficiente ler o que escrevia Aristófanes nas obras dele, onde os homossexuais são alvos de escárnio.

A Antiga Roma

E na Antiga Roma? Aqui os homossexuais eram definidos com alguns termos específicos: delicatus debilis, effeminatus, scultimidonus (o mais ofensivo), morbosus.

Este último termo (que significa “doente”) bem reflecte qual o espírito romano perante os que hoje chamamos gays: um adulto que quisesse praticar a sodomia com um papel passivo era visto como a negação do elemento masculino, essencial na civilização romana. A sodomia era limitada aos prostitutos ou aos escravos com idade inferior aos 20 anos.

Pelo contrário, um adulto que assumisse um papel passivo era alvo de desprezo: neste caso, a designação mais comum era cinaedus, uma palavra depreciativa que denotava um macho com uma identidade de género considerada desviante da norma para a sua escolha de certos actos sexuais ou preferência por certos parceiros; essas preferências eram percebidas como uma falta de virilidade.

A Lex Scatinia (149 a.C.), condenava expressamente o adulto, no caso de relações homossexuais entre adultos e adolescentes, enquanto que no caso duma relação homossexual entre cidadãos adultos livres era punido quem entre os dois assumia um papel passivo, com uma multa de 10.000 sestércio (na mesma altura, um legionário recebia um salário de 900 sestércios).


Um erro constantemente cometido pelos defensores da historicidade da homossexualidade é extrapolar determinadas atitudes sem considerar o contexto histórico.

Na verdade, não é possível traduzir correctamente o termo “homossexual” com o sentido moderno para o latim, pois os Romanos (como também os Gregos) consideravam a bissexualidade como a norma.

Não havia uma real distinção com base na orientação sexual ou na identidade de género típico de um indivíduo, mas tudo era definido a segunda do papel na relação sexual; na prática, a identificação sexual e as leis que regiam as relações sexuais eram baseadas não no facto de que o objecto do desejo fosse uma pessoa do sexo oposto ou do mesmo sexo, mas sobre o facto da pessoa desempenhar um papel activo, associado à masculinidade e à virilidade, ou um passivo.

Portanto, estamos bem longe do significado moderno de “gay”.

Todavia, a homossexualidade romana mudou com o passar do tempo (contrariamente à grega).
No Baixo Império começam a aparecer relacionamentos homossexuais baseados não no sexo mas no sentimento.

O historiador Svetónio, por exemplo, afirmava que o Imperador Nero casou-se duas vezes como homens, uma vez com o papel de mulher, a outra como homem. Mas é preciso acrescentar que Svetónio já era cristão e detestava Nero.

Apesar disso, é verdade que na última parte do Império o relacionamento entre um adulto e um jovem do mesmo sexo aparece com cada vez mais frequência. Há a importação da pederastia grega, mas sem o aspecto pedagógico: é nesta altura que nascem obras que exaltam os prazeres eróticos homossexuais. E há também uma fractura entre aquela parte da sociedade mais conservadora (gymnasia et otia et turpes amores, “desporto, ociosidade e amores vergonhosos” dizia Tácito) e a mais “liberal”.

A prática da pederastia tem o seu apogeu durante o reinado do Imperador Adriano, que compartilhava uma paixão para garotos.

Depois disso, houve a implementação da Cristandade. E o obscurantismo foi total.

Mas isso é o que vamos ver na segunda parte.

Ipse dixit