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As coisas que este cão sabe… – Parte III

– Max!!! 
– Ahi, Minha Nossa, assustaste-me! Que acontece?
– Lembras do que disse até agora? 
– Eh? Leo estou a conduzir, fica quieto aí atrás, pode ser? Já não ajudas, pelo menos fica bom…
– Não mudar de assunto e pensa nisso: só o Estado ou os outros Países podem injectar dinheiro na gaveta dos privados. Lembras das gavetas? 
– Fogo, ainda com esta história…
– Lembras de que num País com soberania monetária a dívida nunca é um verdadeiro problema, lembras? Aliás, a dívida é a forma do Estado criar riqueza, lembras disso também?
– Lembro.
– Então percebeste que sempre foi contada uma enorme mentira? Que a dívida nem deveria chamar-se assim e que não é nada pública?
– Sim, percebi.
– Então a questão é simples. No mundo sempre fomos três: os bípedes normais, os bípedes ricos e os cães. Os cães eram os melhores, depois havia os Reis com a aristocracia e massas enormes de desgraçados sempre sem dinheiro. Depois aconteceu algo. Com revoluções, guerras e mortos foi criada a democracia.
– Maravilha…assim vamos todos votar.
– Não só. Ó Max, tenta ver as coisas numa óptica escatológica.
– Escato…mas onde aprendes estas palavras?
– No Baupedia.
– Ah…


– Dizia: o fim último duma democracia deveria ser a eleição dum Estado eleito por todos e que trata do bem-estar de todos. Porque os direitos e as leis são coisas bonitas, mas se depois uma pessoa tem que trabalhar como um desgraçado para comprar um osso, ou se ninguém explica o que se passa de verdade, então aqueles direitos não valem nada.
– Justo.
– Sabes que dizia Bauda, o nosso grande monge filósofo?
– “Bauda”…nunca tinha ouvido…
– Não me espanta. Dizia: “Só quando uma pessoa tiver uma casa, não estiver mergulhada nas dívidas, ficar protegida com serviços essenciais, estiver bem informada e os seus cachorros tiverem um futuro possível, só então pode conceder-se o luxo de participar na vida democrática”.
– Faz sentido.
– Claro que faz, são palavras do Grande Bauda. Então voltamos atrás. Os Países começaram a ter moedas próprias: na Alemanha os Marcos, na Italia as Lire, na França os Francos, em Portugal os Escudos…e a partir dos anos ’70, com os acordos internacionais, era possível criar dinheiro a partir do nada. Antes não era assim, antes era preciso ter o ouro para criar moeda. Eu tinha 1 quilo de ouro então podia criar 1.000 moedas que valiam como um quilo de ouro. Percebes esta passagem?
– Claro que sim.
– Será…a partir dos anos ’70 este sistema acabou: nascia a moeda desligada do ouro e cada País estava em condições de criar dinheiro sem fim.
– Espera, espera…sabe que diz Archangel? Diz: se um Estado pode criar todo o dinheiro que quer e o faz, isso não diminuiria o valor do dinheiro, aumentando a inflação?
– Falas com os Arcanjos agora? Aquele blog está a dar-te cabo da cabeça…
– Ó Leo, Archangel é um Leitor, que fez esta pergunta…
– Será… Sim, claro que sim. Aliás, este é o maior perigo: criar uma espiral inflaccionária, com os preços fora de controle. É por isso que existe um Banco Central com o administrador, o Ministro do Tesouro. É ele que mede o pulso da situação e gere o equilíbrio: retira dinheiro para travar a inflacção, faz subir o preço do dinheiro, emite dinheiro novo… mas desculpa, esta não é uma das primeiras coisas que te ensinei?
– “Ensinei”, ora essa…falámos disso uma vez, sim, lembro…
– “Falámos”, “falámos” nada: tu pensavas que a inflacção fosse causada por micróbios. Até lembro que escreveste algo, como era? Olha, está aqui no meu BauPhone: Inflação ou Deflação?, Banco Central e Taxa de Juro, bem lembrava eu…
– Ahahah, olha só que teclas grandes aquele iPhone!!!
– Estúpido, eu tenho patas, não dedos…bom, retomamos o discurso. Assim: uma vez o dinheiro era criado apenas se os Estados conseguissem juntar suficiente riqueza para isso, depois dos anos ’70 este limite desapareceu. Era uma seca, de facto.
– E porquê?
– Como “porquê”? Ó Max, imaginas uma situação como esta: tu és um Estado e 1 milhão dos teus cidadãos estão desempregados. Tu que fazes?
– Uma taxa sobre o desemprego?
– Mas não, queres emprega-los, óbvio. Mas isso custa, então alguém diz: “ok, podes assumir 1 milhão de pessoas, mas isso custa 10 milhões de Reais, então antes tens que encontrar o ouro necessário para emitir os Reais, só depois podes assumir o pessoal e paga-lo…”. Uma seca, não é?
– De facto…
– Agora, com o dinheiro criado a partir do nada, as coisas mudavam completamente. Era só imprimir. Mas agora pensa numa cosia. A) Estados democráticos B) Estados que podem criar dinheiro sem limites C) Estados que podem criar trabalho para todos, casas para todos, serviços para todos, instrução para todos…Moral: Estados que podem criar cidadãos instruídos, sem grandes problemas, cidadãos que podem participar na vida política e usar a democracia para tutelar-se!
– Um pesadelo…
– Exacto. A dupla Estado que gasta sem limites e cidadão que gere a democracia é o Santo Graal dos povos, o pesadelo de qualquer elite. Era A-B-S-O-L-U-T-A-M-E-N-T-E necessário impedi-lo, esconder aos cidadãos qual o resultado dum Estado com a capacidade de criar dinheiro a partir do nada. Ó Max, os Alemães, que hoje gritam contra a dívida, fizeram mesmo isso: com o dinheiro do Estado transformaram as empresas deles em super-produtores.
– Ahé?
– Ahe! A despesa, Max, a despesa, esta é a chave. Conseguiram convencer todos de que a despesa do Estado é a dívida dos cidadãos. A dívida agora é Dívida Pública, o deficit é público, o desastre é público. Todos temos que paga-lo, nós e os nossos cachorros…
– “Filhos”…
– Tanto faz. A despesa do Estado é apresentada como Demónio em pessoa. Por isso agora gritam que os Estados têm que gastar menos, cada vez menos, menos de quanto consigam obter. Assim taxas, impostos, cortes. Desta forma o Estado dá 100 mas pede 110. Que raio de Estado é este? Este é apenas um cobrador de impostos, não é um Estado. Desta forma, o Estado acumula dinheiro e nós perdemos dinheiro: é exactamente o contrário da função primordial dum Estado qualquer!
– Inacreditável…
– Acredita, acredita. os cidadãos ficarão cada vez mais pobres, com cada vez mais trabalho, mais dívidas, mais medo…e com cada vez menos democracia. Percebes agora?
– Percebo Leo, percebo…
– Não que não percebes: esta é a tragédia dos bípedes modernos. Na altura em que todos estiverem convencidos que a despesa dum Estado é um prejuízo, todos estão lixa…
– Leonardo!
– …-de-lei numa caldeirada. O quê?
– “Lixa-de-lei numa caldeirada”…
– Sim, é uma metáfora, como dizer “cozinhados”, porquê?
– Não, nada…mas como fizeram isso?
– Com a economia, Max, com a economia. Vai ver quem escreveu os textos de economia que circulam, vai ver…porque paras?
– Tenho que pôr gasolina, caro o meu sabichão, o carro não anda com apenas os teus disparates.
– Ah, a gasolina, pois…tenta não confundir-te e encher de gasóleo, como já fizeste, hein?
– Espirituoso…foi só uma vez e há muito tempo…
– Sim, mas entretanto pioraste…atordoado…

Ipse dixit.

Links:
As coisas que esta cão sabe… – Parte I
As coisas que esta cão sabe… – Parte II